Brasil e países africanos têm desafios comuns no Atlântico Sul, diz capitão de fragata da Marinha
16:55, 13 de novembro 2023
A Marinha do Brasil encerrou na última semana um exercício militar conjunto com as forças navais de Angola, Costa do Marfim, Namíbia e Togo, iniciado em setembro, com a chegada da fragata em solo brasileiro.
SputnikA missão visava capacitar as forças da costa oeste africana, abrangendo desde o enfrentamento da pirataria, do sequestro de pessoas e do tráfico de armas e drogas até operações de socorro e salvamento. O intuito também era fortalecer laços e promover a segurança marítima na região.
Em entrevista exclusiva à Sputnik Brasil, o capitão da embarcação, Leonardo Gomes Barros, discutiu os significativos avanços e contribuições resultantes da recente participação em exercícios militares multinacionais na África.
Ele avalia que a Marinha do Brasil desempenhou papel crucial na operação Grand African Nemo, fortalecendo sua imagem e aprimorando a interoperabilidade regional no Atlântico Sul, consolidando o país como ator geopolítico relevante na região.
"A participação da Marinha no exercício militar multinacional e as visitas representativas aos países africanos contribuíram para a interoperabilidade regional dos países do Atlântico Sul no enfrentamento à insegurança marítima, bem como para o fortalecimento de laços de amizade entre os países."
O capitão ressalta a importância em compartilhar conhecimento, o que possibilita a adaptação de técnicas africanas ao modelo vigente brasileiro e vice-versa. "Os desafios para a segurança marítima no Atlântico Sul são comuns aos países africanos e ao Brasil, como tráfico de drogas, descaminho ou pesca ilegal."
"Realizar o exercício multinacional que explora o uso da plataforma de monitoramento e vigilância da arquitetura de Yaoundé (YARIS) é um grande compartilhamento de conhecimento e aprendizado. Isso contribui sobremaneira para a interoperabilidade regional e, consequentemente, para o combate à insegurança marítima no Atlântico Sul."
Para ele, a consolidação da Zona de Paz e Cooperação do Atlântico Sul (Zopacas) é fundamental para
as relações bilaterais e o fortalecimento militar naval.
Países pertencentes à zona têm interesse comum em dissuadir e afastar áreas de perigo no Atlântico Sul, buscando fomentar a economia azul, por meio de incremento na segurança marítima regional.
"A maior interação entre as marinhas do continente africano e do Brasil proporciona o fortalecimento de procedimentos de enfrentamento à insegurança."
13 de outubro 2023, 16:13
Por fim, ele ressalta outras missões em curso, como Obangame Express, Grand African Nemo e GUINEX, no continente africano, e FRATERNO, UNITAS e BOGATUN, na América do Sul.
Quais os países que compõem a Zopacas na atualidade?
A Zopacas é integrada por 24 países, sendo eles África do Sul, Angola, Argentina, Benin, Brasil, Cabo Verde, Camarões, Congo-Brazzaville, Congo-Kinshasa, Costa do Marfim, Gabão, Gâmbia, Gana, Guiné, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Libéria, Namíbia, Nigéria, São Tomé e Príncipe, Senegal, Serra Leoa, Togo e Uruguai, conforme resolução de 1986 das Nações Unidas.
O comandante Robinson Farinazzo, oficial da reserva da Marinha e apresentador do canal Arte da Guerra, comenta que havia maior prioridade dada por governos anteriores, especialmente durante as primeiras gestões de Luiz Inácio Lula da Silva.
No entanto, uma reunião ministerial em Cabo Verde ocorrida em abril trouxe os países-membros da Zopacas de volta à mesa de discussões, após um hiato que se estendia desde 2013.
Ele ressalta a importância do Atlântico Sul para o Brasil, destacando a
dependência do país de exportações e importações, bem como a necessidade de fortalecimento naval para garantir linhas de comunicação marítimas seguras e portos abertos.
"É o maior desafio estratégico do nosso país, porque dependemos de exportações e importações […]. Lógico, se pudermos contar com o apoio e a cooperação de marinhas amigas nesse sentido, eu acho muito importante."
Onde a Marinha atua?
A Marinha do Brasil é um dos três ramos das Forças Armadas do Brasil, responsável por conduzir operações navais. Sendo a maior da América do Sul e da América Latina, e a segunda maior da América, a força é vista como uma
peça importante na segurança do Atlântico Sul.
Farinazzo comenta que o período dos militares na África contribui para o desenvolvimento militar e de imagem da Marinha brasileira, consolidando laços diplomáticos e fortalecendo a posição do Brasil no cenário internacional. "A Marinha não é um corpo independente, ela segue a
política externa do Brasil."
"A Marinha, seguindo os passos da política externa do Brasil, deve ampliar a cooperação não só com as marinhas dos países da África, mas também do Oriente Médio, outras nações sul-americanas, Europa etc."
Diante de desafios globais, especialmente destacando
conflitos recentes, como o de Israel, o comandante sublinhou
a necessidade de o Brasil investir em capacidades de defesa avançadas, como mísseis de longo alcance e drones, para proteger suas linhas de comunicação marítimas e garantir a segurança nacional.
"O Brasil é um país que se relaciona bem com todo mundo, nós não temos problemas de fronteira com ninguém (não no atual momento), então o Brasil procura cooperar com as marinhas das nações amigas. Mas precisamos pensar estrategicamente."
Ainda assim, segundo ele, o bom desempenho do militar brasileiro em território internacional faz com que o histórico positivo pese a favor.
"O militar brasileiro é altamente competente, empenhado. Ele já é empenhado nos serviços no Brasil, imagina quando você está lidando com o exterior. Penso que a missão tem bom resultado e que o relacionamento militar do Brasil com outros países sempre foi muito bom", ressalta, comentando também a atuação militar brasileira durante a Segunda Guerra Mundial, em Suez e no Haiti.
O especialista explica que o Brasil oferece treinamento a outros países, tais como técnicas de guerra de selva, guerra de caatinga, operações urbanas e missões de força de paz. Vale ressaltar que a Marinha atua não somente protegendo o litoral, mas também rios e lagos em todo o território brasileiro.
Qual é a função da Marinha na cooperação com a África?
Superintendente de pesquisa e pós-graduação da Escola Naval, o almirante Márcio Franco comenta que a cooperação militar-naval com alguns países da África é antiga e positiva para o Brasil e seus parceiros. "Essas parcerias só se fortalecem ano a ano. Desde a instituição da Zopacas pela ONU, os países africanos veem o Brasil como um amplo parceiro em diferentes campos, especialmente no econômico, social e militar."
"A imagem da Marinha do Brasil é a melhor possível. Somos muito bem recebidos em qualquer porto de países amigos. As cooperações militar-navais abrangem do apoio ao treinamento básico até a formação de pessoal especializado na condução de embarcações, incluindo máquinas e navegação."
2 de fevereiro 2021, 12:37
Para ele, a missão atual é uma das centenas iniciativas já conduzidas, que trazem valor de cooperação. "As técnicas treinadas e repassadas são de conhecimento internacional. Não há novidades nessas técnicas de cooperação. O que a Marinha aplica são apenas ações de boa vontade e maior aproximação com os países visitados. Quando solicitado, realizamos o treinamento conjunto."
"Embora eu não fale por toda a instituição, a Marinha é muito zelosa com a cooperação internacional, que, ao final, contribui para a imagem positiva do país. Essas ações refletem o compromisso e a responsabilidade do Brasil em ser um parceiro confiável, fortalecendo os laços e a compreensão mútua entre as nações."
Por fim, ele ressalta que há cooperações na formação de fuzileiros navais, "o que é muito salutar, pois cria uma estreita ligação entre o instrutor e o aluno e, consequentemente, com a terra a que pertencem. Todas as formas de cooperação são muito bem avaliadas".