O Brasil nunca regulamentou formalmente o lobby, mas parte do Congresso segue adotando discursos e votações que parecem
seguir mais os interesses de Washington do que os do povo brasileiro. Soma-se a isso o fato de que os EUA fazem sentir o seu interesse em questões legislativas.
Um exemplo mais evidente dessa presença norte-americana trazida pelos entrevistados do Mundioka, podcast da Sputnik Brasil, é o caso da vinda da Internet 5G para o Brasil.
"Quando o Brasil, em grande medida se inclinou a abrir o mercado para a China nessa seara, os Estados Unidos, ainda sob a administração Trump, e depois democrata, apresentou uma posição muito firme, contrária à participação da China nesse mercado no Brasil", lembra Augusto Teixeira Júnior, professor associado do Departamento de Relações Internacionais da Universidade Federal da Paraíba (UFPB).
"O que é muito importante, porque demonstra que os Estados Unidos, que se veem em uma competição global contra a China, tendem a não aceitar a participação do seu antagonista principal em áreas sensíveis de investimentos em países da América Latina e do Caribe, dentre os quais o Brasil."
Na esteira das questões tecnológicas, os
interesses das big techs frente à tentativa de regulação a ser proposta pelo Brasil é outro exemplo em que os EUA mostram seu poder intervencionista.
Como não existe regulamentação do lobby no Brasil, a prática recebe conotação negativa no país, afirma Ana Carolina Marson, professora de relações internacionais da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP).
Apesar disso, "os Estados Unidos influenciam, sim. Querendo ou não, há esse lobby, essa tentativa de influenciar o processo decisório da democracia.[…] E os Estados Unidos são um país intervencionista que busca promover os seus interesses dentro de outros países das discussões de outros países", completa a especialista.
De acordo com ela, todos os espectros estão
suscetíveis às influências de lobistas. Entretanto, quando falamos de EUA, a bancada mais vinculada à direita do espectro político se mostra mais alinhada aos interesses do Tio Sam.
A relação do deputado federal e filho do ex-presidente Jair Bolsonaro com políticos republicanos e conservadores dos Estados Unidos já ficou evidente em diversas aparições na mídia do parlamentar em eventos aliados a Donald Trump ou Steve Bannon.
Em março deste ano, Eduardo Bolsonaro
resolveu se licenciar do cargo e partir para os EUA, para, segundo ele,
evitar uma suposta perseguição. Na ocasião, ele atacou o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, relator do inquérito que tem o pai, Jair Bolsonaro, como um dos réus.
Para Teixeira Júnior, o que o deputado faz no
âmbito internacional pode ser percebido como
atentado à soberania nacional, especialmente por se tratar de um tema de cunho doméstico e de disputas políticas que acontecem dentro do marco da Constituição.
"Ao ir para os EUA, ao se licenciar e ao fazer articulação e lobby para que medidas sejam adotadas contra atores e instituições nacionais, de certa forma, ele age contra o interesse nacional e contra a soberania nacional."
Na mesma linha, Marson avalia que as ações de Eduardo Bolsonaro nos EUA são muito sérias e prejudiciais à imagem do Brasil.
A autorização para os Estados Unidos participar de lançamentos a partir do Centro Espacial de Alcântara (CEA), no Maranhão, foi aprovada pelo Congresso em 2019, durante o governo Bolsonaro.
O projeto assinado pelo
Senado Federal em novembro daquele ano
ratificou o acordo assinado em Washington meses antes. Marson avalia que o processo que culminou com a base de Alcântara cedida a empresas estadunidenses teve forte influência do lobby dos EUA.
Segundo ela, esses grupos pressionaram o Itamaraty na representação brasileira nos Estados Unidos, e contou também com o envolvimento da embaixada dos EUA no Brasil.
Na ocasião, justificava-se que o Brasil perderia muito dinheiro caso não aceitasse o acordo, ao passo que era afirmado que
"a cessão da base de Alcântara não significaria a presença militar dos Estados Unidos no Brasil, algo que preocupava parte da população brasileira", acrescentou.