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Com Fachin e Moraes à frente do TSE, o que esperar das eleições presidenciais no Brasil?

Quais os desafios nos mandatos de Edson Fachin e Alexandre de Moraes à frente do TSE? Para Flávio de Leão Bastos, professor da Universidade Mackenzie entrevistado pela Sputnik Brasil, "há grupos populistas no país que querem destruir a democracia", e não será possível pará-los completamente.
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O ministro Edson Fachin assume nesta terça-feira (22) o comando do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), tendo como vice Alexandre de Moraes, que passa à liderança da Corte em agosto, às vésperas das eleições presidenciais.
A dupla comandará o tribunal em uma das eleições mais turbulentas da história recente do Brasil, com planos para combater a disseminação de fake news, o uso da máquina pública para fins políticos e a questão das federações partidárias, além de outros desafios, conforme apontou o professor de direito Flávio de Leão Bastos.
Para ele, ao analisar o futuro de Fachin e Moraes à frente do TSE, o que está em jogo é o destino da "própria democracia brasileira". "É sob esse cenário que eles assumem", comentou.
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Democracia em vertigem?

Em "Democracia em Vertigem", conhecido documentário da cineasta Petra Costa, são reveladas as relações promíscuas entre o capitalismo no Brasil e a política nacional, mostrando que, apesar da alternância de presidentes, o país é incapaz de cessar um ciclo de poder ditado pelo capital financeiro.
Embora não tenha traçado nenhum paralelo com o filme, a sensação de Bastos ao olhar para o cenário eleitoral deste ano é de que o Brasil vai enfrentar grandes desafios democráticos até a definição do próximo presidente. Nesse sentido, apontou, quem fica sob constantes riscos é a democracia nacional.
Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, discursa ao lado do presidente Jair Bolsonaro durante manifestação de agricultores contrários ao STF e que apelavam para o fim das restrições da COVID-19, 15 de maio de 2021. Foto de arquivo
Para ele, Fachin e Moraes assumem o TSE "em um momento no qual o mundo vivencia um avanço dos políticos de extrema-direita", sobretudo daqueles classificados como populistas. "E qual a característica deles?", questionou, acrescentando em seguida: "O ataque às instituições e a imposição de ideias conspiracionistas".

"Ataca-se as instituições para que o espaço seja ocupado pelo populismo. Isso gerou um processo de corrosão do regime democrático, agravado pela Internet, que permitiu a aglutinação de minorias extremistas, como nazistas. É sob esse cenário que eles [Fachin e Moraes] assumem", afirmou.

Desafios do TSE

O ministro Edson Fachin, em coletiva de imprensa na semana passada, declarou que a Corte tem um "robusto conjunto de desafios" pela frente, mas que está "atenta e preparada" para enfrentar riscos como ataques cibernéticos e ameaças autoritárias.
"Enfrentaremos distorções factuais e teorias conspiratórias, as quais, somadas ao extremismo, intentam atingir o reconhecimento histórico e tradicional da Justiça Eleitoral", disse Fachin.
Flávio de Leão Bastos partilha desse entendimento. Ele acredita que "grupos populistas querem destruir a democracia, e não será possível pará-los completamente", dadas as dificuldades de mapear e localizar cada um.
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Por essa razão, o especialista considera que "eventualmente haverá algum conflito ou problema" durante o pleito, "principalmente em áreas onde não há controle do Estado", como redes sociais e territórios controlados por traficantes e milicianos.

"Os desafios são vários. Além das fake news, haverá a questão das federações. Como será a prestação de contas da federação? E a questão das cotas? Como verificar? Como acertar esta injustiça histórica? Como combater candidatos do tráfico, das milícias? Os desafios são inúmeros, pois é a democracia que está sob ataque", comentou.

Ministros sob ataque

Outro ponto abordado durante a entrevista de Flávio de Leão Bastos diz respeito aos constantes ataques que ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e de outras instâncias vêm sofrendo nos últimos anos.
Policiais próximo a um bloqueio que impede o acesso de apoiadores do presidente Jair Bolsonaro à sede do STF, Brasília, 8 de setembro de 2021. Foto de arquivo
No Brasil, questões sobre a jurisdição do país e mesmo determinações do STF passaram a ser discutidas abertamente em sociedade, como se fossem comentários de uma partida de futebol. O debate, embora sempre bem-vindo, deve ser feito com cautela, na opinião do professor.

"Não vejo como boa-fé as críticas aos ministros do STF, pois está claro que as decisões são embasadas a partir de um ponto de vista técnico", esclareceu.

Ele explicou que quando os ministros Fachin e Moraes arbitram, "embora possa haver divergências e interpretações distintas, não se pode dizer que não foram decisões juridicamente embasadas e tampouco que houve interferência em outro poder". Para Bastos, há má-fé em algumas críticas aos ministros.
Em vídeo, Bolsonaro faz ataques pessoais contra o ministro do STF Luís Roberto Barroso, 9 de abril de 2021. Foto de arquivo

Um recado de confiança

Embora analistas falem na eleição mais polarizada dos últimos anos, atentando para recentes eventos políticos pelo mundo — como nos EUA, com a invasão do Capitólio — e alertando para os perigos que o Brasil enfrentará nos próximos meses, a avaliação de Flávio de Leão Bastos é que as instituições vão sobreviver ao cenário eleitoral.

"Eu tenho total confiança na lisura das eleições. Tudo ocorrerá da melhor forma possível. O TSE não será tolerante com a intolerância", previu.

Para ele, "quem deseja pânico são extremistas". Por essa razão, problemas no pleito serão inevitáveis. "Eventualmente haverá algum conflito, porque isso sempre ocorreu, principalmente em áreas onde não há controle do Estado", analisou.
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Ao exemplificar essa hipótese, o especialista relembrou uma das principais fake news espalhadas durante o surto da COVID-19, "a de que o STF não deixou o presidente governar na pandemia". Ele destacou que a Constituição é clara sobre as competências de estados e municípios em questões de saúde pública.

'Trabalho dos ministros foi bem feito'

Por fim, o professor analisou as passagens pelo TSE de Fachin, Moraes e Luís Roberto Barroso, último ministro a presidir a Corte. Para ele, o trabalho foi "muito bem feito" pelos três ministros, principalmente após as acusações de que as urnas eletrônicas poderiam ser um problema.

"Barroso defendeu de forma transparente a lisura das urnas eletrônicas. Se as urnas fossem questionadas pela população, isso seria um problema muito maior, mas a campanha para mitigar essas informações falsas foi um sucesso", comentou.

Ele também enfatizou a resistência e a união dos ministros do STF e do TSE frente à "intensa campanha contra o Judiciário, inclusive após os ataques físicos ao prédio do STF".
Em São Paulo, apoiadores do governo Bolsonaro se manifestam contra as medidas de isolamento social em meio à pandemia da COVID-19, 1º de maio de 2021. Foto de arquivo
Ao falar sobre a posse de Fachin, Bastos não poupou elogios ao ministro. "É uma pessoa muito serena e de pouco afeto às polêmicas públicas". Ele acrescentou que "teremos uma preparação para as eleições de forma serena, mas incisiva no combate às fake news".
Quanto à chegada de Alexandre de Moraes à Corte, em agosto, relembrou que o ministro "é o responsável por inquéritos sobre fake news, ataques à democracia e divulgação de informações sigilosas".

"Ele conhece muito bem as técnicas de corrosão da democracia", opinou. "A Justiça não aceitará fake news na proporção de 2018. O que está em jogo é a própria democracia", finalizou.

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