O Japão adotou no final de 2022 estratégias atualizadas de segurança nacional e de rearmamento, o que indica uma tendência para aumentar seu potencial militar, como apontado na quarta-feira (18) por Sergei Lavrov, ministro das Relações Exteriores da Rússia.
A ação é justificada pela descrição da China como o "principal desafio estratégico" e da Coreia do Norte como "uma ameaça ainda maior que antes", apesar de o Artigo 9 da Constituição do Japão de 1947 proibir para sempre a condução da guerra, criar forças terrestres, marítimas e aéreas, ter, permitir o transporte ou usar armas nucleares, ou outros meios de resolução de conflitos por via militar.
O especialista militar Vladimir Prokhvatilov vê a militarização planejada como bastante cara.
"O Japão está extremamente preocupado com a atividade da China perto das ilhas Senkaku, com a imprevisibilidade dos exercícios de mísseis da RPDC [República Popular Democrática da Coreia, ou Coreia do Norte] e com as tensões no Indo-Pacífico. Em geral, o crescente poder militar de um país faz com que seus vizinhos pensem que isto é por uma razão, e eles começam a fortalecer suas Forças Armadas, construir e modernizar suas próprias armas", avaliou ele em declarações à Sputnik.
"Isso também está ligado a um aumento no tamanho dos orçamentos de defesa devido ao aparecimento de novos sistemas de armas e tecnologias de quinta geração. O custo de produção de novas armas aumenta substancialmente: o alto custo de materiais, eletricidade, mais custos de transporte, salários dos desenvolvedores, funcionários, e muitas outras coisas. Ao mesmo tempo, é necessário dispor de equipamento obsoleto, o que significa uma gama completa de medidas e um item de despesas adicional."
Citando os gastos de US$ 2,3 trilhões (R$ 11,93 trilhões) dos EUA no Afeganistão ao longo de 20 anos, Prokhvatilov referiu as acrescidas despesas nas áreas cibernética e espacial, e também nos salários e financiamento dos militares, mesmo sem um aumento no número de efetivos. Isso, diz, tornaria Tóquio uma potência militar completa.
24 de dezembro 2022, 17:13
Dmitry Streltsov, chefe do Departamento de Estudos Orientais do Instituto de Relações Internacionais Estatal de Moscou (MGIMO, na sigla em russo), destacou a "altamente perigosa situação" em torno do país insular, na qual "as autoridades do Japão são obrigadas a ter em conta as ameaças que creem que veem de três direções: a China, Coreia do Norte e Rússia".
O acadêmico mencionou igualmente as atitudes atuais da população japonesa, que tem se virado cada vez mais em direção a um posicionamento duro em defesa dos interesses nacionais, e benéfico para a política governamental.
Quanto aos gastos atuais, ele os comparou aos da Coreia do Sul, França e Rússia, sendo que um aumento nos próximos cinco anos da sua proporção no PIB até 2% tornaria o Japão a terceira maior potência militar mundial. No entanto, ele referiu como obstáculo a dívida governamental atual do país, que supera 260% da economia.
A estratégia de segurança nacional prevê a possibilidade de executar "contra-ataques" contra o território de potenciais inimigos no caso de um ataque direto ao Japão, uma ameaça à sua existência devido a um ataque a um Estado amigável, ou por uma ausência de meios adequados para se proteger de um ataque.
OTAN chegou à Ásia?
O papel crescente do Japão é visível como parte dos exercícios RIMPAC, liderados pelos EUA, e cuja última edição decorreu entre 29 de junho e 4 de agosto de 2022. Como referiu Yuri Knutov, diretor do Museu de Defesa Antiaérea da Rússia, Japão integra ainda as alianças militares Quad e AUKUS, uma "OTAN asiática" informal da qual Washington também faz parte.
"A razão é óbvia: os EUA estão se preparando para um conflito sério com a China sobre Taiwan, antes de mais nada, por causa de sua localização estratégica. Taiwan permite à Marinha chinesa o livre acesso ao oceano Pacífico. Para os EUA e a OTAN, Taiwan é um elo fundamental na primeira linha de defesa no caso de um conflito militar com a China e o bloqueio de suas frotas militar e comercial", opinou à Sputnik.
"Mas globalmente, Taiwan é apenas uma desculpa para a escalada militar. A China tornou-se um poderoso concorrente dos EUA, portanto, a OTAN está agora designando a região da Ásia-Pacífico como sua esfera de influência, transformando o bloco militar transatlântico em uma estrutura global", disse Yuri Knutov, acrescentando que a estratégia dos Quad e AUKUS é feita por "subterfúgio" em vez de abertamente.
Já Vasily Kashin, pesquisador sênior do Centro de Estudos Integrados Europeus e Internacionais da Universidade Nacional de Pesquisa-Escola Superior de Economia russa, afirmou à Sputnik que as forças dos EUA operarão do território japonês contra a Marinha da China no caso de um conflito militar com Pequim em torno de Taiwan, em cooperação com as Forças de Autodefesa do Japão.
"[...] Quando o Japão conduz exercícios militares para defender as ilhas periféricas, isso diz respeito principalmente às ilhas Senkaku. No entanto, esse cenário é idêntico ao da defesa de Taiwan", comentou ele.
Assim, os documentos e declarações oficiais de políticos japoneses referem-se à aliança EUA-Japão como a "pedra angular" da política de segurança do país.