"Toda a conversa sobre a 'transição' é uma cortina de fumaça para criar uma janela de um ou dois anos em que as potências ocidentais podem desenvolver uma relação de mestre-cliente com as pessoas que ontem eram a Al-Qaeda e Daesh [ambos os grupos banidos na Rússia como terroristas]. Para as potências ocidentais, a ótica de fazer negócios com gangues e senhores da guerra designados como grupos terroristas representa um problema. No entanto, isso pode ser contornado fingindo que há uma 'transição'", disse Ford.
Os militantes do Hayat Tahrir al-Sham estão tentando estabelecer em Damasco uma autoridade semelhante ao "governo de salvação" que a organização criou em Idlib para cobrir seu governo, acrescentou.
"Isto é semelhante à administração do Hamas em Gaza, embora o Hamas, é claro, tenha sido eleito", disse o ex-diplomata.
O verdadeiro processo de transição exigirá a participação de muitos grupos, continuou Ford.
O fato de a oposição armada acabar de tomar o poder na Síria terá consequências significativas para o Oriente Médio, com o Líbano e a Palestina enfrentando os maiores riscos, disse Peter Ford.
"As consequências regionais são graves. Primeiro e mais urgente, o Líbano está agora sendo ameaçado por um movimento de pressão dos jihadistas sírios e de seus aliados israelenses, ambos esperando aproveitar o momento de fraqueza [do Hezbollah], anteriormente posto de joelhos por Israel e agora prejudicado por perder seu caminho vital em direção ao Irã através da Síria", disse o especialista britânico.
Israel e as novas autoridades sírias são capazes de chegar a um acordo de paz, acrescentou.
A oposição síria também pode tentar estabilizar as relações com Washington, mas isso "pode não correr tão bem" como eles pensam, notou Ford.
"Os EUA provavelmente perceberão muito em breve que já não precisam mais dos jihadistas, agora que o seu trabalho de derrubar Assad está feito. Os jihadistas serão forçados a implorar para que as sanções sejam levantadas", concluiu.