Entre os dias 4 e 17 de setembro, cerca de 3 mil militares da Marinha do Brasil, do Exército Brasileiro e da Força Aérea Brasileira (FAB) participaram do maior exercício militar do Planalto Central.
Militares da FAB durante a operação Formosa, realizada no estado de Goiás
© Foto / Marinha do Brasil
Além de fuzileiros navais chineses e norte-americanos, a Operação Formosa — que acontece anualmente com participação das chamadas "nações amigas" —também recebeu representantes de África do Sul, Argentina, França, Itália, México, Nigéria, Paquistão e República do Congo.
A primeira participação efetiva de militares chineses — o gigante asiático já havia participado como observador em 2023 — pode ser vista como um avanço, sobretudo pela possibilidade da presença de militares chineses "trazer outra mentalidade para o arcabouço militar do Brasil", avalia Robinson Farinazzo, especialista militar e oficial da reserva da Marinha do Brasil.
Brasil está próximo de colaboração militar com o Sul Global?
A interação com os países do Sul Global é feita pelas Forças Armadas ainda de uma forma muito incipiente, segundo Vagner Camilo Alves, professor do Instituto de Estudos Estratégicos (Inest), da Universidade Federal Fluminense (UFF).
"Há uma tradição, até institucional, por parte das Forças Armadas brasileiras, de se pensarem como ocidentais. A maior parte dos cursos que os militares fazem, as comparações que são realizadas, são com os países ocidentais", comenta o professor sobre o comportamento brasileiro no âmbito militar.
Militares da FAB durante a operação Formosa, realizada no estado de Goiás
© Foto / Marinha do Brasil
A possibilidade de ampliar suas relações com o Sul Global, entretanto, é vista com bons olhos e como uma boa oportunidade para o Brasil, conforme os especialistas ouvidos pela Sputnik.
Para Alves, o Brasil, enquanto nação soberana, poderia se beneficiar tanto de parcerias, projetos conjuntos e até mesmo aquisição de material bélico de potências do Sul Global como China e Rússia, quanto trazer países do Oriente Médio e da África para uma interação mais forte, uma vez que "temos muito a ensinar, inclusive as instituições militares", ressalta. Além disso, são parcerias que podem render mercado "para a nossa frágil base industrial de defesa", acrescenta.
Farinazzo, por sua vez, ressalta as parcerias brasileiras com países do Sul Global no âmbito da defesa. "Comprávamos material norte-americano que já era quase obsoleto. Os EUA impõem muitas restrições ao Brasil, essa que é a verdade. Nunca recebemos um equipamento com todas as suas funcionalidades operacionais", comenta.
Com as novas parcerias em curso, o analista militar acrescenta que o Brasil precisa exigir a funcionalidade desses equipamentos, o repasse de tecnologia e também que se "construam parcerias no sentido de fabricar essas armas no Brasil para que consigamos abrir novas fábricas, gerar empregos, receita e, quem sabe, exportar no futuro", completa.
Meses antes dos exercícios militares em Formosa, o comandante do Exército Brasileiro, general Tomás Paiva, defendeu a ampliação da parceria estratégica entre Brasil e China na área militar e, em julho, fez uma viagem oficial ao país. Na ocasião, Paiva declarou que o Exército Brasileiro estava disposto a fortalecer ainda mais a comunicação e os intercâmbios com Pequim e aprofundar a cooperação em vários campos.
Nesse sentido, Alves julga que a ampliação das relações com a China no setor de defesa demonstra um Brasil autônomo e um importante ator no sistema internacional.
Já no que diz respeito às compras de material bélico, Farinazzo ressalta também a importância da expansão de parcerias, para que não se repita, por exemplo, o que aconteceu na Argentina.
"A Argentina comprava material da Europa e dos Estados Unidos. Quando ela foi à guerra [com a Inglaterra], esses países restringiram novas compras e até passaram segredos industriais das armas argentinas para os britânicos", finaliza.