A opinião é do cientista político Ricardo Ismael, professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), que conversou com a Sputnik Brasil e traçou um cenário desafiador para a sociedade brasileira. Para o especialista, a corrupção é um problema que vem de longe na história brasileira, mas que agora assumiu proporções quase inimagináveis.
"Nesse sistema partidário, que foi ancorado no PT, PSDB e PMDB a partir de 1994 no plano nacional, havia sempre uma polarização entre PSDB e PT. O PMDB passou a não lançar mais candidato a presidente, porque ele ficava como o guardião da governabilidade e dava apoio ao PSDB no Congresso, depois ao PT. Esse tripé conduziu o processo político nacional que está agora extremamente atingido com todas essas investigações e delações premiadas", diz o analista. Para Ismael, a sensação generalizada no país é que é preciso fazer urgentemente uma renovação de lideranças, partidos e da política, principalmente nessa" relação promíscua entre o público e o privado".
"Isso não pode ser feito por mágica. Não tem como chegar agora e demitir senadores e deputados federais. A única coisa que mal ou bem tem sido ponto de convergência hoje num país completamente dividido é a Constituição, coisa que não acontecia no pré-64. Vamos ter que ir com eles até a próxima eleição para o Congresso Nacional", analisa Ismael, que credita ao presidente Michel Temer e a base governista boa parte do ônus pelo atual impasse, uma vez que, como governo interino e tampão, se arriscou a tentar aprovar reformas tão radicais como as trabalhista e da Previdência, que seriam para um início de governo e com índices de popularidade que o atual não tem.
O cientista político concorda que um dos riscos para a renovação do quadro político é a descrença acentuda da população em relação à classe política, como ficou demonstrado nas últimas eleições municipais, onde a soma de votos brancos, nulos e abstenções ultrapassou de longe os recebidos pelos novos prefeitos do Rio, de São Paulo e de dezenas cidades do país. Para Ismael, contudo, só o voto pode alterar o panorama brasileiro.
"Esse comportamento de votar branco, nulo ou mesmo se ausentar impede a renovação de lideranças, do sistema partidário. O segundo sentimento que também tem que ser combatido é voltar aos tempos de uma intervenção militar, fecha o Congresso, bota alguém lá que vai resolver as coisas na base da canetada. O processo de renovação de valores do ponto de vista da cultura política terá que ser na democracia, mesmo com as imperfeições e problemas que ela tem. O tempo da democracia talvez seja um tempo mais longo do que as pessoas gostariam", finaliza o cientista político.