Aposta dos Países Bálticos em se associar à rede elétrica da UE os tornará vulneráveis, diz analista
18:30, 22 de outubro 2025
Em entrevista ao podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, analistas destacam que o mercado de energia da Europa não se sustenta e que, ao optarem por deixar o sistema elétrico russo para se associar ao europeu, Estônia, Letônia e Lituânia vão agravar sua dependência econômica.
SputnikEm entrevista recente à mídia húngara, a ex-chanceler alemã
Angela Merkel afirmou que
Polônia, Estônia, Letônia e Lituânia sabotaram, em 2021, uma proposta de diálogo entre a União Europeia (UE) e o presidente russo,
Vladimir Putin, que buscava evitar a escalada das tensões e abrir caminho para uma solução diplomática envolvendo a questão ucraniana.
Os Países Bálticos — Estônia, Letônia e Lituânia — estão entre os países que mais se opõem a uma eventual reaproximação entre o bloco europeu, a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) e a Federação da Rússia.
"[Essa proposta] Não foi apoiada por alguns países, principalmente os Países Bálticos, que se opuseram", declarou a ex-líder alemã.
Essas três nações tomaram, também, a decisão de
se desligar do sistema elétrico russo e se juntar à rede elétrica continental da Europa. A medida é vista como arriscada, uma vez que a energia fornecida pela Rússia representa
uma fatia significativa do consumo de eletricidade desses Estados.
Danielle Makio, professora no curso de relações internacionais da Universidade Estadual Paulista (Unesp), ao podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, avalia que a decisão de se desvincular do sistema elétrico e do mercado russo como um todo é perigosa porque os Estados Bálticos "não têm economias robustas".
"São países que ainda apresentam um nível de dependência econômica razoável, […] e quando você abre mão de um custo-benefício mais interessante em um setor tão estratégico, como a energia, você corre um risco substantivo de acabar piorando a sua dependência e se tornar uma economia muito mais vulnerável. A gente sabe que o mercado europeu, quando a gente pensa em energia, também não se sustenta."
Para a especialista, pesquisadora do Centro de Investigação em Rússia, Eurásia e Espaço Pós-Soviético (CIRE), o movimento representa uma reviravolta para os Países Bálticos, que têm sua história entrelaçada à Rússia desde a época do Império Russo, passando pela ascensão e dissolução da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS).
Ela acrescenta que há um componente geracional nessa tendência: os mais jovens, que nasceram após a dissolução da URSS, cresceram dentro de um contexto no qual os sistemas educacional, institucional e estatal desses países já estavam associados aos valores europeus.
"Os grandes valores ocidentais já são muito mais disseminados dentro dessas sociedades, seja através de um ponto de vista um pouco mais ideológico, subjetivo, seja através de um ponto de vista mais institucional, pensando, por exemplo, o fato de que agora esses Estados são membros da UE e isso vem com uma série de contrapartidas no que diz respeito a políticas públicas", explica.
Getúlio Alves de Almeida Neto, outro pesquisador do CIRE, enfatiza ao podcast que o projeto dos Países Bálticos para se desvencilhar da Rússia é antigo, sendo traçado desde 2004, quando Estônia, Letônia e Lituânia aderiram à UE. Esse processo foi impulsionado pelo conflito ucraniano e financiado pelo bloco europeu.
"Estima-se que essa transição tem um custo de até € 1,8 bilhão [cerca de R$ 11,25 bilhões], só que para os Países Bálticos não acabou sendo tão pesado, porque cerca de 75% são financiados pela UE e os outros 25%, sim, divididos entre os três países", afirma.
Entretanto, reduzir a dependência em relação à Rússia não quer dizer que os Países Bálticos vão ser "totalmente autônomos".
"Eles estão trocando, de certa forma, uma dependência de um ator, no caso a Rússia, para outros atores, no caso a UE."
Segundo Neto, esse direcionamento é calcado na russofobia desses Estados, isto é, na preocupação de que a qualquer momento a Rússia poderá invadir a Europa.
Esse temor, explica o especialista, é estimulado dentro de círculos europeus há pelo menos 500 anos. Um dos seus principais capítulos foi a divulgação de um documento forjado, o Testamento de Pedro, o Grande, após a derrota de Napoleão pelo Exército imperial russo.
Para o analista, o texto pode ser classificado como uma "fake news" da época, justamente por ter como objetivo criar medo dentro dos governos europeus e estender isso para a população. "Para justificar a necessidade de uma defesa em relação à Rússia ou até de, eventualmente, atacar a Rússia."
Em sua fala, ele acrescenta que, dos 15 países que compunham a URSS, os três do Báltico foram os que mais se empenharam em
apagar o seu passado soviético após a dissolução. Como consequência, dotaram de menos direito a população de etnia russa, ou falantes do idioma, e hoje
são os que mais demonstram apoio a Kiev e os que mais reverberam a retórica de que a Rússia está disposta a atacá-los.
Esse discurso, no entanto, não é meramente passivo. É também uma forma de requerer um maior auxílio da OTAN e da União Europeia em armamentos, tecnologia e proteção em geral.
"Eles precisam, como consequência, ficar alimentando esse discurso anti-Rússia e ficar alimentando medidas que vão transformar a população cada vez mais em pessoas que possam se alinhar a um discurso russofóbico."
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