A cidade de Belém (PA) sedia no próximo mês de novembro a
Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas —
a COP30. Delegações de todo o mundo debaterão propostas para
frear o aquecimento global, em uma tentativa de reduzir eventos naturais extremos como inundações e secas.
Um dos vilões do meio ambiente, apontado por ambientalistas, é o agronegócio. Com a COP sendo realizada no Brasil, segundo maior agroexportador do mundo, o tema não poderia ficar fora das discussões.
O ex-ministro da Agricultura Roberto Rodrigues (2003-2006), enviado especial do setor na COP30, quer desfazer esta impressão. O professor emérito da Fundação Getulio Vargas (FGV) afirma que o agronegócio é responsável por 30% da matriz energética brasileira por meio de itens como cana e soja, dos quais são produzidos etanol e biodiesel, respectivamente.
Rodrigues lidera um grupo que disponibilizará um documento na COP30 sobre a agricultura no Brasil, visando mostrar a outros países tropicais os caminhos que os brasileiros trilharam para a construção do agro atualmente.
Em entrevista exclusiva à Sputnik Brasil, Rodrigues destaca o papel do combate à fome, e por consequência da agricultura, na propagação da paz mundial
Para o ex-ministro, é importante que organizações multilaterais que tratam do tema, como a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO, na sigla inglês) se apresentem para fazendeiros e empresários para uma colaboração entre as partes.
Rodrigues elenca quatro problemas do mundo contemporâneo como "cavaleiros do apocalipse": insegurança alimentar, transição energética, mudanças climáticas e desigualdade social. Apesar de ser descrente sobre reuniões grandes como a COP30 por haver "muito discurso" e "pouca aplicação, na prática", o especialista entende que é preciso atacar estes problemas de alguma maneira.
O professor emérito da FGV se reuniu com organizações ligadas ao agro que informaram preocupações e propostas que o setor acredita serem relevante para serem debatidas na COP30. A partir de discussões em um fórum sobre agricultura tropical, a cientista Adriana Brundani está produzindo um texto a ser entregue aos organizadores da cúpula com os eixos tecnologia e sustentabilidade na agricultura brasileira.
"São números sobre produção, produtividade, emprego, renda, exportação, todos os fatores e serviços incluídos, insumos, fertilizantes, defensivos, sementes, máquinas, créditos, logística, cooperativas. Tudo que interferiu nesse processo. Esse processo é relatado em um documento tão amplo quanto possível."
O objetivo deste documento é mostrar aos países com clima tropical que
aquilo que foi feito no Brasil pode ser reproduzido em climas parecidos. Para isso, Rodrigues pontua, é necessário haver
financiamento de países mais ricos, além de uma flexibilidade de mercado para estes novos atores.
Rodrigues conta que a agricultura no mundo mudou nos anos 1980, quando o clima temperado atingiu a sua "parcela limítrofe da capacidade de produzir mais", enquanto o clima tropical passou a se destacar na área.
Uma grande barreira a ser ultrapassada, na visão do ex-ministro, é o desmatamento causado pelo agronegócio. Rodrigues afirma que o mundo sabe que o setor é sustentável nos países tropicais, mas utiliza esta narrativa para deslegitimar o seguimento.
"O mundo sabe que a agricultura tropical é considerada sustentável, eficiente, competitiva, mas o desmatamento ilegal é usado muitas vezes espertamente pelo concorrente como se fosse um fato feito pela agricultura e isso desmereceria a agricultura. Então, tem que limpar essa parte suja que não é da agricultura tropical, mas é confundida como tal."
Em
relação ao tarifaço, o enviado especial do setor na COP30 afirmou que as taxas promovidas pelos Estados Unidos
podem reaproximar os mercados europeus dos produtores do Mercosul.
Para o especialista, a confusão criada pelas tarifas impostas pelo
governo de Donald Trump pode ser uma
oportunidade para países como o Brasil. Apesar de destacar o fator positivo neste imbróglio, Rodrigues entende que
há uma "desordem mundial" nas relações diplomáticas e comerciais.
"Vivemos uma nova desordem mundial. A geopolítica está muito complicada. Isso cria incerteza, cria falta de previsibilidade. O que vai acontecer segunda-feira que vem? Ninguém sabe."