A seguir, a íntegra da fala do jornalista brasileiro em Moscou:
“O mundo mudou desde que os jornais eram impressos em rotativas, depois empacotados, carregados em caminhões, descarregados nos centros de distribuição, novamente transportados até o ponto de venda e de lá, enfim, entregues aos assinantes. O processo entre a edição da notícia e sua chegada aos leitores era uma indústria pesada, com elevado número de trabalhadores, maquinário, instalações, infraestrutura, logística e muito investimento financeiro.
“Hoje, o processo de transformação deste setor já se encontra avançado. A grande maioria dos jornais diários conta com edições digitais e produz um noticiário específico, mais adequado aos interesses de cada leitor. No Rio de Janeiro, sede do jornal “Correio do Brasil”, era impensável chegar a cerca de 150 mil leitores por dia, neste início de século, sem uma estrutura que envolvesse um parque gráfico de boas proporções e um intrincado departamento de distribuição.
“Como afirmei, anteriormente, tudo mudou. Em 2012, há apenas três anos, portanto, realizamos uma pesquisa junto aos nossos assinantes e constatamos que 97% preferiam receber a Edição Digital, por um preço menor, segundos após o fechamento, no horário vespertino. Era isso ou esperar perto de duas horas e pagar um preço mais elevado pelo exemplar impresso. Asseguramos que os 3% fiéis ao passado continuem a receber as notícias impressas em papel, mas já não renovamos mais estas assinaturas. A tendência é que, em breve, 100% do nosso público leia o “Correio do Brasil” nos tablets, celulares, desktops e outros dispositivos, deixando para trás milhões de árvores cortadas, toneladas de tinta e nenhuma saudade.
“Há muito, percebemos uma transformação inexorável na forma como distribuir a notícia. Trata-se de um processo e, como todo processo, seguimos adiante com a certeza de que a qualidade do conteúdo e a credibilidade da marca devem ser preservadas e respeitadas, como valores pétreos de uma empresa jornalística. Mas o que hoje é dito assim, com tamanha clareza, ainda não chegou aos centros decisórios sobre a aplicação dos recursos publicitários – seja das empresas, seja da esfera governamental.
“Por razões inteiramente políticas, em uma demonstração cabal de força bruta, estabeleceu-se no Brasil um conjunto de apenas cinco grandes empresas que, sozinhas, captam mais de 90% de cada centavo aplicado em publicidade, tanto no poder público quanto no setor privado. Esta prática tem sido combatida, com vigor, pela sociedade civil organizada. Trata-se, porém, de uma tarefa digna de Hércules reverter uma rotina secular, com raízes profundas na luta de classes e sustentada por verdadeiras fortunas, amealhadas ao longo dos regimes ditatoriais que mancham a história do meu país e do continente latino-americano.
“Sozinhos, vamos demorar ainda mais para fazer frente à velha indústria da notícia e construir uma mídia ampla e democrática. No futuro, contaremos com um número cada vez maior de profissionais independentes, sem vínculos com a matriz do capital internacional e seus interesses, muitas vezes escusos e questionáveis à luz da ética e dos mais altos valores sociais que regem o exercício do jornalismo.
“Precisamos unir forças, em nível internacional, contra a dominação de um segmento decisivo para a sociedade, a exemplo do que ocorre na América Latina. É aqui, no grupo que reúne Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, o fórum adequado para a iniciativa de se promover esta união por uma mídia democrática e independente. Apenas o fato de se iniciar um diálogo desta envergadura, neste fórum de alto nível, já é motivo para que percebamos, todos, que o mundo mudou. E continuará mudando, com o fortalecimento da democracia e das novas mídias”.