Panorama internacional

Brasil e Paraguai unem forças regionais contra protecionismo verde no acordo Mercosul-UE

Brasil e Paraguai se comprometeram, no mês passado, a retomar a Comissão de Comércio Bilateral, desativada há sete anos. A decisão foi tomada durante reunião, em Brasília, entre autoridades ministeriais da indústria e comércio de ambos os países, na qual foi estabelecida uma pauta de prioridades nesses segmentos.
Sputnik
O encontro na capital brasileira marcou uma importante aproximação entre as duas nações sul-americanas, que vem sendo sinalizada por Assunção desde que o presidente Santiago Peña assumiu o poder, no último dia 15, seja através de declarações positivas sobre a postura do governo brasileiro, da priorização de visitas oficiais ou da busca de posicionamentos comuns sobre certos temas das agendas regional e internacional.
Paraguai e Brasil movimentaram cerca de US$ 7 bilhões (R$ 34,7 bilhões) em transações comerciais no último ano, com o Brasil exportando, principalmente, máquinas agrícolas, carros e fertilizantes e importando arroz, equipamentos para distribuição de energia elétrica e carne bovina.
Os dois países são parceiros na Usina Hidrelétrica de Itaipu e no Mercado Comum do Sul (Mercosul), cooperam nas áreas de segurança e inteligência, têm projetos conjuntos de infraestrutura, vêm aumentando seus fluxos de investimento, compartilham uma extensa fronteira de 1.339 quilômetros e importantes laços sociais.
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Um dos debates que mais têm aproximado os dois governos atualmente é o que gira em torno do acordo Mercosul-União Europeia (UE), alvo de exigências crescentes dos países europeus, amplamente criticadas pelo presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, e pelo seu colega paraguaio. Peña inclusive chegou a defender uma interrupção das negociações entre os blocos, alegando desconfiança do "interesse genuíno" da UE em avançar nas tratativas.
No cerne do impasse estão demandas europeias consideradas inaceitáveis pelos sul-americanos. Uma delas diz respeito a punições para os países do Mercosul em caso de violações de compromissos ambientais internacionais, o que é amplamente visto como uma medida protecionista em prol dos produtores europeus.
A outra prevê a abertura de processos de compras públicas para empresas estrangeiras, suspendendo, assim, a utilização do mecanismo de compras estatais como forma de incentivar pequenas e médias empresas nacionais, o que também seria muito mais benéfico para os empresários da Europa.

"A articulação entre Paraguai e Brasil deve aproveitar para criar sinergias entre os seus interesses, criando melhores condições de negociações dos complementos contratuais. A Europa tem consciência do peso da importância do Brasil, da Argentina, do Paraguai, do Uruguai — assim como há um interesse recíproco. Os interesses da Europa não se restringem apenas à arena econômica, incluindo interesses nas relações políticas. Porque interessa à Europa, do ponto de vista político, uma boa relação com a América do Sul", avaliou Regiane Bressan, professora de relações internacionais da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e especialista em América Latina, em entrevista à Sputnik Brasil.

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Para ela, a aproximação entre Brasil e Paraguai reforça a integração regional em momento de ameaça, com possível guinada do governo da Argentina para a extrema-direita.
No próximo dia 15, Brasília sediará a primeira reunião presencial para tratar do acordo entre os blocos desde a apresentação das novas exigências da UE. O Mercosul deve apresentar uma contraproposta. O Brasil, atual presidente do grupo sul-americano, aguarda apenas os comentários do Paraguai para o Itamaraty redigir a carta oficial, uma vez que os demais membros já responderam.
As sintonias entre Brasília e Assunção no enfrentamento ao chamado protecionismo verde podem render frutos em outras áreas de interesse comum para brasileiros e paraguaios, conforme avalia Charles Pennaforte, professor de relações internacionais da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e coordenador do Laboratório de Geopolítica, Relações Internacionais e Movimentos Antissistêmicos (LabGRIMA).
Em entrevista à Sputnik Brasil, ele avaliou que, em caso de vitória do direitista Javier Milei, a não participação da Argentina (ou a vontade da Argentina em menor intensidade) é ruim para o Mercosul. Isso porque o atual presidente do Uruguai, o também conservador Luis Alberto Lacalle Pou, tem feito várias críticas ao bloco.

"Nesse vácuo surgido entre sócios-fundadores, o Paraguai pode ocupar um espaço de proeminência, de destaque, ao propor uma pauta lógica, factível de discussão, que realmente veja o desenvolvimento do bloco como um fim. O Paraguai, no momento, tem uma questão muito lógica do seu papel e da sua capacidade. Certamente será importante e pode ocupar, sem dúvida alguma, um lugar de destaque mais à frente."

Neste ano, Brasil e Paraguai devem negociar a revisão do Anexo C do Tratado de Itaipu, que estabelece as condições de suprimento de energia, o custo do serviço de eletricidade, a receita e outras disposições que compõem as bases financeiras e de prestação dos serviços de eletricidade da empresa, constituída em igualdade de direitos e obrigações pelos dois países.
Em encontro com Lula em Brasília, no final de julho, o então presidente eleito Santiago Peña demonstrou otimismo com a possibilidade de um acordo rápido e vantajoso para as duas partes.

"O Paraguai não tem como vender a energia excedente para outros países. Talvez a Argentina, o Uruguai e o Chile comprem um pouco, mas o grande comprador é o Brasil, e isso pode facilitar esse acordo", concluiu à Sputnik Brasil Michel Alaby, diretor regional da Câmara de Comércio, Indústria e Serviços do Brasil (Cisbra) em São Paulo.

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