A pressão parlamentar, principalmente de estados grandes produtores, como São Paulo e Pernambuco, porém, começa a surtir efeito. A Câmara de Comércio Exterior (Camex) já estuda impor uma sobretaxa de 17% nas importações do etanol proveniente dos EUA. As compras no mercado americano são regulares pelo Brasil, mas o país só importa tradicionalmente para cobrir os períodos de entressafra que, no Centro-Sul, principal região produtora do país, vai de dezembro ao fim de março.
Em entrevista à Sputnik Brasil, David Zylbersztajn, professor do Instituto de Energia da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), lembra que o custo de produção do etanol a partir do milho, como é feito nos EUA, é maior do que o obtido através da cana-de-açúcar, caso do Brasil. Segundo ele, nos últimos dez anos, porém, os americanos investiram muito em produtividade e qualidade de sementes, como ocorria no Brasil durante muitos anos, quadro que se alterou a partir do momento em que os preços da Petrobras ficaram artificialmente baixos, levando o setor a um sentimento de incerteza, que gerou falta de investimento e o fechamento de diversas usinas.
Com a experiência de quem foi o primeiro diretor-geral da Agência Nacional do Petróleo (ANP) em 1977, Zylbersztajn diz que o etanol é mais do que uma alternativa à gasolina, pode ser considerado a gasolina brasileira, e desde os meados da década de 70 foi o responsável por uma das maiores revoluções mundiais no campo da energia.
"Hoje o que a gente coloca no tanque é um quarto de etanol anidro. Há um dado que mereceria ser melhor estudado no Brasil: a eficiência dos automóveis com o uso do etanol aumentou muito, mas a gente continua com a velha fórmula de calcular se vale a pena ou não abastecer com álcool. Hoje a eficiência do álcool está bem mais próxima da gasolina, A taxação não seria novidade. Quando o etanol brasileiro tinha excedentes em volume e custos bem mais baixos do que o etanol de milho, o governo americano taxava o etanol brasileiro em torno de 55 centavos de dólar por galão. Isso inviabilizou durante muito tempo a exportação de etanol para os Estados Unidos", lembra o especialista. Na ocasião, o governo americano argumentava que o subsídio ao álcool no Brasil tirava a competitividade dos produtores americanos.
Com relação à exportação do etanol brasileiro para outros mercados, Zylbersztajn diz que não há embarques expressivos para a União Europeia, por exemplo, uma vez que as usinas brasileiras não estão dando conta de atender ao mercado interno. Ele lembra que, se o álcool americano está sendo competitivo no Brasil, mais competitivo ainda é na UE.
Falando sobre o mercado interno, Zylbersztajn aponta uma certa culpa dos produtores brasileiros pela situação atual, na medida em que nunca houve uma previsibilidade na produção. O especialista explica que há dois tipos de usinas de álcool no Brasil: as que produzem apenas açúcar e aquelas que produzem tanto açúcar quanto álcool. Quando o preço internacional do açúcar está bom, o produtor prioriza a produção desta commodity e reduz a de etanol.
"O produtor acaba dando um tiro no próprio pé, porque ele acaba desacreditando o mercado de etanol e retira a confiança do consumidor. A escassez de etanol, que faz elevar o preço aqui dentro, também é devido a isso. Esse é um problema histórico do setor na relação com o mercado em geral."