"Não vai resolver os problemas da Palestina, mas vai dar muita força para que ela enfrente essa situação assimétrica que ela tem há 77 anos com a força israelense e o poderio militar, econômico e diplomático dos Estados Unidos", disse Sayid Marcos Tenório, historiador, especialista em relações internacionais e vice-presidente do Instituto Brasil Palestina (Ibraspal).
O pedido de entrada no grupo foi feito pela Autoridade Nacional Palestina (ANP) e confirmado pelo embaixador palestino na Rússia, Abdel Hafiz Nofal, há cerca de duas semanas. Após a solicitação, a China inclusive expressou apoio à entrada da Palestina no BRICS.
O diálogo foi aberto em meio às negociações sobre um cessar-fogo no território. Nesta segunda-feira (13), trocas de prisioneiros ocorreram entre Israel e o Hamas, cumprindo a primeira parte do acordo de paz proposto pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.
A entrada no BRICS, dessa forma, é vista por Marcos Feres, secretário de comunicação da Federação Árabe Palestina do Brasil (Fepal), como uma oportunidade de reconstrução para a Palestina.
"A Palestina, mesmo ainda não sendo um Estado livre e soberano, tem um projeto de desenvolvimento econômico e social."
Segundo ele, é uma notícia a ser celebrada pelos palestinos, mas, "neste contexto atual do genocídio, tudo fica muito agridoce."
"O BRICS vai cumprir um papel fundamental e vai ser, sim, um aliado de uma reconstrução e do estabelecimento de um Estado palestino e da sua vitalidade econômica, da sua viabilidade como um projeto nacional, porque não se faz um projeto nacional sozinho", acrescenta Feres.
Embora haja valor simbólico na adesão da Palestina ao BRICS, Tenório ressalta que vê um enorme valor estratégico na ação. Além de desafiar o "sistema político dominado pelo Ocidente", a admissão palestina "representaria um contraponto ao G7, dando ao BRICS uma bandeira clara de justiça global e fortalecendo a sua narrativa em defesa dos povos oprimidos", argumenta.
Outro ponto trazido pelo historiador como positivo é a possibilidade de acesso e financiamento a partir do Novo Banco de Desenvolvimento (NBD), o banco do BRICS, "que apoiaria formalmente projetos humanitários, projetos de desenvolvimento local, e seria também um reforço diplomático para a Autoridade Palestina, para o Estado palestino, que busca o seu reconhecimento e a sua criação em parte do seu território histórico, que é uma injustiça", completa.
Governo de transição
A proposta de Trump para cessar a ofensiva em Gaza inclui um modelo de governança transitória internacionalmente supervisionado. Esse governo assumiria o controle enquanto uma série de reformas seriam implementadas, para, então, a Autoridade Palestina assumir o comando.
Entre os possíveis nomes defendidos pelos Estados Unidos para liderar o governo provisório, está o ex-primeiro-ministro do Reino Unido Tony Blair.
Para Feres, os Estados Unidos, como parceiro histórico e direto de Israel, não têm legitimidade para ser o mediador desse processo de paz.
"Os Estados Unidos são os mandantes e os financiadores desse genocídio. Israel é um pinscher, é um poodle dos Estados Unidos no Oriente Médio. […] através de Israel que os Estados Unidos promovem as guerras de extermínio no Oriente Médio há décadas."
Já sobre a possibilidade de Tony Blair assumir o comando desse governo interino, Tenório se diz estarrecido, porque o projeto de paz é artificial e mostra um Trump preocupado com seus interesses na Faixa de Gaza. Ou seja, segundo o especialista, a nomeação de Blair demonstra que o presidente americano "quer aquela fatia de terra sagrada para os projetos imobiliários dele", já que "está querendo impor a Gaza, de preferência sem a participação dos palestinos".