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Pelé 'definiu uma era' e ajudou a projetar imagem do Brasil, diz pesquisador

Nesta quinta-feira (29), morreu Pelé, o maior jogador da história do futebol brasileiro e mundial. A Sputnik Brasil ouviu dois pesquisadores da área de mídia e esporte para comentar a brilhante carreira do chamado "atleta do século", que conquistou a Copa do Mundo três vezes e se tornou um dos homens mais famosos e prestigiados do planeta.
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O Rei do Futebol, Edson Arantes do Nascimento, conhecido como Pelé, faleceu nesta quinta-feira (29) aos 82 anos. A causa da morte foi falência múltipla de órgãos. O ex-jogador estava internado no hospital Albert Einstein, na capital paulista, onde tratava um câncer no cólon.
A notícia da morte de Pelé repercutiu imediatamente e tomou as redes sociais e as capas dos principais jornais do Brasil e do Mundo. Além de milhões de menções de fãs nas redes, Pelé recebeu homenagens de diversas personalidades do mundo inteiro, desde jogadores a políticos.

Em entrevista à Sputnik Brasil, Leda Maria Da Costa, pesquisadora do Laboratório de Estudos em Mídia e Esporte (LEME), da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), aponta que a carreira de Pelé é de uma importância essencial para a história do esporte mundial.

"É praticamente impossível contar a história do futebol mundial e, sobretudo, do futebol brasileiro, sem recorrer a uma imagem de Pelé, a imagem de uma jogada feita por Pelé, ao gesto de soco no ar de comemoração de um gol feito por Pelé. Com todos seus erros, com todos seus acertos, gravou seu nome na história individual e coletiva de gerações. Pelé nos deixou hoje fisicamente, mas enquanto ídolo, seu nome é imortal", afirma.

A pesquisadora recorda que quando Pelé jogou sua primeira Copa do Mundo, em 1958, o futebol já era "extremamente popular no Brasil", mas que o atleta teve contribuição fundamental para elevar o status do futebol brasileiro e da Seleção Brasileira.

"Para o futebol brasileiro, o Pelé é fundamental por ser provavelmente o primeiro ídolo global, de fato, e que vai ter um reconhecimento externo imenso, uma figura altamente midiática, uma figura que conseguia unir um talento incrível esportivo com uma capacidade de manter uma imagem de ídolo muito bem cuidada, muito bem tratada. Isso é raro, nem todos os ídolos conseguem atingir esse tipo de construção de imagem. Acho que o Pelé é único nesse sentido", pondera a pesquisadora.

Edson Arantes do Nascimento, o Pelé, campeão nas Copas do Mundo de 1958, 1962 e 1970, no museu que leva seu nome, em Santos (SP)

'O maior de todos os tempos'

Em entrevista à Sputnik Brasil, José Carlos Marques, docente da Universidade Estadual Paulista (UNESP) e líder do Grupo de Estudos de comunicação sobre Esporte e Futebol (GECEF), afirma que não tem nenhuma dúvida de que Pelé "é o maior jogador de futebol de todos os tempos".

"Pelé transcende o próprio futebol. Pelé transcende sociedades, Pelé transcende culturas e também não tenho dúvidas de que é um dos brasileiros mais importantes de todos os tempos. Até porque ele, sem ser um estadista, sempre teve honras de Estado ao ser recebido por reis, monarcas, príncipes, presidentes, primeiros-ministros, ditadores, democratas e por aí vai. Sempre foi uma imagem do esporte e do Brasil no exterior, algo que nenhum cidadão ou cidadã Brasileira conseguiu até hoje", afirma o pesquisador.

Marques avalia que Pelé "definiu uma era" no futebol e contribuiu para a popularização do esporte e o resgate da Seleção Brasileira. O professor lembra que Pelé trouxe de volta o prestígio da Seleção, então marcada pela derrota na final da Copa do Mundo de 1950, em pleno Maracanã, diante do Uruguai. Especialistas apontam que o então goleiro da seleção, Barbosa, se tornou alvo pela derrota por ser um homem negro. Na avaliação de Marques, Pelé contribuiu para combater a visão racista da população brasileira sobre seus jogadores.

"Pelé, sem nunca ter sido um ativista político, um ativista social, um ativista do movimento negro, talvez tenha conseguido mais do que qualquer ativista conseguiu na sua época. Ele conseguiu mostrar que o elemento negro era capaz, era competente, tinha qualidade para desempenhar esse jogo jogado pelos pés", afirma, lembrando que a consagração de Pelé veio na Copa de 1970, quando o jogador ficou marcado por realizar "jogadas fantásticas".

Pelé (à esquerda) se prepara quando o goleiro francês Claude Abbés perde a bola, permitindo que Pelé marque o terceiro gol do Brasil na semifinal da Copa do Mundo, em Estocolmo, Suécia, em 24 de junho de 1958. Esse dia o Brasil venceu a França por 5 a 2
Marques também lembra que a carreira vitoriosa de Pelé no Santos e na Seleção Brasileira coincide com um período em que o Brasil "começa a se perceber como um país importante na geopolítica global", ajudando a projetar uma imagem que "o Brasil fazia de si mesmo como um país do futuro".
O pesquisador também pondera sobre as críticas a uma suposta "falta de ativismo político" do jogador. Segundo ele, essas críticas precisam "ser colocadas em perspectiva". Na opinião de Marques, Pelé conseguiu permanecer "acima de tudo isso" em diversos momentos e não serviu pessoalmente "de propaganda para a Ditadura Militar".
O pesquisador lembra ainda que Pelé, uma das figuras mais famosas do século XX, foi homenageado diversas vezes pelo escritor Nelson Rodrigues, conhecido pela atuação na crônica esportiva. Em uma de suas crônica, lembra Marques, o escritor chamou Pelé de "gênio indubitável" e o comparou a Michelangelo, Homero e Dante.
"Pelé, então, passa a fazer parte agora, desse panteão de gênio da humanidade — gênios que conseguiram fazer com que a nossa vivência na face da Terra pudesse ser um pouco mais bonita, um pouco mais prazerosa, um pouco mais encantadora. Acho que esse é um dos maiores legados que o Pelé deixa e, mais uma vez, poucas pessoas, poucos brasileiros ou brasileiras conseguem fazer o que ele fez na sua vida", afirma, emocionado, o professor.
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