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Qual é o peso da crise hídrica e da insegurança energética no Brasil para 2022?

Em meio a dificuldades econômicas e preocupações com a pandemia, os brasileiros também passaram a temer a eclosão de uma crise hídrica e energética em 2021 após mais um ano de seca além do usual e de aumento de tarifas de energia. Mas será que o medo de falta de água ou de um novo apagão se justifica?
Sputnik
Para entender o cenário atual e as previsões para 2022, a Sputnik Brasil conversou com o engenheiro eletricista Altino Ventura, ex-presidente da Eletrobras (2002-2003) e membro da Academia Nacional de Engenharia.
O especialista alerta que o país viveu o quarto ano seguido com poucas chuvas e pode estar passando por um dos maiores períodos de seca da história recente, mas indica também alguns sinais positivos que amenizam o cenário.
Ventura acredita que o Brasil teve "uma introdução à crise hídrica" em 2021. Segundo o especialista, no começo do período de seca, em maio, os reservatórios das hidrelétricas estavam, em média, com um terço da sua capacidade de armazenamento.

"Temos um desequilíbrio entre oferta e demanda no sistema brasileiro, pois temos menos água nas hidrelétricas. A crise se implantou em 2021, porque tivemos menos armazenamento nos anos anteriores e iniciamos maio com um armazenamento relativamente baixo", afirmou o ex-presidente da Eletrobras.

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Porém, as temperaturas amenas e o volume de chuvas mais elevado no final do período seco, em novembro, contribuíram para atenuar a gravidade da situação para o início de 2022.
Segundo ele, a situação agora está razoavelmente favorável. Ventura explica que, quando a temperatura cai, a demanda também se retrai, especialmente devido à redução do uso do ar condicionado.
"Isso foi um fator importante. E o segundo ponto é que, no final do período seco, tivemos chuvas onde havia reservatório", destacou.
Se em algumas regiões as chuvas são essenciais para o abastecimento de hidrelétricas e a subsistência de setores como a agricultura, há cidades do país em que os períodos de estiagem contribuem para evitar deslizamentos e alagamentos.
O especialista lembra que o Brasil tem uma predominância no uso de hidrelétricas para o consumo de energia, com 60% a 70% do mercado. Mas ao mesmo tempo, os recursos hídricos têm outras finalidades, como navegação, irrigação e abastecimento de água.

"Uma parcela é destinada a outros objetivos, até mais nobres que a eletricidade. Mas claro que os outros usos, em algumas circunstâncias, diminuem o potencial de produzir energia elétrica. Então, a crise pode ser um pouco mais profunda porque a sociedade utiliza os recursos em diversas atividades", explicou.

Usina binacional de Itaipu.. Foto de arquivo

Saída para o preço das tarifas de energia

Em agosto, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) criou uma nova bandeira tarifária, nomeada de "escassez hídrica". Com vigência de 1º de setembro de 2021 a 30 de abril de 2022, o valor da taxa extra pulou de R$ 9,49 para R$ 14,20 pelo consumo de 100 kWh.
A principal justificativa para o aumento é que o baixo volume de chuvas dos últimos anos obrigou o país a aumentar a produção de energia em usinas termelétricas, que possuem um custo maior que as hidrelétricas.
Ventura comenta, porém, que a tentativa de redução da demanda através do preço tem outra consequência para a sociedade além da própria elevação do gasto: a aceleração da inflação.
"O processo inflacionário desorganiza a economia do país, e estamos em um cenário de busca por recuperação. Mas esse processo produz algumas limitações", pontuou.
Por isso, o engenheiro eletricista indica outro caminho menos "nocivo ao país". Além de simplesmente aumentar o custo da tarifa, o governo brasileiro poderia, na sua visão, entrar em negociação com a sociedade, com diálogo e promessa de benefícios com uma adesão ao racionamento de energia.
Isto foi feito apenas em parte, segundo ele, quando o governo anunciou um desconto na conta de luz no início de 2022 para quem reduzir o consumo este ano e atingir uma meta estipulada.
Ventura lembra que, na crise energética do início do século, houve um maior esforço para poupar luz, com o movimento de compra de lâmpadas mais eficientes.
"No momento atual, o desperdício já é menor, até porque a tarifa de energia está muito cara, e os brasileiros aprenderam alguma coisa desde o racionamento de 2001. Hoje as pessoas compram lâmpadas eficientes, o que torna a adesão da sociedade um processo difícil", admitiu.
O ex-presidente da Eletrobras afirma que "talvez o país não esteja ainda em um estágio de civilidade" que permitiria um processo de esforço por maior eficiência energética.

"No contexto em que o Brasil vive agora, a palavra racionamento é proibida, porque tem uma série de implicações de difícil entendimento da sociedade. A imprensa nem sempre sabe tratar o tema com a clareza necessária, e a situação caminha para uma discussão política, com uma confusão muito grande, influenciando em processos eleitorais", avaliou Ventura.

Com ou sem esforço para um racionamento por enquanto, as incertezas permanecem para 2022, justamente um ano eleitoral. Se a crise hídrica e a energética vão de fato atormentar ou não os brasileiros nos próximos meses, talvez só o tempo e as condições de temperatura e pressão dirão.
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