Mesmo centrais que mostravam antagonismos entre si atenderam à convocação para o encontro na sede da Central Única dos Trabalhadores (CUT), até mesmo a Força Sindical, única que continua a dialogar com o governo. À reunião compareceram representantes da CUT, União Geral dos Trabalhadores (UGT), Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Central dos Sindicatos Brasileiros (CSB), Nova Central Sindical de Trabalhadores (NCST), Conlutas, Central Geral de Trabalhadores do Brasil (CGTB), Intersindical e União Sindical dos Trabalhadores (UST), representando quase 13 milhões de filiados em todo o país.
A Sputnik Brasil conversou com secretário adjunto de Assuntos Internacionais da CUT, Ariovaldo Camargo, para quem a reunião de todas as centrais em torno de uma atuação conjunta mostra a gravidade política, econômica e social enfrentada hoje pelo Brasil.
"A proposta de uma greve geral reúne as principais centrais sindicais do país em um mesmo tema, sob a mesma ótica e mesma necessidade de fortalecimento e unidade dos trabalhadores na perspectiva da construção da resistência ao conjunto de ações que o governo golpista de Michel Temer vem anunciando desde o princípio do golpe até o presente momento com algumas realidades com o envio de projetos à Câmara dos Deputados como a PEC 241 (que congela os gastos públicos por 20 anos)."
Camargo lembra que a proposta, já aprovada em primeiro turno, na Câmara não passe no segundo turno e, se aprovada, que o Senado rejeite a proposta que, segundo ele, destrói toda a política social do país, o que levaria a condições muito difíceis na manutenção dos direitos dos trabalhadores.
Entre os riscos apontados pelo sindicalista está a perda da saúde e da educação pública para todos, a reforma da Previdência que eleva a 65 anos a idade mínima para os trabalhadores tanto homens quanto mulheres para se aposentar.
"Não há divergências entre as centrais, inclusive a Força Sindical, que não tem concordância com essas propostas que já foram anunciadas. Todos os trabalhadores, sejam eles de quais centrais pertencem seus sindicatos, estão convocados para a realização dessa greve geral. A data indicada é 11 de novembro, mas seja qual for a confirmação, o norte é a resistência contra tudo aquilo que o governo de Michel Temer e seus 300 e poucos deputados, que votaram pelo impeachment da presidente Dilma e também aprovaram a PEC 241 em primeiro turno."
Camargo admite que não se lança greve geral a qualquer hora e contra medidas pontuais.
"Há mais de 20 anos não temos uma greve geral no país. Essa tradição não está dada no histórico da classe trabalhadoras brasileira. No entanto, o que temos hoje é um ataque descomunal do ponto de vista da retirada de direitos do conjunto da classe trabalhadora, que vai do setor público aos mais precarizados, como o legislado perdendo relevância para o acordado, com a possibilidade de elevação da jornada de trabalho para 72 horas semanais, o desmonte da escola pública com a reforma do ensino médio."
Metalúrgicos, petroleiros, bancários mais os servidores públicos federais, estaduais, municipais também estão se mobilizando. Os professores em São Paulo já estão com a data marcada esperando apenas a definição da data das centrais sindicais para se incorporarem à greve geral.
"Vamos medir a pressão dos movimentos sociais para construir o dia do grande enfrentamento que teremos que fazer. O governo já mostrou a que veio, é um governo que vem para atacar os trabalhadores, para seguir as receitas do neoliberalismo que pensávamos ter amortecido em 2002 com a eleição do presidente Lula. Lamentavelmente essa pauta volta com força porque aqueles que patrocinaram o golpe estão cobrando o preço do patrocínio, e o Temer está a serviço dessas forças conservadoras, do grande capital", diz Camargo, para quem a participação dos trabalhadores da área de transporte será fundamental para que paralisem as atividades do dia e dificultem a ida ao trabalho daqueles que não aderirem à greve.
Brasil não tem histórico de greve gerais
Dario Sousa e Silva, professor de Sociologia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e do Instituto de Ciências Sociais da universidade, admite que, de início, nenhuma greve é fácil.
Para o professor, é difícil entrar em greve, manter e às vezes é difícil até sair de greve. Uma greve geral envolvendo grande parte dos setores, segundo ele, envolve uma comunicação e uma densidade política muito grande e é muito difícil de ser consolidada. A própria notícia de que há uma proposta de greve geral que reuniu centrais que nem sempre andam juntas e frequentemente são antagonistas é demonstrativo da gravidade do momento. Na avaliação de Sousa e Silva, não é nada fácil chegar a 100% de adesão numa greve, mas a convocação dá uma ideia do ímpeto político que essas centrais vão colocar no cenário político e que pode gerar um impacto muito grande.
Sousa e Silva diz que é difícil falar de uma falta de tradição de greve geral no país. Em 1917, houve a consolidação do movimento operário no Brasil, uma época particularmente conturbada no mundo, com a revolução bolchevique, a difusão de um movimento operário em parte tocado por comunistas e anarquistas. Para o professor, aquele contexto era muito muito diferente do de 1989. No início do século 20, lembra, esse movimento de greve operária deu origem a famosa frase atribuída ao presidente Washington Luiz: 'A questão operária é uma questão de polícia.'
"A característica desse momento de chamar uma greve geral vem da impossibilidade e indisposição de diálogo por parte dos governantes. Se algo pode unir as pontas dessa esporádica proposta de greve geral é isso: vivemos um momento de muito séria centralização da tomada de decisões e de verdadeiro risco ao que foi conquistado e criou uma série de garantias trabalhistas muito importantes para a identidade do movimento sindical e também para o que nós entendemos de segurança do trabalho, no sentido de que ele é regulamentado e protegido. Esse Estado não está disposto a manter essa segurança. Pelo contrário: está a retirando velozmente."
Para Sousa e Silva, a mudança das leis trabalhistas a fim de aumentara produtividade do país não se justifica.
"A proposta de uma jornada de trabalho de 12 horas reproduz o que era proposto na década de 60, no século 19, na Inglaterra. Se isso é modernização, acho que a gente vai muito mal."