Exclusivo: ‘Eu queria bater no presidente americano’

© SputnikMuntazar Zayidi
Muntazar Zayidi - Sputnik Brasil
Nos siga no
A Sputnik falou com o jornalista iraquiano Muntazer al-Zaidi que jogou o seu sapato contra o então presidente dos EUA, George W. Bush, durante a visita dele ao Iraque em 2008.

Segue íntegra da entrevista.

Sputnik: Primeiramente você poderia nos contar sobre aquele incidente com os sapatos, que fez todo o mundo falar sobre isso?

Al-Zaidi: Primeiramente, eu queria dizer que eu comecei a planejar a bater em George W. Bush quatro anos antes daquele incidente. Tenho uma gravação onde falo que vou responder pelos sofrimentos do meu povo. Eu procurava a possibilidade de responder com força comparável à que os americanos estavam usando contra o povo iraquiano. Era vingança pelas mentiras de George W. Bush durante alguns discursos dele, quando o ex-presidente falou que os iraquianos vão saudar os americanos com flores. Imagine como seria isso: o mecanismo de propaganda dos EUA, os sionistas e maçons tentava mostrar que o povo iraquiano cumprimentava os invasores. Nós fomos acusados deste, e eu queria responder-lhe da mesma forma – do jeito árabe. 

S.: E agora onde ficam os sapatos que você meteu na cara do ex-presidente dos EUA?

A.Z.: Claro que eles rasgaram os sapatos no mesmo dia porque entenderam que os mesmos teriam um significado importante no futuro. Porque foi o primeiro sapato que foi jogado no presidente dos EUA. Também tinha exigências de guardá-los em um museu. Em vez disso eu estou chamando de fundar o museu em memoria das vítimas da guerra e das vítimas do terrorismo bem como o museu da dignidade árabe e o museu dos governantes árabes.

© AFP 2023 / ARIF ALI Jornalista iraquiano jogou seu sapato contra George W. Bush
Jornalista iraquiano jogou seu sapato contra George W. Bush - Sputnik Brasil
Jornalista iraquiano jogou seu sapato contra George W. Bush

S.: Se puder voltar e ficar de novo em frente do presidente dos EUA, você faria a mesma coisa?  

A.Z.: Isso pode acontecer somente uma vez na vida: como uma injeção que você faz uma vez e depois joga a seringa na lixeira. Era uma resposta adequada às palavras de George Bush que nós o tínhamos saudado com flores. Ele merecia aquela resposta. Mas eu não vou responder do mesmo jeito cada vez. Cada presidente receberá resposta diferente. Por exemplo, eu fundei uma organização cujo motivo é rejeitar a ocupação americana do Iraque. O nosso objetivo é iniciar processos jurídicos para perseguir as pessoas culpáveis da agressão no Iraque e as pessoas envolvidas em crimes contra o povo iraquiano.

Aviões F-18E Super Hornets da Força Aérea dos EUA voando sobre o norte do Iraque, 23 de setembro 2014 - Sputnik Brasil
Consulado turco no Iraque destruído pela coalizão americana
S.: Muita gente conhece a sua ação, mas nem todos conhecem Muntazer al-Zaidi. Como você se descreveria?

A.Z.: Eu sou um cidadão árabe, um nacionalista. Eu nasci no Iraque, em Bagdá, mas eu cresci na província de Zi-Kar, que é o lugar onde também nasceu o profeta Abraão. Esta província tem uma grande importância porque ela é única e todos os iraquianos sabem disso. É a cidade dos poetas, músicos, é a cidade natal dos muitos políticos iraquianos. Sou casado com a libanesa. A mãe da minha filha se chama Omidia, em honra da rainha da antiga Babilônia.

S.: Alguns jornais escreveram sobre a sua última conversa no canal egípcio, onde você diz a frase seguinte: "Deus não pode deter aqueles que roubaram a riqueza do Iraque". Por que você disse isso?

A.Z.: ”O que aconteceu foi que eu disse que a existência de Deus e do Alcorão não são obstáculos para aqueles que roubaram a riqueza do Iraque. Ou seja, eles são “ladrões” que não têm medo de Deus e continuam roubando. No entanto, a imprensa popular deturpou as minhas palavras e as interpretou como "distorção e pecado contra o Deus”. Isto é inadmissível, porque eu sou uma pessoa religiosa, e eu temo a Deus.

S.: Depois daquele incidente com os sapatos, você estava detido. Você poderia os contar os detalhes sobre este período?

A.Z.: Depois de ser detido, a inteligência iraquiana me colocou na cadeia onde eu fiquei três meses. Durante todo esse período eu fui interrogado e depois transferido para a colônia geral, onde fiquei por aproximadamente seis meses. Naquele tempo, a minha tribo Banu Zayd saiu nas ruas iraquianas exigindo que o governo iraquiano me liberasse. Agora, eu moro em Beirute. Eu me recusei da oferta do parlamento suíço do asilo político, e agradeço-lhes por isso. Eu recusei do asilo político depois de ter sido proibido de voltar para o meu país.

© AFP 2023 / AHMAD AL-RUBAYE Muntazer al-Zaidi
 Muntazer al-Zaidi  - Sputnik Brasil
Muntazer al-Zaidi

S.: Nós sabemos que você pertence ao Islã xiita. Você já tinha problemas por causa disso no Iraque?

A.Z.: Aqueles que dizem que existe discriminação religiosa no Iraque, erram profundamente. Estas questões não nos separaram. Os filhos dos meus primos muçulmanos são xiitas, enquanto suas esposas ou maridos são muçulmanos sunitas. E assim em todo o país. Aqueles que cometem massacres no Iraque — xiitas e sunitas, mas eles são extremistas e não pertencem ao povo iraquiano, que sempre viveram e vivem em harmonia com todos. A minha tribo, Zaidi ou Banu Zayd, conta com alguns milhares de pessoas, a metade dos quais são sunitas, e a outra metade, xiitas. Isso é comum no Iraque. As conversas sobre as iniciativas de propagar o xiismo são apenas um mito ou uma mentira. Por exemplo, antes da agressão eram cerca de cinco milhões de egípcios sunitas que viviam no sul do Iraque, e a grande maioria da população da região eram xiitas. Então, foi possível propagar o xiismo entre pelo menos metade deles, que faria três milhões de egípcios xiitas potenciais voltar ao Egito, com motivo de propagar o xiismo lá. Mas isso não aconteceu. Ao nível político, às vezes tem alguns obstáculos. Por exemplo, eu poderia conhecer alguns dos líderes do Hamas (sunitas). Mas, ao mesmo tempo, eu temo me encontrar com os líderes do Hezbollah (xiitas), porque tenho medo que surjam rumores tipo: “Muntazer sunita se reúne com xiitas para planejar algo”, que provavelmente poderia acontecer na imprensa.

Salman Bin Abdulaziz Al Saud, rei da Arábia Saudita - Sputnik Brasil
Xiitas da Arábia Saudita defendem execução da família Saud
S.: Você acha que há certos aspectos que jogam um papel importante na cisão religiosa?

A.Z.: Claro. Os EUA estão tentando provocar a cisão religiosa, não somete no Iraque, mas em todos os países árabes. Este jogo os EUA conhecem bem. Por exemplo, descobrimos que os Estados Unidos estão apoiando indiretamente o Daesh no Iraque, que afirmam que estão lutando contra o regime xiita. Os Estados Unidos também suporta alguns grupos terroristas na Síria. Também existem alguns dados que eu recebi dos líderes militares iraquianos, que estavam liberando bairros do Iraque de Daesh. Segundo esta informação os militares iraquianos encontraram no deserto as paraquedas das tropas de desembarque dos EUA com armas e ajuda médica e alimentar. Esta carga foi reivindicada pelo Daesh. Estes paraquedas poderiam ser utilizados somete pelos militares dos EUA. Os Estados Unidos lançaram ajuda humanitária para os combatentes do Daesh para que eles pudessem resistir ao exército iraquiano, que luta contra o terrorismo.


Feed de notícias
0
Para participar da discussão
inicie sessão ou cadastre-se
loader
Bate-papos
Заголовок открываемого материала