Não vai fazer mal lembrar nesse momento as cruciais páginas da História recente, não somente para aqueles que não conhecem os fatos, mas também, talvez até mais importante, para outros que desesperadamente tentam reescrevê-la e chegam a iniciar uma discussão sobre as perspectivas de um "mundo russo diferente" e colocam em dúvida a própria existência da Rússia até 2045.
Vamos aos números, porque os números são imutáveis. Alguns meses antes da invasão da URSS, em 1941, Hitler declarou "O mundo vai perder o fôlego", seguramente pensando como o mundo iria reagir à sua esmagadora vitória sobre a URSS. Mas tudo foi muito diferente, como já tinha acontecido no passado.
No dia 22 de junho, quando o exército alemão, apoiado por seus aliados, com 4 milhões de homens, estava pronto para invadir a URSS, metade da Europa já tinha caído perante sua força militar. Inclusive a França. E a Grã-Bretanha estava pronta para ser invadida, o que não aconteceu porque os alemães deram preferência a atacar a União Soviética. Os EUA praticamente não estavam envolvidos em ações militares.
Para o dia 7 de novembro de 1941 estava programado um desfile militar das forças alemãs na Praça Vermelha de Moscou. A parada aconteceu, mas foi um desfile do exército soviético, engajado na defesa de Moscou contra os ataques das forças alemãs.
A Batalha de Moscou foi o primeiro grande acontecimento da Segunda Guerra Mundial a mudar por completo a imagem que o mundo inteiro e os próprios alemães tinham sobre a capacidade de resistência do exército e dos povos da União Soviética.
Os números falam por si sós. A participação de mais de 7 milhões de pessoas de ambos os lados dessa batalha mostra a sua grandiosidade. Durante a luta que durou 6 meses, a Rússia teve 926 mil soldados mortos, mais do que todo o exército britânico durante a Primeira Guerra Mundial. Esse número, numa única batalha, ultrapassa todas as perdas dos exércitos britânico e americano durante toda a Segunda Guerra Mundial. A bandeira da Alemanha nazista nunca foi hasteada em Moscou.
É curioso, mas no livro "Uma breve história do século XX", de Geofrey Blaney, que virou best-seller internacional, no capítulo destinado à Segunda Guerra Mundial está detalhado o desembarque dos Aliados em 6 de junho de 1944 na região da Normandia, mas não há uma única palavra sobre a Batalha de Moscou, e apenas muito superficialmente cita a de Stalingrado.
A Batalha de Stalingrado, na opinião de praticamente todos os historiadores do mundo, foi um ponto crucial na luta contra o exército alemão durante a guerra. Até o Presidente Ronald Reagan, muitos anos depois, no seu primeiro jantar com o Presidente Mikhail Gorbachev, lembrou Stalingrado como exemplo de extremo heroísmo e momento importantíssimo da vitória sobre o nazismo.
Na Batalha de Stalingrado, que durou de 17 de julho de 1942 a 2 de fevereiro de 1943, lutaram contra o exército soviético Alemanha, Romênia, Itália, Hungria, Croácia e voluntários da Finlândia. No início da operação, participaram dos dois lados 816 mil militares, acima de 5 mil unidades de artilharia, 480 blindados, em torno de 2 mil aviões. No final de novembro de 1942, acima de 1 milhão e 600 mil militares participaram diretamente das ações daquela que se tornou a maior batalha terrestre da História da Humanidade.
Em 1 de maio de 1945 os soldados da Divisão 150 do Exército Vermelho hastearam a bandeira vermelha em Berlim, no prédio do Parlamento alemão, o Reichstag. Na madrugada de 2 de maio, o exército alemão, que defendia Berlim, capitulou.
Pouca gente sabe que o ato de rendição incondicional da Alemanha na Segunda Guerra Mundial foi assinado 2 vezes. Na primeira vez, isso ocorreu na cidade francesa de Reims, em 7 de maio, às 2h40min, pelo horário europeu, e deveria entrar em vigor no dia 8 de maio às 23 horas.
Numa correspondência dirigida a Churchill e Truman, Stalin escreveu o seguinte: "O ato assinado em Reims não pode ser descartado, mas também não pode ser reconhecido. O ato de rendição, como um importante documento histórico, deve ser assinado no lugar onde começou a guerra, em Berlim, com participação do alto comando militar de todos os países da Aliança.” Os EUA e a Grã-Bretanha concordaram com a realização de nova assinatura do ato e consideraram o documento assinado em Reims como preliminar.
A assinatura definitiva aconteceu em Berlim na madrugada de 9 de maio, no horário de Moscou, e por esse motivo a comemoração do Dia da Vitória acontece no 9 de Maio.
Durante a guerra, a URSS perdeu 9 milhões de soldados e mais de 17 milhões de civis. No seu livro "Moscou 1941", Rodric Braithwrite analisa a questão das vítimas de guerra de modo diferente. "Para cada britânico e americano que morreu, os japoneses perderam 7 pessoas, os alemães 20, e os soviéticos 85." Ele continua: "Quatro quintos dos combates na Segunda Guerra Mundial aconteceram no front do Leste. Dois terços do exército alemão estavam no Leste mesmo depois do Dia D. De fato, se não estivessem combatendo os russos, eles se encontrariam na França, e não teria havido nenhum Dia D. Alguns podem contestar os números exatos. Quanto à ordem de grandeza, não restam dúvidas. Não é de surpreender que os russos acreditem que foram eles que venceram a guerra."
No dia 8 de maio, Churchill fez a seguinte declaração em seu programa de rádio: "Hoje nós provavelmente vamos pensar sobre nós mesmos; amanhã, iremos prestar homenagem aos nossos camaradas russos, cujo heroísmo nas batalhas da guerra se tornou uma grandiosa participação na vitória comum.”
Passaram-se 70 anos. O mundo está mudando, mas, independentemente disso, todos os países civilizados festejam, cada um a seu modo, essa grande vitória.
As bandeiras dos Aliados são hasteadas como símbolos da vitória e homenagem a todos aqueles que deram suas vidas para isso.
No Brasil, que teve sua contribuição na vitória das forças aliadas contra o fascismo, esta data também é lembrada. Perante o Monumento Nacional aos Mortos da Segunda Guerra Mundial, no Rio de Janeiro, no dia 8 de maio acontece o desfile militar com a participação dos representantes das Forças Armadas.
Hasteadas as bandeiras dos países aliados, não é de estranhar que a bandeira russa tenha seu legítimo lugar ao lado das outras.