Os especialistas chamaram a atenção para um encontro marcado por questões humanitárias. Moscou prometeu entregar unilateralmente 6 mil corpos de soldados ucranianos para Kiev na próxima semana, após identificar todos os mortos. As partes também concordaram em realizar uma grande troca de prisioneiros: serão pelo menos mil pessoas. Além disso, detidos doentes e/ou gravemente feridos serão trocados na base do "todos por todos".
Danielle Makio, professora no curso de relações internacionais da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e membro do Centro de Investigação em Rússia, Eurásia e Espaço Pós-Soviético (CIRE), comenta que trata-se de uma disposição mútua importante, que mostra alinhamento em questões relevantes.
A
Rússia também propôs um cessar-fogo de dois a três dias, o que o chefe da delegação russa,
Vladimir Medinsky, classificou como uma possibilidade para as tropas "recolherem os corpos de seus soldados".
Ricardo Cabral, analista internacional, editor do canal História Militar em Debate e um dos autores do livro "Guerra na Ucrânia: análises e perspectivas", avalia que, como a Rússia deve avançar para essa zona cinzenta, esse tipo de proposta é comum em casos de conflito.
Por outro lado os analistas apontam que há
propostas russas que não devem ser aceitas pelo lado ucraniano, o que tende a prolongar os combates.
Nesse meandro estão exigências como o reconhecimento legal internacional da reintegração à Rússia da Crimeia, das repúblicas populares de Donetsk (RPD) e Lugansk (RPL) e das regiões de Zaporozhie e Kherson, além da adoção de neutralidade e recusa à adesão a alianças militares por parte de Kiev.
"As propostas que a Rússia traz nessa
nova rodada de negociações, elas refletem justamente essa tentativa de consolidação de ganhos territoriais e de limitação da influência ocidental na região, que, em contrapartida, é bastante inegociável, ou pelo menos é um tema muito sensível para Kiev", diz Makio.
Cabral também avalia que seja difícil neste momento que Kiev aceite o status de neutralidade e que aceite não se vincular à Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN). Pressões por parte dos EUA e da Europa também podem ser esperadas sobre os pedidos russos nesse sentido, o que implica dificuldades para o
avanço das negociações russo-ucranianas, pondera o analista.
"Não chegaremos a um tratado de paz, não acredito que a OTAN vá assumir que não vai querer se expandir. Os ocidentais já mostraram que o objetivo é cercar a Rússia. A Rússia já se ofereceu duas vezes para entrar na OTAN e nas duas vezes foi recusada. Por quê? Porque é uma aliança que foi criada para lutar contra a União Soviética, e ela se manteve após o fim da Guerra Fria porque se considera a Rússia uma ameaça", argumentou.
Já em relação ao status da atual negociação, Cabral acredita que é mais uma conversa das muitas que ainda acontecerão. Como já explicou o analista, questões que envolvem os principais temas, como territórios e a neutralidade ucraniana, são os mais difíceis e estão longe de um acordo.