Na segunda-feira, 8, o Ministério Público Federal ingressou com ação na Justiça Federal para impedir que pessoas portando cartazes e inscrições contrárias ao presidente interino Michel Temer fossem retiradas dos locais de competições, como vinha acontecendo em alguns locais do Rio de Janeiro e de outras cidades em que os Jogos estão sendo realizados. Para o Comitê Rio 2016, tratava-se de atender ao disposto na Lei Geral das Olimpíadas 2016, moldada na Lei Geral da Copa do Mundo de 2014, que proíbe em todos os ambientes de competições a exibição de inscrições ofensivas e de cunho xenófobo, racista e que incitem à violência. Em alguns casos, os portadores de tais inscrições foram retirados com emprego de força policial.
Diante deste quadro, o Ministério Público Federal recorreu ao Tribunal Regional Federal e obteve do juiz federal substituto João Augusto Carneiro de Araújo a concessão de medida liminar, suspendendo essa prática. A decisão judicial seria válida até o julgamento do mérito da ação. Em seu despacho, o magistrado afirmou:
"Defiro o pedido de concessão da tutela de urgência para o fim de determinar aos réus que se abstenham, imediatamente, de reprimir manifestações pacíficas de cunho político nos locais oficiais, de retirar do recinto as pessoas que estejam se manifestando pacificamente nestes espaços, seja por cartazes, camisetas ou outro meio lícito permitido durante os Jogos Olímpicos e Paralímpicos Rio 2016, sob pena de multa pessoal ao seu responsável no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) a cada ato que viole a presente decisão, sem prejuízo das demais sanções previstas legalmente."
Em entrevista exclusiva à Sputnik Brasil, o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção Rio de Janeiro, Felipe Santa Cruz, ressalvou que a decisão judicial é totalmente correta por ser baseada na Constituição Federal, a lei maior do país:
“A Constituição é superior à lei e garante a livre manifestação. É uma Constituição libertária, que assegurou garantias após um regime ditatorial que tivemos durante muitos anos no país. É uma Constituição com grande cuidado com as liberdades individuais e com os direitos coletivos de manifestação. Portanto, a lei ordinária não pode limitar as liberdades que a nossa Constituição entende serem sagradas para nós, liberdades que são maiores do que as nossas divergências. Nós concordamos com esta lei [da Copa e das Olimpíadas] na medida em que ela proíbe manifestações racistas e de ódio. Porém manifestações livres e pacíficas a que o Brasil vem assistindo desde 2013 devem ser realizadas por revelar perspectivas e posicionamentos ideológicos, garantidos pela Constituição.”
Em relação à prática de possíveis ofensas que tenham sido vistas como tais por parte de quem empunhava cartazes com os dizeres “Fora Temer”, Felipe Santa Cruz comenta:
“Eu acho que para um governante as palavras ‘fora’ ou ‘dentro’ não são ofensivas. São manifestações de entendimento, digamos assim. Ódio é racismo, ódio é rechaçar algum tipo de etnia que chegou aqui, o que é inadmissível. Não é este o caso. Nós estamos construindo o Brasil dos últimos anos com grande tolerância à divergência. Aliás, essa é a única parte positiva dessa crise toda: a nossa compreensão de que o Brasil convive hoje com a divergência dentro de um quadro totalmente institucional.”
Já para o presidente estadual da Juventude do PT em São Paulo, Erik Bouzan, a tentativa de criminalizar os protestos durante os Jogos Olímpicos funcionou como um tiro no pé. O ativista diz que a decisão da Justiça de impedir a prisão e a retirada de manifestantes das arenas esportivas durante os protestos não fere as normas do próprio Comitê Olímpico, e que as manifestações, desde que não sejam xenófobas ou de conteúdo agressivo, são previstas pela própria Constituição brasileira.
"Na Copa do Mundo, o que se viu foi uma postura do governo totalmente diferente do interino de agora, que mostra uma predisposição ao autoritarismo", diz Bouzan, lembrando uma frase, à época, da agora presidente afastada DIlma Rousseff: "Prefiro as vaias da democracia ao silêncio da ditadura."
O secretário da Juventude do PT diz que a decisão da Justiça e o parecer do próprio ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes – que defendeu as manifestações durante os Jogos – dividiram a própria direita. Segundo Bouzan, “a decisão vai aguçar ainda mais a vontade da juventude em protestar e denunciar para todo o mundo o golpe perpetrado pelo Governo interino com o afastamento de Dilma Rousseff”.