'Vamos aprender a negociar sem o dólar como moeda padrão', diz Lula em evento do BNDES
22:19, 6 de dezembro 2023
Em cerimônia para assinatura de contratos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) com o banco do BRICS, presidente do Brasil critica o uso da moeda americana como padrão em negociações internacionais.
SputnikO presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) defendeu o fim do uso do dólar como moeda padrão em negociações internacionais, na tarde desta quarta-feira (6), em
cerimônia na sede do BNDES, no Rio de Janeiro, que foi acompanhada pela Sputnik Brasil.
A cerimônia marcou a assinatura de dois contratos de captação do BNDES com o Novo Banco de Desenvolvimento, popularmente conhecido como banco do BRICS.
Estavam presentes no evento a ex-presidente da República e atual presidente do banco do BRICS, Dilma Rousseff, o presidente do BNDES, Aloizio Mercadante, o prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, além do ex-presidente uruguaio José Mujica.
Em discurso na cerimônia, Lula apontou a necessidade de inovar nas transações com outros países, com alternativas ao uso da moeda americana.
"Nós vamos ter de aprender a negociar sem precisar do dólar como moeda padrão. Por que eu preciso negociar com a China precisando de dólares? Por que eu preciso negociar com qualquer outro país precisando de dólar? Só com os Estados Unidos, que têm a casa da moeda do dólar. Então o que nós precisamos é tentar inovar", disse o presidente.
Lula exaltou a atuação do BNDES, afirmando que o banco foi crucial para blindar o país dos efeitos da crise de 2008 e para evitar que o país quebrasse na turbulência política e econômica vivenciada no governo do Jair Bolsonaro, sem citar nominalmente o ex-presidente.
"Esses bancos [de desenvolvimento] existem para fazer o que os bancos privados não querem fazer. Esse banco aqui salvou o Brasil em muitos momentos. Eu e o companheiro Mercadante temos uma missão, que é a missão de fazer e esse país voltar a crescer. E para o país voltar a crescer o BNDES é uma peça importante."
O presidente rebateu críticas em relação a gastos gerados por investimentos, apontando para os benefícios do retorno gerado pelo investimento.
"Nós vamos convencer a sociedade brasileira e nosso glorioso mercado de que não tem nenhum problema você ter uma dívida, se aquela dívida é para construir um ativo produtivo que vai render, que vai baratear as coisas que você produz, melhorar o investimento em tecnologia."
Falando sobre a última rodada de viagens internacionais, Lula afirmou que o objetivo era recuperar a imagem do Brasil no exterior, que, segundo ele, foi prejudicada na gestão anterior.
"A praga de gafanhoto que passou por esse país aqui fez as pessoas descobrirem o quanto é importante esse país ter um governo democrático, o quanto é importante esse país ter um governo civilizado, o quanto é importante esse país ter um governo que pensa nesse país. Vocês não têm noção de como eu sou tratado lá fora. Porque as pessoas perceberam a diferença de um governo que age de forma civilizada", disse Lula.
Em seguida, o presidente se dirigiu à Dilma e afirmou que o banco do BRICS não pode replicar a cartilha do sistema internacional e do Fundo Monetário Internacional (FMI), e citou como exemplo
a dívida da África.
"Nós não podemos repetir o que faz o sistema internacional, não podemos repetir o que faz o FMI. O FMI não empresta dinheiro para salvar, ele empresta uma corda para se enforcar. Como é que a gente vai resolver uma dívida de US$ 860 bilhões [R$ 4,2 trilhões] que tem o continente africano, se os bancos de financiamento do mundo não derem uma colher de chá e transformarem parte dessa dívida em investimento? [...] Um continente que era autossuficiente na produção de alimentos, antes da colonização, foi colonizado, aprenderam a falar inglês, francês e hoje não consegue ser autossuficiente na comida porque são dependentes dos colonizadores."
Antes de Lula, discursaram Dilma Rousseff e Aloizio Mercadante.
Mercadante destacou que atualmente "o Brasil é um país que dá instabilidade e um dos 15 países que têm relações com todos os países da Organização das Nações Unidas (ONU)".
"O Brasil também é o país que tem a maior floresta tropical do planeta. O maior desafio atual são as mudanças climáticas. [...] Não há como enfrentar as crises climáticas sem os bancos públicos.", disse Mercadante, acrescentando que o Brasil "lidera no G20 a matriz energética limpa."
Ele também abordou as viagens internacionais de Lula, destacando que somente nas últimas, "foram superados US$ 1 bilhão [R$ 4,9 bilhões] em assinaturas de investimentos".
4 de dezembro 2023, 17:56
Dilma, por sua vez, destacou o papel do banco do BRICS. "É um banco bastante novo. É produto de toda uma discussão que começa no
governo Lula a respeito da posição que os países emergentes teriam de ter no plano internacional", disse Dilma.
Ela também alertou para a necessidade de "minimizar o impacto que as taxas de juros têm nós países em desenvolvimento".
"Paga-se mais em juros em países em desenvolvimento do que é investido em saúde educação e outros projetos sociais."
Assim como Lula, Dilma apontou a importância de transações com moedas locais, sem citar o dólar.
"Usar moeda local é numa coisa muito importante. Eu acredito que seja uma questão estratégica [...]. Essa questão do investimento em moedas locais é uma questão estratégica para os países em desenvolvimento. A gente tem de perceber que isso faz parte de uma tendência no mundo [diversificar pagamentos em outras moedas]"
A cerimônia no BNDES ocorreu poucas horas após a LXIII Reunião Ordinária do Conselho do Mercado Comum do Mercosul, evento realizado no Museu do Amanhã, no Rio de Janeiro, que faz parte da 63ª Cúpula do Mercosul. Na quinta-feira (7), Lula participará da Cúpula do Mercosul, junto com outros chefes de Estados do bloco.