Por certo, a falta de um mapeamento político claro que aponte para uma solução de paz em ambas as regiões é uma das principais razões pelas quais as guerras contemporâneas têm se prolongado por tanto tempo. Ora, o general prussiano Carl von Clausewitz, tido como um dos principais teóricos militares do século XIX, caracterizou a guerra como "um ato de força para obrigar o nosso inimigo a fazer a nossa vontade", portanto há que se ter em vista duas coisas quando olhamos essa afirmação: 1) que grau de força será aplicada; e 2) qual a vontade a ser imposta ao inimigo. Nos tempos atuais, tanto o primeiro quanto o segundo fator parecem não estar mais tão bem alinhados quanto no passado, provocando assim o prolongamento dos conflitos.
Ademais, entre as várias outras razões que também explicam essa tendência está a falta de vontade política entre as partes beligerantes para a sua resolução célere. Desde a guerra empregada pelo Ocidente contra a Rússia na Ucrânia até a guerra de Israel em Gaza, vemos claramente a ausência de um compromisso político por parte dos principais atores envolvidos no sentido de colocar um fim às hostilidades em curso.
A título de exemplo, sabe-se muito bem que os Estados Unidos estão envolvidos indiretamente em ambas as guerras, seja na Ucrânia ou em Gaza, agindo como principal financiador de Kiev e do governo de Israel, sem demonstrar interesse em negociar uma solução diplomática para tais conflitos. Não à toa, vemos como Washington procurou evitar o diálogo com a Rússia a respeito da Ucrânia, assim como procurou ignorar os clamores da comunidade internacional por um cessar-fogo em Gaza.
Uma outra razão para a inércia das guerras atuais é o descompasso entre os meios aplicados e os fins pretendidos. Num primeiro caso, por exemplo, apesar da clara disparidade de poder a favor da Rússia em relação à Ucrânia, o Exército russo tem sido cauteloso militarmente, evitado utilizar todos os recursos convencionais à sua disposição, dada sua preocupação com a população ucraniana. Já a preocupação com a população palestina, por sua vez, não tem sido um fator considerado por Israel no âmbito de suas operações em Gaza. Em última análise, Moscou tem empregado um tipo de atuação militar voltada para enfraquecer a Ucrânia aos poucos, minando-a econômica e moralmente, de modo a fazer com que Kiev caia no "bom senso" e retorne à mesa de negociação. Já Israel tem empregado meios desproporcionais para atingir seus fins pretendidos, os quais, segundo Netanyahu, envolvem a neutralização total do Hamas em Gaza.
No Oriente Médio, além do mais, os Estados Unidos contribuem ativamente para as despesas militares de Israel, fornecendo-lhe apoio político quase que incondicional, mesmo às custas do sofrimento indizível dos palestinos, ampliando assim a intransigência de Tel Aviv perante os clamores da comunidade internacional.
No mais, a forte dependência da Palestina dos recursos de abastecimento de água e eletricidade provenientes de Israel agrava ainda mais o problema, permitindo a Tel Aviv prolongar a guerra pelo tempo que lhe for necessário.
Outro importante fator que se faz necessário destacar quando falamos das guerras atuais é o aspecto territorial dos conflitos. Fica claro a partir da questão referente ao Leste Europeu que a Rússia não renunciará a seus novos territórios obtidos em setembro de 2022, ao passo que as autoridades em Kiev insistem em retornar às fronteiras ucranianas de 1991. Esse desejo impraticável de Zelensky de restabelecer o controle sobre a Crimeia e Donbass fazem com que sua posição negociadora assuma um caráter maximalista, dificultando em muito as perspectivas de paz. Ao mesmo tempo, a Ucrânia periga enfrentar uma situação econômica das mais complicadas em toda a sua história, quando as hostilidades terminarem, por conta da necessidade de restabelecimento de sua infraestrutura e, em especial, pela dívida que o país contraiu com o Ocidente.
Para além disso, do ponto de vista econômico, ambas as guerras no Leste Europeu e no Oriente Médio estão inextricavelmente interligadas com o complexo militar-industrial estadunidense, cujos contratos com os governos de Kiev e de Tel Aviv se tornaram bastante atrativos para esse segmento. As guerras de hoje, portanto, são muito mais complexas do que no passado justamente por envolverem os interesses de companhias privadas americanas que lucram com a venda de armas ao exterior, cujo lobby no Congresso é tão forte a ponto de influenciar as próprias políticas adotadas pelo governo em Washington.
Infelizmente, enquanto os "mercadores da morte" lucram, as guerras se perpetuam e o número de vítimas inocentes decorrente desses conflitos só aumenta com o tempo. Como se não bastasse, a destruição generalizada de cidades inteiras, a migração forçada de parte da população local para outros países e regiões, a recessão econômica subsequente e os vários registros de desolação se ampliam a cada dia, numa espiral sem fim. Assim sendo, à medida que essas guerras modernas evoluem e à medida que organizações internacionais como a ONU se mostram ineficazes diante da situação, o mundo testemunha a aterradora perspectiva de sua indefinida resolução. A sensação que fica, então, é a de que essas guerras são verdadeiramente "perpétuas" enquanto duram, em especial para aqueles diretamente afetados pela destruição e pelo caos dela advindos.
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