Panorama internacional

Sarkozy diz que EUA foram contra submarino nuclear para Brasil: 'Não aceitam recusa de alinhamento'

Ex-líder francês conta que durante seu governo "transgredi as regras habituais e ignorei a oposição dos EUA", aceitando "ajudar o Brasil" a adquirir submarinos. Sobre a Ucrânia, Sarkozy acha que a França erra em entregar armas para Kiev e critica Zelensky que fica "dando lições de moral''.
Sputnik
O ex-presidente da França, Nicolas Sarkozy, acaba de publicar um terceiro livro de memórias intitulado "O Tempo de Combates", desta vez cobrindo os anos 2009 a 2011. De acordo com a coluna de Assis Moreira no jornal Valor Econômico, uma parte do livro é sobre os laços de Sarkozy com homólogos estrangeiros. Sobre o Brasil, Sarkozy exalta simpatia pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

O colunista relata que no livro, o ex-líder francês diz que, em relação ao presidente brasileiro, "tudo nos diferenciava, a língua, a orientação política, a história pessoal […] no entanto, nos entendemos instantaneamente. […] eu gostava de sua maneira de ver as pessoas e as situações. Ele foi mesmo um dos chefes de Estado por quem eu tenho mais simpatia".

Uma das partes mais interessantes do livro, é quando Sarkozy relata um churrasco que Lula tentou fazer para ele em setembro de 2009 em Brasília, mas que não deu certo, visto que aconteceu uma explosão.
"Lula, querendo fazer bem, tinha sem dúvida colocado carvão demais na churrasqueira. […] Estávamos sentados há apenas dez minutos quando ouvimos uma violenta explosão que nos assustou e fez aparecer uma quantidade respeitável de militares brasileiros armados que, visivelmente, podem ter pensado em um atentado."
Após alguns minutos, a causa da barulheira foi descoberta: a famosa churrasqueira tinha explodido com um ruído terrível de vidros quebrados que caíram sobre a carne destinada ao churrasco. O jeito foi se dirigirem para uma sala anexa para degustar uma moqueca acompanhada de feijão, conta o colunista.
O presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, e o então presidente francês, Nicolas Sarkozy, reagem após uma coletiva de imprensa em Copenhague, 17 de dezembro de 2009
Ainda sobre a visita, a prioridade de Sarkozy na relação que queria estabelecer com o Brasil na época de Lula focava a indústria de armamentos.

"Eu transgredi as regras habituais e ignorei a oposição dos Estados Unidos, aceitando ajudar os brasileiros a adquirir submarinos com propulsão nuclear", diz o ex-presidente observando que a cooperação nada tinha a ver com bomba atômica. Na cooperação com os franceses, o primeiro submarino brasileiro com propulsão nuclear deve ser concluído em 2029.

Sarkozy também relata que aproveitou para convencer Lula a comprar aviões de combate Rafale. O presidente brasileiro anunciou negociações para comprar 36 Rafale, o que não tardou "a provocar uma real tensão com os americanos que se bateram até o fim para fazer esse projeto fracassar". No entanto, o Brasil acabou por adquirir aviões de combate Gripen, da Suécia.
"Os americanos não aceitam bem a menor recusa de alinhamento sistemático, que é imediatamente percebida como uma traição", escreve acrescentando que "são os americanos, e somente eles, que fazem a chuva e o bom tempo" no Fundo Monetário Internacional (FMI).
Ainda no campo da defesa, mas agora em relação ao conflito entre Rússia e Ucrânia, Sarkozy diz que a França errou ao entregar armas "a um dos beligerantes" e crítica aqueles que pedem apoio à Ucrânia "até o fim".
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Ele escreve estar cansado de ouvir declarações cotidianas do presidente americano Joe Biden anunciando que novos bilhões de dólares serão destinados à compra de armas para os ucranianos, "como se a guerra fosse em si um objetivo''. Reclama também do presidente ucraniano, Vladimir Zelensky "dando lições de moral'', por exemplo a empresas que negociam com a Rússia, conta Assis Moreira.
O ex-presidente francês também julga ilusório qualquer retorno de territórios ocupados pela Rússia, desde a Crimeia a Donbass. Nos dois casos, Sarkozy sugere realização de referendos.
Em geral, Sarkozy acredita que o mundo "está face a uma crise de civilização, a uma mudança completa de paradigma e que assistimos à um deslocamento do eixo de nosso planeta. [...] Nós, os europeus, éramos o centro do mundo. Não somos mais. A Ásia se tornou o eixo estratégico maior. Nós éramos dominantes. Estamos em vias de ser dominados [...]".
"Todo o Ocidente, ou seja, pelo essencial os Estados Unidos e a Europa, representa hoje um pouco mais de 800 milhões de habitantes. O que isso pesa face à Asia que conta 4,5 bilhões de habitantes? [...] E se amanhã o eixo do mundo deveria mudar mais uma vez, sua aposta é que isso beneficiará a África, que em menos de 30 anos terá 2,5 bilhões de habitantes comparado a 1,3 bilhão hoje. De todos os desafios do planeta, o desafio demográfico é sem dúvida o mais perigoso", complementou o ex-presidente francês.
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