Oficialmente, as autoridades garantem que a cidade-sede dos Jogos estará segura durante todo o evento, que vai do início de agosto ao final de setembro. No último domingo, as Forças Armadas assumiram a segurança e defesa do Rio de Janeiro. Cerca de 22 mil militares da Marinha, do Exército e da Força Aérea Brasileira foram destacados para patrulhar as ruas da capital fluminense durante o período olímpico. A eles se juntam homens de outras 20 instituições, totalizando quase 90 mil agentes, maior mobilização do tipo já realizada no Brasil, complementada por atividades de cooperação com mais de 100 países.
#ForçasnaOlimpíada 🌅 Militares das FFAA irão colaborar na segurança junto a outras agências https://t.co/D25cCdZNla pic.twitter.com/BzNoA4R8Fw
— Ministério da Defesa (@DefesaGovBr) 26 июля 2016 г.
Exercícios simulados, palestras, monitoramentos, colaboração entre forças, mobilização de esquadrões antibombas, investimentos em novos equipamentos, inteligência, tudo isso vem sendo sublinhado com frequência por órgãos de imprensa de todo o país. A sensação de insegurança, no entanto, ainda persiste. Uma pesquisa recente realizada pela Q Social Now mostrou que, no primeiro semestre de 2016, 50% das citações sobre segurança nos Jogos Olímpicos no Twitter tinham caráter negativo, enquanto apenas 13% eram positivas. No ano passado, em levantamento do Unysis, 77% dos entrevistados afirmaram ter preocupação com a segurança no país durante o período das Olimpíadas, com destaque para o que diz respeito à violência urbana. E, na semana passada, em meio às notícias da Operação Hashtag, na qual a Polícia Federal desarticulou uma suposta célula terrorista no Brasil, uma sondagem do Instituto Paraná Pesquisas, feita a pedido do site Metrópoles, revelou que 52,3% dos consultados acham possível que ocorra um ataque terrorista durante a Rio 2016.
A sensação de falta de segurança que atinge boa parte da população contagia também parte daqueles que estão encarregados justamente de garantir a segurança. Nas últimas semanas, manifestantes organizados das forças de segurança do Rio de Janeiro realizaram protestos para denunciar o estado de calamidade do setor e o que eles afirmam ser uma "mentira olímpica" das autoridades que tentam passar uma imagem de cidade segura e organizada para receber um evento como os Jogos Olímpicos.
'Welcome to Hell': Rio police protest financial disaster ahead of #Olympics https://t.co/eHMDEAw7SD This is gonna be a Nightmare
— UnHate (@everylifeworthy) 15 июля 2016 г.
Se a questão gera tanta polêmica a nível local, com boatos até sobre uma possível greve da Polícia Civil, como garantir que a cidade está preparada para lidar com problemas ainda maiores, que extrapolam o espectro da segurança cotidiana?
De acordo com uma reportagem publicada pelo Washington Post na última quarta-feira, 27, apesar do empenho das autoridades brasileiras, a noção de segurança no Brasil é anterior aos atentados de 11 de setembro de 2001 em Nova York, considerados um ponto de virada nos esforços internacionais de combate ao terrorismo. No texto, a jornalista Shannon Sims cita a falta de experiência dos órgãos públicos em relação a ameaças extremistas e destaca até a maneira descontraída como o tema é tratado pelos brasileiros.
The Olympics are being held in a country with a pre-9/11 notion of security https://t.co/GxTe8Z8Djh
— Washington Post (@washingtonpost) 27 июля 2016 г.
Segundo uma fonte não identificada das Forças Armadas do Brasil, as críticas e a desconfiança quanto à capacidade do país de garantir a segurança de todos durante um evento desse porte não são sem sentido. Para o militar da Força Aérea, é justamente essa falta de experiência com ameaças maiores que causa mais preocupação.
"A Força Aérea Brasileira, assim como as demais forças armadas e auxiliares, está investindo em treinamentos, realizando simulações de situações de risco, preparando as tropas especiais e capacitando o seu efetivo para a segurança dos Jogos Olímpicos. No entanto, não posso negar que o fato de nunca termos recebido um evento desse porte e o contexto do cenário mundial, no qual as ameaças de terrorismo são cada vez mais iminentes, me causam apreensão e insegurança", disse a fonte em entrevista à Sputnik.
Para algumas organizações não-governamentais, essa falta de preparo das forças de segurança pode descambar para um lado sombrio e já bastante conhecido da população brasileira, que é a perseguição a grupos já marginalizados. Organizações como a Artigo 19 temem principalmente "riscos de eventuais abusos policiais e judiciais em favelas, já que durante a Olimpíada o Exército assume funções de polícia nas comunidades pobres do Rio".
"A atuação da Polícia Militar no Rio já é questionada pelas ONGs, que apontam para o uso desproporcional da força e desrespeito de direitos, em especial nas ações policiais nas comunidades. Com o Exército, o temor é que esses efeitos se ampliem, já que as Forças Armadas podem adotar protocolos diferentes de abordagem a civis", diz o grupo em seu site.
A pesquisadora de Estudos Estratégicos da Defesa e da Segurança da Universidade Federal Fluminense (UFF) Barbara Dutra, também ouvida pela Sputnik, acredita que a questão da segurança, ou da insegurança, nos Jogos Olímpicos é muito mais complexa do que aparenta, porque envolve muitos outros fatores além da preparação de pessoal qualificado.
"A instabilidade política e a crise econômica geram por si só sentimento de insegurança. O estado do Rio está endividado, com obras superfaturadas, universidades estaduais em greve há meses (sem nenhum comentário dos grandes jornais), não está pagando os funcionários, nem honrando com os concursos feitos", afirma Dutra. "O alarmismo e o despreparo em torno dos ataques terroristas geram ainda mais insegurança não só na população mas também nas forças de segurança, fuzileiros, PMERJ etc, que se sentem ameaçados e acabam contribuindo para essa campanha de 'Não venham ao Brasil'", comentou ela, se referindo ao recente post do suposto policial no site de humor.
Reconhecendo a falta de qualificação das forças encarregadas da segurança na Rio 2016, Barbara opina que é muito difícil o Brasil ser vítima de um atentado terrorista, pelo caráter pacifista e não intervencionista da política externa brasileira, mas não descarta a possibilidade de ataque a algumas delegações estrangeiras que estiverem aqui durante os Jogos.
"Acho que o Brasil, nesse ponto, se torna seguro apenas por não ser alvo de grupos estrangeiros, e não pelo preparo".
Finalizando, a pesquisadora contextualiza as manifestações de parte dos agentes de polícia e de outros órgãos, além da própria população, contra as Olimpíadas, e faz um convite aos visitantes, para que não deixem de participar do evento:
"Venham se divertir com cautela, tragam suas crianças. Mas quando virem uma placa ofensiva aos Jogos ou tentativa de apagar a tocha, não nos julguem. Muitos de nós preferiam que esse dinheiro tivesse sido gasto em hospitais, UERJ, UENF e para salvar o estado da crise em que se encontra. Essa foi a maneira que encontramos de sermos ouvidos, porque o mundo está em looping de ataques e problemas de segurança. Gritando isso, saberemos que vocês nos darão atenção".