O diretor da Agência de Segurança Nacional dos EUA, Michael Rogers, comentando os resultados das eleições, mencionou as "ações conscientes de um certo Estado para atingir um objetivo específico", e a candidata do Partido Verde, Jill Stein, pediu oficialmente às autoridades para realizarem a recontagem dos votos em Wisconsin, se referindo aos relatos de um possível arrombamento de sistemas de votação por hackers estrangeiros.
No entanto, continua vanden Heuvel, se a Rússia realmente se envolveu no decorrer das eleições norte-americanas, qual seria o propósito de tal intervenção? O próprio Vladimir Putin, aliás, chama tais suposições de manifestação de "histeria", os especialistas em segurança cibernética dizem que não existem fortes evidências da culpa de Moscou.
A revista The Economist afirma que o principal "propósito do Kremlin" era desacreditar as instituições democráticas — as eleições, a liberdade de expressão, bem como desferir um golpe demolidor na reputação de ambos os candidatos. Para os jornalistas da publicação britânica, em geral, os "motivos de Moscou" se reúnem sob a bandeira da estratégia de "ataque à reputação da marca".
"Já que usamos a gíria de marketing em relação a eleições democráticas, vamos também pensar sobre qual seria o retorno dos investimentos (ROI, Return on Investmant) supostamente feitos por Putin", ironiza Heuvel. Na verdade, ambos os candidatos usaram seu tempo de antena gratuito (no valor de bilhões) e gastaram mais de um bilhão de dólares para " enfraquecer ao máximo o oponente", principalmente denegrindo. Donald Trump disse que a atual campanha foi "a mais suja" não por causa de qualquer intervenção de Moscou, mas por culpa dos próprios candidatos à presidência.
"Foram exatamente os jornalistas, e certamente não Putin, que decidiram que o tema das catastróficas mudanças climáticas não merecia nenhuma menção nos debates presidenciais e que às opiniões preocupantes da falcão-Clinton e do furioso Trump devem merecer menos atenção do que o correio de Hillary ou os discursos picantes do republicano", disse a editora.
Também não é culpa de Putin que o sistema eleitoral da "democracia mais forte do mundo" provoque um sentimento de vergonha, porque o voto democrático, pela segunda vez nos últimos cinco, causou a vitória do candidato que não tinha ganho a maioria dos votos. O dinheiro significa para as eleições nos Estados Unidos mais do que em qualquer outra parte do mundo, apenas pela razão de que as eleições norte-americanas são as mais caras, enfatiza vanden Heuvel. Em 2016, as eleições presidenciais e as eleições para o Congresso custaram um recorde de 6,8 bilhões, contudo a participação de 58% dos cidadãos com direito a voto neste ano continua sendo uma das mais baixas entre os países democráticos.
Segundo a especialista, a histeria em torno da "intervenção russa" não é acidental — é dessa forma que os neoconservadores e liberais, que defendem a intervenção na política interna de outros países, promovem a agenda de uma nova Guerra Fria com a Rússia.
"Não é preciso nenhumas ações de propaganda da Rússia para entender que as eleições norte-americanas foram organizadas de forma vergonhosa. Os líderes de ambos os partidos, se eles estão pelo menos um pouco preocupados com a situação no país, teriam de iniciar as reformas do sistema e da legislação eleitoral. E não são precisos hackers russos para desacreditar a liberdade de imprensa — a própria mídia dos EUA se encarrega disso produzindo artigos superficiais e de má qualidade", enfatiza Katrina vanden Heuvel.