O debate sobre a possível entrega de tanques alemães Leopard 2 à Ucrânia continua acalorado, com o chefe do Pentágono, Lloyd Austin, mal escondendo sua decepção em uma entrevista coletiva na semana passada na base aérea de Ramstein, no sudoeste da Alemanha, depois de não conseguir que Berlim concordasse em entregar os tanques. Austin disse a repórteres que Kiev tem uma "janela de oportunidade cada vez menor entre agora e a primavera [no Hemisfério Norte]" antes de lançar uma ofensiva e precisa "reunir as capacidades certas", incluindo tanques.
A Polônia intensificou a retórica na última segunda-feira (23), com o vice-ministro das Relações Exteriores da Polônia, Arkadiusz Mularczyk, alertando que a Alemanha poderia acabar "em isolamento internacional" por causa da questão dos tanques. A ministra das Relações Exteriores da Alemanha, Annalena Baerbock, anunciou no domingo (22) que Berlim "não ficaria no caminho" se a Polônia ou outro operador do Leopard 2 enviasse tanques de batalha principais de suas próprias reservas para Kiev.
O que é um tanque de combate principal?
Também conhecido como tanque de batalha principal (Main Battle Tank, ou MBT, em inglês) ou "tanque universal" ou kampfpanzer (tanque de batalha em alemão), é um termo usado pelos Exércitos ocidentais para definir a plataforma principal das forças terrestres blindadas, que combinam um poder de fogo pesado, uma blindagem espessa e mobilidade.
Na terminologia militar soviética e russa, os MBTs são conhecidos simplesmente como "tanques principais" e tendem a ser mais leves, menores e mais curtos que seus equivalentes ocidentais, de acordo com as doutrinas focadas na guerra de alta mobilidade, em que o combate tanque contra tanque é apenas um componente do uso de tanques de batalha principais. As potências ocidentais, por outro lado, passaram as últimas três décadas do século XX e até os dias atuais construindo tanques cada vez maiores, mais pesados, mais caros e mais potentes.
Os MBTs são um produto do período imediatamente após a Segunda Guerra Mundial, quando os avanços em blindagem, canhões pesados e potência do motor possibilitaram a construção de unidades blindadas mais pesadas que combinavam mobilidade e poder de fogo. Os primeiros MBTs foram o Centurion britânico, o T-54 soviético e a série norte-americana Patton.
Do final da década de 1940 até hoje, foram desenvolvidas quatro gerações de tanques de batalha principais. A segunda geração, que surgiu no final dos anos 1950, normalmente apresentava melhorias em termos de armas ainda mais pesadas, formas iniciais de proteção contra ataques nucleares, biológicos e químicos (NBQ) e a capacidade de lutar de noite.
A terceira geração, que surgiu em meados da década de 1970, adicionou blindagem explosiva reativa ou composta, sistemas de controle de tiro automáticos e/ou computadorizados e melhorias na imagem térmica.
Os tanques de quarta geração, que chegaram na década de 2010, focaram em melhorias tecnológicas, como deslocamento e controle de tiro assistidos por inteligência artificial (IA), torres, cascos e sistemas de armas aprimorados. Apenas algumas centenas de tanques de quarta geração, como o Type 10 do Japão e o K2 Black Panther da Coreia do Sul, foram usados em campo. Enquanto isso, EUA, França, Rússia, Alemanha, Turquia, Reino Unido, Índia e outros países estão trabalhando em seus próprios projetos, seja para uma melhoria profunda em plataformas já existentes, como o Leclerc XLR francês e o Challenger 3 do Reino Unido, ou um novo, como o T-14 Armata russo.
O que é o Leopard 2 e para que serve?
O Leopard 2 é um MBT de terceira geração. Desenvolvido na década de 1970 pela gigante de armas Krauss-Maffei, com sede em Munique, e colocado em serviço no Exército da Alemanha Ocidental em 1979, o Leopard 2 foi o sucessor do Leopard 1, um kampfpanzer de segunda geração projetado pela Porsche e construído pela Krauss-Maffei de meados dos anos 1960 a meados dos anos 1980.
Como a maioria dos tanques ocidentais e russos contemporâneos em serviço hoje, o Leopard 2 é um produto da Guerra Fria, quando a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) e o Pacto de Varsóvia esperavam se chocar nas planícies e florestas de uma Alemanha dividida.
O tanque de 62 toneladas, 10 metros de comprimento, 3,75 metros de largura e 3 metros de altura comporta uma equipe de quatro pessoas e incorpora um motor diesel biturbo V12 refrigerado a líquido que permite percorrer entre 220 e 340 km a velocidades de até 70 km/h com um único tanque de combustível.
Seu principal armamento é o canhão liso Rh-120 de 120 mm fabricado pela Rheinmetal, a mesma plataforma utilizada no norte-americano M1 Abrams, no japonês Type 90, no sul-coreano K1A1 e, futuramente, no britânico Challenger 3. O canhão tem duas versões, a L/44 e a L/55, que diferem no comprimento do calibre e, consequentemente, na velocidade e alcance do projétil.
O armamento secundário inclui duas metralhadoras de 7,62 mm. O tanque possui blindagem composta, incluindo aço, cerâmica e tungstênio, com espessura variando de 30 a 860 mm. Entusiastas de tanques apontaram vários pontos fracos na construção do Leopard 2, como a mira do artilheiro principal, literalmente um buraco na blindagem frontal crucial da torre, e o compartimento da tripulação, que é protegido por um design de blindagem homogêneo laminado que deixa toda a torre do tanque vulnerável ao fogo inimigo em condições de guerra assimétrica.
As fábricas da Alemanha Ocidental produziram 3.600 Leopard 2 entre 1979 e 1992, tornando-os um dos tanques mais amplamente fabricados entre os militares da OTAN. No final da Guerra Fria, foram desenvolvidas quatro variantes para melhorar o modelo base: o 2A1, 2A2, 2A3 e 2A4, com melhorias como a mira térmica do artilheiro, melhor blindagem e proteção NBQ e novos equipamentos de comunicação.
Os 2A4 incorporam um sistema automatizado de supressão de incêndio, controles de disparo totalmente digitais e blindagem de titânio. A Bundeswehr modernizou mais de três quartos de seus Leopard 2 para a variante 2A4 no final da Guerra Fria. A variante atual, a 2A5, adotada a partir de meados da década de 1990, apresenta blindagem de torre mais espessa e angulada, novas miras térmicas, bem como computadores atualizados, câmeras, GPS e outras melhorias.
Ao mesmo tempo, existem variantes ainda mais avançadas, como a 2A6 e a 2A7, que têm presença limitada nas Forças Armadas que as adaptaram. De fato, alguns países estão realizando uma atualização de seus 2A5 até o nível dessas duas versões. Suas primeiras entregas começaram nos anos 2000.
Quantos Leopard 2 tem a Alemanha?
Atualmente, a Alemanha possui apenas uma pequena parte dos Leopard 2 construídos, com 328 unidades em estoque. A maior parte do que havia restado foi vendida após o fim da Guerra Fria.
Quantos Leopard 2 os outros países têm?
Os Países Baixos e a Suíça compraram vários Leopard 2 na década de 1980, e os carros foram exportados no início da década de 1990 para mais de uma dúzia de países, incluindo Canadá, Polônia, República Tcheca, Eslováquia, Hungria, Áustria, Noruega, Finlândia, Suécia, Dinamarca, Espanha e Portugal, assim como Grécia, Turquia, Indonésia, Cingapura, Chile e Catar.
Qual é o histórico de serviço do Leopard 2?
Em sua vida de 44 anos em serviço, os Leopard 2 foram implantados em meia dúzia de missões por países da OTAN, começando com a "força de manutenção de paz" liderada pelo bloco que ocupou o Kosovo após a agressão brutal e sangrenta da OTAN contra a Iugoslávia em 1999. A Bundeswehr enviou 28 Leopard 2 para o Kosovo numa demonstração de força, mas a sua mobilidade foi restringida devido ao seu imenso peso, que ultrapassou a capacidade de algumas pontes locais. Os Leopard 2 alemães também foram enviados para a Macedônia em 2001, para proteger um armazém de logística até sua retirada em 2004. As forças holandesas enviaram Leopard 2 para a Bósnia para a operação de Peace Enforcement (imposição da paz) da Força de Implementação (IFOR, na sigla em inglês) da OTAN.
A primeira experiência de combate do Leopard e as perdas no campo de batalha começaram durante a guerra liderada pelos Estados Unidos no Afeganistão. Durante a luta contra o Talibã (organização sob sanções da ONU por atividade terrorista), três Leopard 2 canadenses e seis dinamarqueses foram destruídos, e outros 15 Leopard canadenses foram danificados, mas reparados. As perdas foram atribuídas principalmente a bombas na estrada, com as tripulações dos veículos geralmente sobrevivendo com ferimentos leves graças à boa proteção da blindagem do tanque.
No entanto, o motorista de um Leopard 2 dinamarquês foi morto em julho de 2008 por um dispositivo explosivo improvisado e os outros membros da tripulação sofreram ferimentos de diferentes níveis de gravidade.
A Turquia implantou dezenas de seus tanques Leopard 2A4 no norte da Síria em 2016 e 2018, onde se envolveram em combates ferozes contra combatentes curdos e do Daesh (grupo terrorista banido na Rússia e em uma série de outros países). Uma dúzia ou mais de Leopard 2 turcos foram abatidos em combates na Síria até o momento, perdidos por dispositivos explosivos improvisados, carros-bomba suicidas ou mísseis guiados antitanque, e outros dois foram capturados pelo Daesh no final de 2016 fora da cidade de al-Bab.
Em 2017, a mídia alemã estimou que até dez Leopard 2 turcos foram destruídos pelo Daesh, seis deles usando o Kornet, um míssil antitanque russo amplamente exportado. Em 2018, as forças curdas divulgaram imagens de um ataque de mísseis mortal a um Leopard 2, no qual o tanque foi destruído e todos os quatro tripulantes foram mortos.
A atuação do Leopard 2 na Síria levantou dúvidas entre os observadores alemães sobre a adequação dos tanques para ambientes urbanos e contra insurgentes. "Veículos pesados de esteira são projetados para um duelo [contra outros tanques] e sua proteção máxima está na frente [...] é relativamente vulnerável em suas áreas menos protegidas", afirmou um relatório da Welt na época.
Se enviados para a Ucrânia, os tanques alemães vão enfrentar problemas semelhantes, além dos problemas associados ao engajamento com um inimigo convencional com artilharia pesada e apoio aéreo. Os planejadores militares russos quase certamente vão priorizar a destruição de qualquer Leopard 2 avistado no campo de batalha, apenas para transmitir aos apoiadores ocidentais de Kiev que os poderosos tanques não são invencíveis.
Como o Leopard 2 se compara ao M1 Abrams?
Autoridades dos EUA instaram a Alemanha a implantar seus Leopard 2 na Ucrânia, citando sua eficiência de combustível e facilidade de manutenção em comparação com o MBT dos EUA, o M1 Abrams. Em um briefing na semana passada, a porta-voz do Pentágono, Sabrina Singh, explicou que os Abrams não são adequados para as condições na Ucrânia.
"Os Abrams são mais um problema de manutenção. Quero dizer, este é um tanque que requer combustível de aviação, enquanto o Leopard e o Challenger têm um motor diferente. Eles exigem diesel. É um pouco mais fácil de manter. Eles podem manobrar em grandes extensões de território antes de ter que reabastecer. A manutenção e o alto custo de manutenção de um Abrams faz com que não tenha sentido fornecê-lo aos ucranianos neste momento", disse Singh.
Na verdade, o motor Honeywell AGT1500 do Abrams é multicombustível, o que significa que pode funcionar com combustível de aviação, mas também com diesel comum, gasolina ou mesmo uma mistura de diesel e fuelóleo pesado conhecida como diesel marítimo. Singh estava correta quando afirmou que o Abrams consumia 392 litros de combustível para percorrer 100 km e 38 litros por hora com o veículo parado. O funcionamento e a fumaça extremamente quentes do escapamento do motor do Abrams também são um risco à segurança das tropas próximas. O tanque tem autonomia de 200 km fora de estrada e 426 km em rodovias.
Em outras palavras, não está claro por que o Pentágono está pressionando a Alemanha a desistir de seus Leopard 2, em vez de enviar Abrams. Talvez Washington tema que a reputação de seus MBTs seja ainda mais manchada depois que várias centenas foram perdidos ou danificados após a invasão do Iraque em 2003.
Qual é o equivalente russo e ucraniano do Leopard 2?
Devido às diferentes visões estratégicas do combate blindado pelos estrategistas da OTAN e do Pacto de Varsóvia, não há tanque soviético ou russo projetado especificamente para enfrentar um Leopard 2 em combate um-a-um. Durante décadas, os entusiastas da guerra em todo o mundo debateram incessantemente "qual tanque é melhor", girando principalmente em torno dos tanques soviéticos e russos T-80 e T-90.
Os defensores do Leopard 2 apontam para sua blindagem mais espessa, melhores sistemas de controle de fogo e canhão principal mortal. No entanto, os proponentes do T-80 e do T-90 apontam para sua confiabilidade, agilidade, tamanho menor e perfil mais baixo, bem como custos de produção e manutenção mais baixos, o que significa que eles podem ser mais implantados em um campo de batalha maior. Além disso, os tanques russos pesam substancialmente menos que seus oponentes ocidentais, quase nunca ultrapassando 50 toneladas de peso, que é o limite para a maioria das pontes no território da antiga União Soviética.
Como acontece com qualquer sistema de armas moderno, o desempenho no mundo real vai depender de uma ampla gama de fatores, incluindo a quantidade de apoio de infantaria com artilharia ou mísseis guiados antitanque, inteligência estratégica e tática no campo de batalha, proficiência dos comandos e, é claro, da competência das tripulações dos tanques de batalha.
Por que a implantação de tanques Leopard 2 na Ucrânia é controversa?
Como alertaram as autoridades russas, o envio de armamento cada vez mais pesado da OTAN para a Ucrânia constitui uma escalada da crise, servindo como mais uma prova do uso de Kiev pela aliança ocidental como um substituto em seu conflito contra Moscou. A implantação do Leopard 2 na Ucrânia também marcaria a primeira vez que os tanques alemães chegariam em solo ex-soviético desde a Segunda Guerra Mundial, um fator psicológico que sem dúvida vai afetar as mentalidades alemã e russa no conflito atual.
Comentando o debate sobre o envio do Leopard 2 para Kiev, o diretor do Centro de Pesquisa sobre Terrorismo e Contraterrorismo de Ancara, Unal Atabay, disse à Sputnik que, se Berlim der sinal verde, as perspectivas de negociações para tentar acabar com a crise ucraniana se tornariam ainda mais ilusórias.