"Na prática, isso é uma vocação de um país deste tamanho: ter presença em vários pontos do planeta. Presença esta política, na base da cooperação, na base dos valores que pautam a nossa política externa e que sempre pautaram a nossa diplomacia. Mesmo com um país com pouco histórico comum conosco, como é o caso da Argélia, considera-se que, por conta do posicionamento global, da questão geoestratégica, da questão geopolítica e também por conta da vocação nossa de ser um grande jogador internacional, uma aliança com a Argélia abre um espaço no Norte da África para outras possibilidades. Mas, acima de tudo, tem a ver com a aproximação do Brasil em pontos onde não necessariamente estávamos com influência política", avalia.
"É um acordo importante, que faz com que o Brasil chegue em uma região estratégica para os seus interesses, que é o [mar] Mediterrâneo, o Norte da África e o sul da Europa. São processos naturais da diplomacia, a aproximação com povos de pano de fundo cultural comum ao nosso, e o ponto aí é ampliar. Na prática, vale a máxima 'Quanto mais, melhor', sobretudo para um país dessa magnitude. As perspectivas para o Brasil são essas: a aproximação com o Norte da África; a questão do Mediterrâneo; a participação em jogos militares; e o intercâmbio com outras culturas."
"Mas, para o Brasil, o acordo traz um movimento importante: parece que a diplomacia brasileira começa a se voltar para aquilo que é importante. Ou seja, muito menos a agenda ideológica do presidente e muito mais a agenda histórica da diplomacia brasileira, que tem [por norte] a ampliação dos contatos e da presença brasileira no mundo", argumenta.
"Nosso conhecimento foi muito importante para você montar, efetivamente, a Marinha da Namíbia, que é um país costeiro e importante para a zona de paz do Atlântico Sul. É algo que precisamos retomar e que vamos retomar no futuro. Isso faz com que a Namíbia seja um jogador importante nessa região. Ter uma costa protegida do lado africano do Atlântico é importante para o Brasil. Mas como a Argélia já tem seu Exército, nossa participação na Argélia se dá na base da troca, da experiência, da cooperação. E, quem sabe mais à frente, na abertura de um mercado para os nossos produtos. Mas, para a Defesa, é importante porque isso cria mais um mercado para escoamento da nossa produção. É a diplomacia voltando a fazer minimamente o que se espera dela, embora o acordo tenha saído da relatoria de um senador. Ou seja, o Legislativo provocando impacto e acionando a burocracia do Estado, que é o Itamaraty ou o Ministério da Defesa, para firmar esse acordo", observa.
"É importante que essas parcerias aconteçam e que elas se multipliquem. Nossa presença na África é muito importante. Ela começou a decair muito durante os últimos seis anos. Perdem-se seis anos nas relações com países africanos, seis anos de um vácuo econômico e político de poder, que é contemplado por outras nações. Quando você começa a retomar isso, você começa a retomar o rumo que é o tradicional e o importante nas relações internacionais do Brasil, que é a ampliação dos mercados e a presença em postos e pontos estratégicos importantes na África."
A Argélia mira o futuro com o BRICS
"O próprio presidente argelino [Abdelmadjid Tebboune] faz uma leitura de que estão entrando no BRICS para fugir de uma ideia de que há somente dois polos, um deles pró-imperialismo e o anti-imperialista. Essa leitura carece ainda de melhor entendimento, porque não é isso. A Argélia também começa a projetar uma tentativa de se desvencilhar das relações majoritárias com os países mediterrâneos. A Argélia não tem saída para o mundo a não ser a saída para o Mediterrâneo, que é controlada por França, Espanha e Itália, três potências europeias. Ao mudar a sua percepção para o resto do mundo, ao tentar uma entrada no BRICS, mostra que o BRICS está em mudança", aposta.
O pedido de ingresso da Argélia ao BRICS "mostra um país que começa a se desvencilhar das meras relações com a Europa a partir das relações com a China, com o Brasil, com a Índia. É a diplomacia argelina tomando frente de novos espaços e tentando ocupar novos espaços. Existe ali uma possibilidade de que tudo isso venha a ser uma tônica para o futuro. Desde a ampliação do BRICS até o deslocamento do centro da diplomacia do Norte da África, e do continente africano em geral, para os blocos que estão mais aproximados da China e do Brasil", finaliza Bragança.