Na segunda-feira (30), o presidente francês, Emmanuel Macron, disse à Comissão Europeia que Paris não aceitará a assinatura do pacto com o bloco sul-americano. Por conta disso, outros Estados-membros, como a Alemanha, criticaram a postura francesa e declararam querer avançar nas tratativas, conforme noticiado.
No entanto, o firme veto da França teve como motivação o fato de que, dias antes, negociadores de ambas as partes estiveram reunidos e, para a surpresa do Brasil, todas as exigências apresentadas pelo Itamaraty no setor de licitações públicas que vinham sendo rejeitadas pela Europa foram acatadas pelo braço executivo do bloco, segundo a coluna de Jamil Chade no UOL.
De acordo com o colunista, vendo o avanço na negociação, Macron enviou uma mensagem de texto (SMS) para o celular da chefe da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, avisando que não aceitará o acordo sob a alegação de que a suposta invasão de alimentos exportados pela América do Sul colocaria em risco seus agricultores.
Porém, diplomatas apontam que o argumento do francês sobre o risco para a agricultura sequer condiz com a realidade. Os estudos realizados por ambos os lados do processo apontam que, caso o pacto entre em vigor, o volume extra de exportação brasileira prevista não representaria a dimensão do abalo no mercado europeu como alegam os franceses.
De fato, as cotas oferecidas pelo bloco europeu para as exportações agrícolas do Brasil já foram preenchidas em grande parte, o que significa que o acordo UE-Mercosul corre o risco de ter um impacto pequeno para alguns dos principais setores da exportação nacional, segundo documento do governo Lula obtido com exclusividade pela mídia.
"As cotas ofertadas pela UE ao Mercosul ou são insuficientes, ou não representam grande impacto para as exportações brasileiras. Ademais, são as barreiras não tarifárias que mais restringem o comércio bilateral", diz o documento.
Algumas das exigências brasileiras aceitas foram excluir o SUS de qualquer abertura de mercados para a participação dos europeus em licitações públicas e a criação de uma margem de preferências para empresas nacionais em licitações públicas, atendendo aos objetivos da nova política industrial do governo.
O órgão da UE topou o entendimento, sem impor condicionamentos ou limites, diz a mídia.
Mas o gesto de Macron não ocorre por acaso. Para diplomatas, trata-se de uma tentativa de usar o Brasil como escudo diante de um clima político tenso para o presidente francês. Porém, uma lembrança do passado político da UE pode fazer com que o líder tenha certo tipo de vantagem.
"Há cinco anos, a alemã von der Leyen apenas foi eleita graças a um acordo entre a então chanceler Angela Merkel e Macron. Agora, ela sabe que precisa uma vez mais do acordo de Paris para se manter no poder. Nessa negociação, diplomatas temem que ela tenha de ceder e sacrificar o acordo com o Mercosul", relembra o colunista.
Sendo assim, é aguardar para ver como von der Leyen vai atuar para colocar na mesma balança a posição francesa e o querer de outros Estados-membros como Portugal, Alemanha e Espanha para que o acordo aconteça.
Negociadores admitiram à mídia que, já em dezembro, o comportamento do francês tinha causado um mal-estar com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
O brasileiro viu como uma espécie de "traição" a forma pela qual a França defendeu que exigências ambientais fossem impostas ao Brasil para que um acordo fosse fechado, minando até mesmo a soberania do país.
Se ficar evidenciado que Macron usará o Mercosul como forma de se salvar politicamente na Europa, o que ainda existia de lua de mel entre ele e Lula pode estar ameaçado, escreve Jamil Chade.