Na véspera dos encontros a Sputnik Brasil falou com Fabiano Mielniczuk, especialista do Clube de Discussão Internacional de Valdai, Diretor da Audiplo e professor da ESPM-Sul para saber mais sobre as razões, peculiaridades e objetivos desta visita. Leia a íntegra:
"Eu vejo a visita do presidente Temer como um agradecimento em relação ao apoio dado pela Rússia na recente crise gerada pela operação Carne Fraca no Brasil. A Rússia foi o único grande importador de carne brasileira que confiou inteiramente no governo do Brasil e não suspendeu a compra de carnes.
Apesar disso, a imprensa brasileira enxerga a visita como uma tentativa de o presidente Temer aparentar normalidade em seu governo, que está sob grave ameaça de um pedido de denúncia da Procuradoria Geral da República. Nas próximas semanas, a crise política brasileira tende a piorar.
A política externa tem um papel pouco relevante no debate político atual do Brasil. Temer pretende utilizar o eventual aumento das exportações de carne do Brasil para a Rússia como uma vitória de seu governo para preservar os interesses do setor agropecuário, afetado negativamente com os últimos desdobramentos das delações da JBS. Porém, no médio prazo, isso enfraquece o direcionamento da política externa do PSDB, e pode acarretar no enfraquecimento de sua base de sustentação no congresso. Quem ganha com isso é a Rússia, que anula a tendência dos PSDbistas de se aproximarem dos EUA.
Depois de muitos anos com diplomatas profissionais à frente do MRE, o governo Temer decidiu colocar políticos como chefes do ministério como maneira de garantir a manutenção de seu governo de coalizão. O MRE ficou com o PSDB, que cresceu politicamente nos últimos anos criticando a política externa do presidente Lula, declaradamente voltada para fomentar a multipolaridade em organismos como o BRICS. Foi sob Lula, também, que ocorreu a maior aproximação entre a Rússia e o Brasil. O PSDB denuncia claramente o afastamento do Brasil de seus parceiros tradicionais — como os EUA e a Europa — e critica as alianças do Brasil com países que têm relações conflituosas com os Estados Unidos. Isso preocupou a Rússia, que inclusive recebeu com desconfiança a substituição do presidente no Brasil. Porém, como a base de sustentação do governo Temer é muito frágil, a diplomacia russa percebeu que poderia ajudar o Presidente Temer e assim neutralizar a influência do PSDB na área externa, algo que está sendo alcançado via diplomacia presidencial (quando o presidente executa as funções de ministro das relações exteriores, algo que tem sido uma tradição nos governos brasileiros). Ao que tudo indica, a Rússia está alcançando os resultados que deseja, como a visita dessa semana indica. Mais uma vez, os russos estão dando uma aula de diplomacia para o resto do mundo".