Retrato do Congresso em 2023: nova bancada criará mais dificuldades a Lula ou a Bolsonaro?
A Sputnik Brasil conversou com cientistas políticos sobre a composição do Parlamento para o ano que vem. Para José Paulo Martins Júnior, da Universidade Federal Fluminense (UFF), Bolsonaro tem a seu favor uma maior bancada e a experiência do primeiro mandato, enquanto Lula terá que recorrer a um governo mais conservador.
SputnikUm dos grandes vitoriosos nas eleições parlamentares deste ano foi o
Partido Liberal (PL), do
presidente Jair Bolsonaro. Na Câmara dos Deputados, a legenda alcançou a maior bancada de um partido na história, com
99 assentos. No Senado, dos 27 eleitos, oito são do PL, que passa a ter a maior fatia também nesta Casa, com
13 parlamentares.
Apesar da vitória parlamentar de Bolsonaro, não é possível afirmar que o
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) saiu derrotado. A
Federação Brasil da Esperança (PT–PCdoB–PV) teve bom desempenho e terá a segunda maior bancada na Câmara, com
80 vagas. No Senado, o Partido dos Trabalhadores (PT) passou de sete para
nove cadeiras.
Quem mais perdeu assentos foram partidos de centro e da centro-direita. O Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), por exemplo, sofreu a maior redução na representação na Câmara, caindo de 23 para 13 deputados.
Já no Senado, esta é a primeira vez desde 1986 que o Movimento Democrático Brasileiro (MDB) sai de uma eleição sem a maior bancada. Neste domingo (2), apenas Renan Filho, de Alagoas, foi eleito pelo partido. Com isso, a sigla fica com dez parlamentares na Casa, atrás do PL (13) e do União Brasil (12) e empatado com o PSD.
Mas, afinal, o que a nova composição representará para o presidente eleito no próximo dia 30, em segundo turno? Quais seriam as maiores dificuldades de Lula e de Bolsonaro em eventual governo a partir de 1º de janeiro de 2023 em relação ao Congresso?
Para o cientista político da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) Ricardo Ismael, qualquer que seja o escolhido pela população, o presidente eleito precisará negociar com o Congresso para ter e manter maioria parlamentar, "principalmente se quiser aprovar emendas constitucionais".
"Diria que a primeira tarefa do presidente eleito é buscar conversar com os partidos e as lideranças do Congresso Nacional, para tentar montar essa maioria, além de buscar participar das negociações para eleição dos presidentes da Câmara e do Senado", indica Ismael, em entrevista à Sputnik Brasil.
De acordo com o especialista, se o presidente tiver iniciativa e capacidade de articulação entre as
forças políticas do Congresso, poderá estabelecer pontos prioritários para balizar o início de seu mandato.
"A iniciativa do presidente eleito, até por conta do instrumento das medidas provisórias, é um fator decisivo na agenda para 2023", aponta.
Já para José Paulo Martins Júnior, cientista político e professor da Universidade Federal Fluminense (UFF), um eventual governo Lula poderá ter mais dificuldades do que Bolsonaro quanto a suas pautas no Congresso.
"Um governo Lula terá mais limites, dificuldades, mesmo que consiga conquistar apoio de partidos de centro-direita, como o PSD, o PP, que já compuseram o gabinete ministerial do Lula", disse à Sputnik Brasil.
Segundo ele, o petista teria um governo "com uma cara conservadora, mas não muito diferente do que foi um governo Lula de 2003 a 2010".
Quanto a um novo governo Bolsonaro, o especialista acredita que o presidente teria mais facilidades do que no primeiro mandato. Martins Júnior aponta que, além de agora já contar com experiência na relação com o Congresso, Bolsonaro terá a seu favor uma bancada partidária ainda maior.
O professor lembra que Bolsonaro não seguiu o modelo do presidencialismo de coalizão, como governos anteriores, optando por ampliar a autonomia dos parlamentares na execução orçamentária, por meio do chamado orçamento secreto, para garantir governabilidade.
"Bolsonaro não vai ter dificuldade de governar com esse Congresso. Basta querer, porque tem o Congresso na mão, para fazer, inclusive, emendas constitucionais", afirmou o especialista, acrescentando que partidos de oposição ao governo, como PT, Psol e Rede, elegeram uma bancada de menos de um terço na Câmara. "Não têm 150, 160 deputados. A situação para o Bolsonaro é muito mais fácil."
Centrão terá 'muita influência' no novo governo
Martins Júnior, da UFF, diz que, em geral, os partidos dos candidatos à Presidência são os que conseguem eleger as maiores bancadas. Houve apenas uma
inversão na proporção da preferência a Lula e a Bolsonaro, comenta, já que o PL ficou à frente do PT na Câmara, apesar de o presidente ter tido menos votos
do que seu oponente.
Segundo o especialista, as eleições nos estados, com vantagem a candidatos aliados a Bolsonaro, contribuíram para a votação no Parlamento. Ele aponta que a adesão a Tarcísio de Freitas (Republicanos), candidato em São Paulo, e a Romeu Zema (Novo), recém-reeleito governador de Minas Gerais, ajudaram a alavancar a eleição de candidatos a deputado federal.
"O resultado está dentro do que se esperava, com um enfraquecimento da direita tradicional, como o PSDB, que a partir de 2014 acabou perdendo voto para o movimento liderado pelo Bolsonaro. No Senado, houve algumas mudanças, com a direita perdendo espaço para a extrema-direita, e a esquerda, com o PT, até ganhou algumas cadeiras", avaliou.
Ismael, da PUC-Rio, afirma que, apesar das mudanças, a Câmara dos Deputados continua com uma alta fragmentação partidária. Ao todo, são 23 partidos com assentos na Câmara.
Apesar disso, ele aponta que os partidos do chamado centrão foram favorecidos pela injeção financeira do fundo eleitoral, superior ao montante de 2018. Segundo ele, o grupo vai continuar com força nas duas Casas legislativas.
"A Câmara fica um pouco parecida. O centrão continua muito forte, independentemente de quem seja o presidente. O novo presidente terá que negociar com os partidos do centrão, porque foram bem votados e, possivelmente, vão ter influência na próxima legislatura", disse.
29 de setembro 2022, 09:00