O presidente dos Estados Unidos,
Donald Trump,
oficializou nesta semana a taxação de 50% sobre as exportações do Brasil para o território norte-americano. Assim como o
tarifaço a outros países, diversos itens foram retirados da lista com aumento de alíquota, como
suco de laranja e
equipamentos da indústria de aviões.
A surpresa na taxação ao Brasil ficou pelo fato de alguns dos principais objetos de exportação terem sido retirados sem sequer Brasília ter conseguido negociar diretamente com Washington.
Por outro lado, aliados dos Estados Unidos, como União Europeia (UE) e Japão, chegaram a acordos com seus produtos sendo taxados em, pelo menos, 15%, e sem aplicar a Lei da Reciprocidade Econômica. Tanto Bruxelas quanto Tóquio ainda se comprometeram a investir centenas de bilhões na economia de Washington.
Em entrevista à Sputnik Brasil, analistas acreditam que os acordos desfavoráveis aos aliados de Trump acontecem pela dependência desses países a diferentes setores dos EUA — em especial, o militar.
Bruno de Conti, professor do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e pesquisador do Projeto Transforma da universidade, explicou que o Japão precisa da indústria bélica dos EUA desde o fim da Segunda Guerra Mundial, enquanto a Europa aflorou essa sujeição nos últimos anos.
Conti também destaca a
postura brasileira diante do tarifaço. Embora não tenha conseguido chegar a um acordo com os Estados Unidos, o governo do presidente Lula ganhou relevância na mídia internacional por não sucumbir diante da pressão norte-americana.
"Até o The New York Times reconheceu que o governo brasileiro tem tido altivez na negociação, na reação às ameaças do Trump que a Europa e o Japão não tiveram. Então isso tem uma importância muito grande, do ponto de vista da demonstração de soberania de um país."
O doutorando em economia política internacional pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e pesquisador visitante no King's College London Francisco Marzinotto contou que os acordos de UE e Japão mostram uma questão de "assimetria de poder nas relações internacionais" e que, mesmo parceiros, ambos sabem que não têm condições de escalar uma guerra comercial iniciada por Trump.
"[O acordo] mostra que os EUA ainda ditam parte das regras da ordem econômica global, especialmente quando estão dispostos a usar o peso do seu mercado como instrumento de pressão política, o que revela uma clara assimetria de poder."
Marzinotto também deu destaque à fala do primeiro-ministro da França, François Bayrou, que descreveu o acordo da UE com os EUA como um "dia sombrio para a Europa".
O ex-secretário de Estado dos Estados Unidos Henry Kissinger, que atuou nos governos de Gerald Ford e Richard Nixon, é conhecido por uma frase que pode resumir o tarifaço norte-americano: "Ser inimigo dos EUA pode ser perigoso, mas ser amigo dele é fatal".
Para Marzinotto, a política comercial de Trump revela que
alianças históricas ou afinidades ideológicas são secundárias diante das vontades e dos interesses do governante. O especialista acredita que
"nenhum país está imune a ações coercitivas" e, na verdade, o que importa é ser
relevante como a China.
Conti, por sua vez, destaca uma fala do diplomata Celso Amorim, que afirmou que
entre países não há amizade, mas sim interesses nacionais. O especialista cita como exemplo as tarifas ao Canadá, vizinho e parceiro estreito dos EUA, a quem
Trump disse que iria anexar.
Com a instabilidade comercial provocada pelos EUA, uma das soluções sugeridas por especialistas para os países afetados seria
redirecionar parte das produções a serem exportadas. Entretanto, Marzinotto ressalta que a inatividade de órgãos, como a Organização Mundial do Comércio (OMC),
impedem uma resposta conjunta.
Conti acredita que uma ação em conjunto de organizações do Sul Global, como o BRICS, poderia agravar a corrida comercial iniciada por Trump, embora este possa ser um passo importante para interromper relações comerciais agressivas e instáveis, como a imposta por Washington.