Ao lado de Macron, Lula defende paz na Ucrânia e reforça neutralidade brasileira
Ao lado de seu homólogo francês, Emmanuel Macron, o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), voltou a defender a paz no conflito na Ucrânia e disse que o Brasil segue neutro.
Sputnik"Estou a tantos mil quilômetros de distância da Ucrânia que eu não sou obrigado a ter o mesmo nervosismo que o povo francês tem, que está mais próximo", afirmou o mandatário durante um evento no Palácio do Planalto, em Brasília, nesta quinta-feira (28).
Ele comentou que é preciso respeitar o direito de cada país fazer suas ações, ainda que seja possível criticar o que não concorda.
"E resolvemos não tomar lado porque nós queremos criar condições de voltar à mesa de negociação e dizer que a guerra só vai ter uma solução, que é a paz […]. A destruição, os gastos, os investimentos em armas são muito maiores do que os investimentos feitos para combater a fome, a desigualdade e a miséria."
Lula relembrou que em 2003 declinou o convite do então presidente dos Estados Unidos, George Bush, para participar da
invasão ao Iraque, já que seu compromisso sempre foi
combater as desigualdades.
"É tanta desigualdade que não tenho tempo para pensar em outra guerra, a não ser a guerra de construir algo positivo para os 210 milhões de pessoas aqui [no Brasil]", declarou Lula que também mencionou os desafios globais, como a "sombra do extremismo" e a "negação da política".
Além disso, o presidente brasileiro destacou que o embaixador Celso Amorim teve diálogos tanto com Vladimir Putin quanto com Vladimir Zelensky, presidentes de Rússia e Ucrânia, além de também ter feito encontros em prol de soluções pacíficas na Venezuela, com Nicolás Maduro.
Já Macron afirmou que "a França quer o diálogo, quer voltar à mesa de negociações. Mas a França quer dizer que não somos fracos. Se houver uma escalada sem fim daqueles da agressão, nós temos de nos organizar para não ter que lamentar apenas".
O presidente francês também afirmou que já teve várias discussões com Putin em favor de um acordo de paz. A Rússia, por sua vez, já declarou inúmeras vezes que segue aberta ao diálogo para pôr fim ao conflito com a Ucrânia, desde que seus posicionamentos e suas preocupações sejam levados em questão, o que não vem acontecendo tanto por parte do Ocidente quanto por parte de Kiev.
Na ocasião, Lula ainda fez críticas às instituições internacionais pela inação diante dos conflitos na Faixa de Gaza e na Ucrânia e disse que um suposto "mundo baseado em regras" que não seja multilateral "significa retroceder séculos".
Acordo entre Mercosul e UE
Outro assunto-chave na agenda da visita de Macron ao Brasil é o acordo comercial entre a União Europeia e o Mercosul. Ontem (27), o ministro da Fazenda,
Fernando Haddad,
reiterou seu apoio ao acordo, dizendo que "se conseguimos aprovar uma reforma tributária após 40 anos, por que não poderíamos, após 20, alcançar um acordo benéfico entre a União Europeia e o Mercosul?", enquanto o líder francês voltou a criticá-lo.
Macron, que tem sido pressionado pelo lobby agrícola francês, que teme a concorrência com os produtos sul-americanos, usou mais uma vez a suposta preocupação com questões ambientais para justificar sua reprovação ao acordo, afirmando que "esses acordos são um freio ao que estamos fazendo para retirar o carbono da economia".
O processo de negociação entre as partes vem desde o final dos anos 1990 e tem apoio do presidente Lula. Nesta quinta-feira, ele ressaltou que não se trata de um acordo bilateral, mas que envolve vários países.
"O Brasil não está negociando com a França. O Mercosul está negociando com a União Europeia."
Ele comentou que, caso haja discordâncias por parte de Macron, elas devem ser resolvidas com os outros integrantes do bloco europeu. Além disso, Lula entende que "o acordo proposto agora é muito mais promissor de assinar do que o outro", referindo-se ao texto anterior. "O Brasil tinha o direito de ser contra a primeira proposta", afirmou.
Ainda assim, vale ressaltar que representantes de movimentos populares camponeses também têm rejeitado o pacto publicamente, devido a uma série de vantagens que os europeus teriam nessa relação.
Eleições na Venezuela
A questão da Venezuela também foi abordada pelos líderes do Brasil e da França no encontro desta quinta-feira. Lula afirmou que é preciso não haver problemas no processo eleitoral venezuelano, que será realizado em 28 de julho e escolherá um presidente para um mandato de seis anos, com início em 10 de janeiro de 2025.
Ele defendeu, no entanto, que o fato de María Corina Machado não ter sido inscrita como candidata não é "o agravante".
"Vocês não podem esquecer que aqui no Brasil eu fui proibido de ser candidato quando era o primeiro candidato em todas as pesquisas de opinião pública. O que eu fiz? Indiquei outro candidato. Perdemos as eleições, mas fez parte do jogo democrático."
Ele elogiou o fato de a oposição ter indicado Corina Yoris como substituta, mas achou "grave" que ela não tenha sido registrada.
"Não foi proibida pela justiça. Me parece que ela se dirigiu até o lugar, tentou usar o computador no local e não conseguiu entrar. Então foi uma coisa que causou prejuízo para a candidata."
Por fim, Lula defendeu eleições democráticas no país vizinho e afirmou que o Brasil tentará assistir ao processo eleitoral.
Já Macron condenou "firmemente" a não participação de Yoris no processo eleitoral, mas afirmou que não é preciso "se desesperar".
Vale ressaltar que
Caracas já havia respondido ao Brasil, por meio de seu chanceler
Yván Gil, classificando um comunicado brasileiro sobre o tema como "cinzento e intervencionista", que parecia ter sido ditado "pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos".
"[…] são emitidos comentários carregados de profundo desconhecimento e ignorância sobre a realidade política na Venezuela", afirmou o chanceler.
Intolerância religiosa
Por fim, ao lado de Macron — que preside um país acusado mais de uma vez pela Organização das Nações Unidas (ONU) de discriminação religiosa —, Lula defendeu um cessar-fogo no conflito na Faixa de Gaza e discursou contrariamente à intolerância religiosa, que cresceu em todo o mundo em razão dos enfrentamentos recentes entre judeus e muçulmanos.
"O Brasil rechaça categoricamente todas as manifestações de antissemitismo e islamofobia. Não podemos permitir que a intolerância religiosa se instale entre nós. Judeus, muçulmanos e cristãos sempre viveram em perfeita harmonia no Brasil, ajudando a construir o país moderno que temos hoje."
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