A cúpula entre a União Europeia (UE) e a Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (CELAC) reúne na segunda-feira (17) e terça-feira (18) chefes de Estado e de governo europeus, latino-americanos e caribenhos em Bruxelas, Bélgica.
Trata-se do principal fórum de diálogo e cooperação entre a Europa e a América Latina e o Caribe, e a terceira reunião em sua história, com a primeira datando de 2015. O objetivo é desenvolver prioridades compartilhadas, como as transições digital e verde, a luta contra as mudanças climáticas, a perda de biodiversidade, a saúde, a segurança alimentar, a migração, a segurança e a governança, e também a luta contra o crime transnacional.
O encontro inclui a ausência notável dos presidentes Nicolás Maduro, da Venezuela, Andrés Obrador, do México, e de Daniel Ortega, da Nicarágua.
"A falta de transparência e o comportamento manipulador da União Europeia nos preparativos para a cúpula comprometem seriamente o sucesso da reunião", disse o ministro das Relações Exteriores cubano, Bruno Rodríguez, na véspera do evento, quando detectou em Bruxelas a intenção de decidir quem poderia comparecer e quem não poderia.
"Neste momento, a UE é o Doutor Jekyll da OTAN, porque toda a sua agenda internacional é ocupada pela Ucrânia. E essa é uma agenda que foi rejeitada pela América Latina", comentou Augusto Zamora, ex-diplomata nicaraguense e professor universitário de Direito Internacional Público e Relações Internacionais na Universidade Autônoma de Madri, Espanha, à Sputnik.
Ele lembrou que Pedro Sánchez, primeiro-ministro da Espanha, tentou convidar o presidente ucraniano Vladimir Zelensky para a cúpula, mas vários países latino-americanos se expressaram contra o passo.
Agenda oculta?
Na opinião de Zamora, a UE quer com esta agenda usar a cúpula para atrair os países da CELAC para as políticas europeias de sanções contra a Rússia e envio de armas para a Ucrânia, e "demonstrar o isolamento da Rússia" no mundo.
"Mas o que está sendo revelado é que são os europeus que estão isolados. E, nesse sentido, a cúpula representa um retrocesso para a UE", afirma o especialista, lembrando o desejo de países como "México, Argentina e até mesmo Nicarágua" de se juntar ao BRICS, "onde o mais importante de todos, o Brasil, já está presente".
"A UE quer mostrar que a América Latina está com ela, mas esse não é o caso, pois seu principal parceiro comercial é a China, e a Rússia é um importante parceiro militar e político", sublinhou Zamora, observando a conveniência da cúpula para Sánchez "se projetar como um estadista no período que antecede as eleições".
Aspecto econômico
O Banco Europeu de Investimento (BEI) está buscando impulsionar os acordos comerciais com o Chile, o México e o Mercosul. Bruxelas está negociando a extração de lítio no Chile, e Sánchez, cujo país preside atualmente sobre a UE, e o presidente chileno, Gabriel Boric, se reuniram na sexta-feira (14) em Madri, Espanha, para discutir a questão.
A Comissão Europeia anunciou igualmente sob a iniciativa de Global Gateway um plano para alocar mais de € 45 bilhões (R$ 243,23 bilhões) em investimentos "inteligentes" para a América Latina e o Caribe.
Ao mesmo tempo, o acordo com o Mercosul está estagnado devido aos subsídios de Bruxelas aos agricultores europeus, não estando claro como ele poderia lidar assim com um influxo maciço de soja e carne a preços baratos, por exemplo.
O economista e autor Santiago Niño Becerra, professor emérito de Estrutura Econômica da Universidade Ramón Llull, Barcelona, Espanha, opinou à Sputnik que não é possível atingir um "acordo de paridade" entre os dois blocos devido à grande diferença na produtividade entre as duas regiões, "e o Brasil e outros países já disseram que não querem entrar em acordos neocoloniais".
"O acordo entre o Mercosul e a UE é inviável por princípio, porque o Mercosul representa um mercado de exportação, enquanto o da UE é de natureza protecionista, de modo que os interesses econômicos estão cada vez mais distantes", afirma Augusto Zamora.
Haverá resultado?
Diante desse cenário, Zamora não vê como realista uma "festa ocidental-latino-americana e caribenha" além das boas intenções.
"Não haverá grandes acordos", e "não haverá sequer uma declaração conjunta", prevê.
"As linhas são antagônicas. A linha da UE é anti-China, mas a China é o principal parceiro comercial da América Latina. Nunca houve tanto distanciamento entre a UE e a América Latina como agora. Portanto, a cúpula é letra morta, não fará nada de substancial, as posições estão muito distantes", disse Augusto Zamora, analista internacional.