Opinião: Ocidente tem que apoiar a Rússia no enfrentamento ao Estado Islâmico na Síria

© Foto / Ministério da Defesa da Rússia / Acessar o banco de imagensRússia realiza golpes aéreos contra posições do Estado Islâmico na Síria
Rússia realiza golpes aéreos contra posições do Estado Islâmico na Síria - Sputnik Brasil
Nos siga no
“Após quase 10 anos de ausência, o Presidente Putin foi à abertura da Assembleia-Geral da ONU e fez um pronunciamento muito duro e vigoroso contra os Estados Unidos e seus aliados, pela política de ataques seletivos contra o Estado Islâmico. Na mesma semana, a Rússia iniciou ataques ao Estado Islâmico.”

Pessoal técnico militar russo faz manutenção de aviões Su-24 no aeroporto Hmeimim, na Síria - Sputnik Brasil
Aviação russa destrói novos alvos do EI na Síria
O comentário é de Fabiano Mielniczuk, falando com exclusividade para a Sputnik Brasil sobre os ataques da Força Aérea Russa contra integrantes, posições, equipamentos e instalações do Estado Islâmico na Síria, deflagrados esta semana.

Diretor do o curso preparatório para as provas de ingresso no Ministério das Relações Exteriores do Brasil, o Professor Mielniczuk lembra que Putin, na ONU, teceu fortes críticas aos Estados Unidos e ao Presidente Barack Obama por sua política contrária ao Presidente Bashar Assad, e declarou que “o combate eficaz ao Estado Islâmico na Síria só pode ser alcançado com a permanência de Assad no poder, e tendo ele o apoio da comunidade internacional”.

Mielniczuk disse ainda que a Síria sem Bashar Assad pode se transformar numa nova Líbia pós-derrubada de Muamar Kadhafi, ou seja, um Estado sem qualquer configuração política.

Sobre o início das ações da Rússia no cenário conflagrado sírio, o especialista em Relações Internacionais observa:

“Logo após o começo da ação militar russa na Síria, várias fontes ocidentais de informação começaram a divulgar que os russos estariam, na verdade, atacando as forças moderadas e não o Estado Islâmico, para proteger o regime do Assad. Mas é engraçado que, nesses mesmos relatos, quando se fala em forças moderadas, um dos grupos que foram atacados pelos russos é exatamente a Al-Qaeda. É como se os americanos estivessem dando suporte para a Al-Qaeda em algumas regiões da Síria, onde eles estão operando contra as forças de Assad para tentar enfraquecer o regime.”

O Professor Mielniczuk continua a analisar a atitude da Rússia em relação aos Estados Unidos no conflito sírio:

Vladimir Chizhov - Sputnik Brasil
Rússia convoca UE a combater Estado Islâmico e restaurar economia da Síria
“É claro que é um processo que traz muitos riscos porque começou de forma violenta. Houve um entendimento entre os EUA e a Rússia, mas, mesmo assim, os russos estão preocupados com as aeronaves americanas que estão fazendo ataques na Síria, com a possibilidade de entrarem no espaço aéreo controlado pela Rússia, de poder haver algum problema entre os russos e os EUA nesta questão que é bastante específica em termos de cooperação militar, que tem que ser tratada. Eu espero que, a partir de agora, o Ocidente se dê conta de que é importante ouvir os russos e perceber a Rússia como um potencial aliado em disputas bastante importantes que o mundo está vivendo hoje, principalmente contra o fundamentalismo do Estado Islâmico, que tem tomado regiões gigantescas de territórios e tem causado todo este problema da crise de refugiados que estamos vendo na Europa. Se começar a ter um acordo entre as potências internacionais, é possível, sim, que se chegue a um desfecho menos negativo – positivo é impossível, porque a situação na Síria é bastante grave, já são mais de 300 mil mortos, desde 2011, são 4 milhões de refugiados – mas é possível que se comece a caminhar para um entendimento que passa por aquilo que foi acordado nos Acordos de Genebra. É importante neste momento de crise que os setores envolvidos participem para evitar que haja um vácuo de poder e que aconteça na Síria algo que vem acontecendo na Líbia atual, que são os terroristas da Al-Qaeda e do Estado Islâmico tomando conta do país.”

A respeito da atualidade líbia, Fabiano Mielniczuk a compara com a situação da Síria, e afirma:

“A Líbia é um ex-Estado, é um Estado falido. A Líbia existia como Estado quando era governada pelo Kadhafi. É claro que ele era um ditador, mas durante muito tempo ele foi muito útil para os europeus, que compravam petróleo de Kadhafi e pediam a ele que controlasse o fluxo de imigrantes do Norte da África até a Europa.”

“Depois da derrubada do Kadhafi”, acrescenta o Professor Mielniczuk, “o que aconteceu na Líbia foi que ela foi partilhada por uma série de grupos de poderes locais que dificilmente se entendem a respeito de uma Constituição para o país. Há vastos territórios controlados por guerrilheiros que foram armados pelos ocidentais e hoje estão atuando a favor do fundamentalismo islâmico. A situação da Líbia hoje é muito complexa, com muita gente morrendo ainda em decorrência de uma intervenção desastrada do Ocidente que derrubou Kadhafi e deixou um vácuo de poder.”

“Por isso é que a postura da Rússia desde o início da crise na Síria é de não permitir que aconteça um vácuo de poder”, observa Fabiano Mielniczuk. “A Rússia apoia o Governo sírio, apoia uma transição para uma etapa posterior, mas faz bastante tempo que os russos não apoiam Assad. Apoiam, sim, que membros da sociedade e do Governo participem do Governo de transição, mas não há uma postura da Rússia de defender unilateralmente a permanência do Assad, assim como há, sim, uma postural unilateral do Ocidente de defender a saída dele.”

O Professor Mielniczuk explica a decisão da Rússia de enfrentar o Estado Islâmico:

Su-24 em aeroporto perto de Latakia - Sputnik Brasil
Aviões russos que bombardeiam Estado Islâmico na Síria
“Eu tenho estudado a Rússia por mais de 10 anos, e, para mim, é muito razoável que Putin faça o que está fazendo principalmente levando em consideração o apoio que ele tem da população russa, aprovação que já supera a casa dos 80%, e também levando em consideração o risco que o fundamentalismo islâmico traz para a região do Cáucaso da Rússia, que já passou por duas guerras desde o fim da União Soviética – a guerra da Chechênia, no início dos anos 90 e depois, no final dos anos 90, que causou muitos problemas para a Federação Russa e era financiada pelos mesmos grupos que financiam atualmente os rebeldes atuando na Síria. Quando os russos sugeriram a retirada das armas químicas da Síria em 2013 e não permitiram que os EUA atacassem a Síria e o regime de Bashar Assad, o que os russos temiam é que aquelas armas químicas fossem levadas para a Rússia, no Cáucaso, e utilizadas contra cidadãos russos. É bastante natural que os russos estejam fazendo isso e estejam avançando a sua agenda desta forma, para defender seus interesses nacionais assim como fazem os EUA, a Europa e os outros países do mundo, agindo para defender seus interesses nacionais. É previsível o modo como a Rússia age. O grande problema é que o Ocidente não reconhece a Rússia como interlocutor. Qualquer atitude de força que a Rússia tenha é considerada como uma surpresa, algo inesperado, mas é falta de capacidade do Ocidente de ver que a Rússia de hoje é muito diferente da Rússia dos anos 90.”

Feed de notícias
0
Para participar da discussão
inicie sessão ou cadastre-se
loader
Bate-papos
Заголовок открываемого материала