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Brasil 'não faz nada em relação à prevenção do crime e da violência', afirma ex-instrutor do BOPE

As medidas de curto prazo, como o enfrentamento militar, são sempre as opções tomadas no Brasil para combater o crime – não há planejamento a longo prazo no país para a erradicação da violência.
Sputnik

É o que afirma Paulo Storani, ex-instrutor do BOPE (Batalhão de Operações Especiais da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro), antropólogo e pesquisador de ciências policiais na Universidade Cândido Mendes, no Rio de Janeiro.

Em entrevista à Sputnik Brasil nesta sexta-feira (7), o especialista disse que é possível que a polícia tenha cometido excessos durante a operação no Jacarezinho, no Rio de Janeiro, nesta quinta-feira (6). O ex-instrutor do BOPE prefere, porém, esperar a verificação dos antecedentes criminais das vítimas e dos exames de necropsia e de corpo de delito antes de bater o martelo sobre excesso de força policial.

"Precisa ser esclarecido fato a fato, cada morte que aconteceu. Não é dado a nenhuma instituição, policial ou não, o direito de abusar da força necessária, precisa ser assim e o Estado democrático de direito grita por isso", afirma o especialista.

A polícia informou que a operação foi planejada durante dez meses, com a identificação de alvos e o mapeamento dos refúgios do criminosos. O especialista acredita, no entanto, que a resistência encontrada pelos policiais foi maior que a imaginada inicialmente, o que teria contribuído para o tiroteio e, consequentemente, para o alto número de vítimas.

"Provando que não houve excesso, [há] mais dados que vão povoar aí a nossa história de que apostamos sempre em políticas públicas de contenção policial quando, na verdade, não fazemos nada em relação à prevenção do crime e da violência", diz Storani.

Dados do Instituto de Segurança Pública fluminense reafirmam a declaração de Storani: as intervenções policiais no Rio de Janeiro deixaram um total de 1.245 vítimas em 2020. Isso representa uma média de mais de três mortes diárias ao longo de todo o ano. Para efeito de comparação, foram 985 pessoas mortas pela polícia dos Estados Unidos em todo o país ao longo do ano passado, segundo levantamento do jornal norte-americano Washington Post.

"Lamentavelmente, o remédio sempre foi esse, tratando a consequência e não a causa. […] Quando não se tem nenhuma política pública de médio e longo prazo, apostamos sempre em medida de curto prazo, exatamente como o último governador do Rio de Janeiro [Wilson Witzel], que dizia que ia resolver tudo com bala na cabeça. Não é assim que funciona. Não deve ser assim, em qualquer parte do mundo", afirma Storani.
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Polícia informa 3 mortes a mais

A Polícia Civil do Rio de Janeiro informou nesta sexta-feira (7) que operação no Jacarezinho terminou com 28 mortos, sendo 27 civis e um policial civil, além de seis presos. O número aumenta em três mortos o balanço divulgado nesta quinta-feira (6). A chamada Operação Exceptis investiga o aliciamento de crianças e adolescentes para ações criminosas, como o tráfico de drogas, assassinatos, roubos e até sequestros de trens da Supervia. Esta realidade, no entanto, está longe de ser uma exclusividade do Jacarezinho.

"O que acontece no Jacarezinho, baseado nas informações, acontece em qualquer comunidade do Rio de Janeiro. […] É uma realidade muito triste que nós vivemos, mas eu não vejo nenhuma comoção neste sentido. O menor de idade é considerado a melhor mão de obra que se possa ter para tráfico de entorpecentes. Se forem identificados, se forem cumprir medidas socioeducadativas, dificilmente ficaram mais de um ano nesta medida, podendo retornar ao tráfico com novo status, de ter passado pelo sistema. É uma coisa muito mais profunda", avalia Storani.
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Determinação do STF

A operação no Jacarezinho aconteceu a despeito de uma determinação do Supremo Tribunal Federal (STF), que decretou que, durante a pandemia, ações em comunidades precisam ser comunicadas ao STF. A decisão permite ações apenas em "hipóteses absolutamente excepcionais". 

A polícia e autoridades do governo estadual argumentam que o decreto prejudica o combate ao crime. O delegado Rodrigo Oliveira, da Coordenadoria de Recursos Especiais da Polícia Civil do Rio de Janeiro, afirmou que "a falta de operação dá um péssimo resultado". 

"Eu considero equivocada [a medida do STF]. Não cabe ao STF determinar como a polícia deve agir. Isso deveria ser um ajuste de conduta entre o Ministério Público e a polícia estadual, no caso a civil e militar", diz Storani.
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ONU cobra investigação

Nesta sexta-feira (7), o Alto Comissariado da Organização das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH) pediu ao Ministério Público que realize uma investigação independente, completa e imparcial de acordo com as normas internacionais da Operação Exceptis. "Isto implica que as autoridades devem garantir a segurança e a proteção das testemunhas e protegê-las contra intimidações e retaliações", disse Rupert Colvill, porta-voz da ACNUDH, em comunicado.

Segundo Storani, a ONU está "fazendo o papel dela de cobrar", assim como outras instituições que protegem os direitos humanos devem fazer. O que não se pode, na opinião do ex-instrutor do BOPE, é criminalizar todas as ações da polícia tomando por base esta operação.

"Você não tem políticas preventivas e aposta nas operações policiais como solução do problema. Então, se deixar de ter operação policial, o que vai nos restar? […] A gente precisa ter um olhar mais amplo, ter coragem para falar sobre isso, coragem para tomar posição e perceber que a solução é muito além do que impedir que as polícias deixem de atuar", finaliza o especialista.
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