"Essas crises são resultado de um processo de consolidação dos Estados-nação no continente sul-americano. […] começa no século XIX e muitos sofrem com a escravidão, com questões de terra, com questões indígenas, como o caso do Brasil que sofreu com tudo isso", pontuou a pós-doutoranda em estudos marítimos pela Escola de Guerra Naval (EGN) Jéssica Gonzaga.
"A Venezuela é uma das principais produtoras de petróleo e tem uma das maiores reservas de petróleo no mundo, e os Estados Unidos dependem dessa reserva. Aliás, durante todo o governo chavista, seja de Hugo Chávez, seja de Nicolás Maduro, os Estados Unidos nunca deixaram de comprar petróleo venezuelano."
"Vemos governos que são eleitos democraticamente, mas que vão rompendo gradativamente com essas instituições com o aval da população, porque a população acredita que ele não é apenas um condutor dessa sociedade, mas sim teria superpoderes para atuar como bem quisesse", desatacou Bressan.
"Tudo isso favorece que tais governos, sejam de esquerda, de direita, de extrema-direita ou extrema-esquerda, passem a flertar, passem a dar vazão a certas condutas autoritárias, que muitas vezes só pelo fato de ter sido eleito democraticamente é chancelado pela população."
"Isso é muito perturbador para essas questões de segurança e soberania do Brasil e também, evidentemente, da América do Sul, porque abre precedente para que volte uma tradição existente na América do Sul, que é o uso das Forças Armadas como um elemento mediador, em que as Forças Armadas são acionadas para retirar uma determinada classe política do poder e colocar outra no lugar."
"Se as Forças Armadas são vistas como um elemento, um instrumento mal utilizado por determinados governos, partidos, isso gera quase que uma visão de luta de classes, em que o militar é contrário ao civil. É necessário uma atualização e uma profissionalização, a fim de evitar que esse tipo de polaridade atinja as Forças Armadas e, portanto, comprometa a segurança sul-americana", argumentou ela.
"E hoje, o que o Brasil enfrentou, na verdade, no governo [de Jair] Bolsonaro, foi uma tentativa, porque já há grandes evidências da tentativa de um golpe liberado por alguns oficiais generais. Isso está diretamente relacionado a um passado histórico muito recente do continente sul-americano. Em momento algum vimos as Forças Armadas assumindo o poder, democratizando e melhorando a vida das camadas populares", afirmou a especialista.
Sem educação e distribuição de renda não há solução
"Países que combatem desigualdade e pobreza têm muito mais chance de estabelecer maiores condições para as instituições democráticas. E, claro, existe um constrangimento internacional também importante que vai balizando e evitando que governos autoritários surjam, tomem muito poder ou tomem muito espaço."
"Quando se investe na educação desses países, quando há combate à corrupção, combate às fake news, quando temos um papel ativo da imprensa, tudo isso vai corroborar para uma estabilidade no continente. É necessário aprender como um sistema de governo funciona, o que são os Três Poderes, como funciona um processo eleitoral, que se conheça a história, porque somente assim a gente consegue aprimorar as políticas públicas, e a consequência disso é o fortalecimento das instituições", concluiu Gonzaga.