Gevorg Mirzayan, professor do Departamento de Ciências Políticas da Universidade de Finanças do Governo da Rússia esclarece o assunto no seu artigo para a Sputnik.
Ponto de ebulição
É assim que a mídia norte-americana caracteriza as relações atuais entre Ancara e Washington. Devlet Bahceli, líder nacionalista turco, por sua vez, afirma que a parceria estratégica entre os EUA e a Turquia pode acabar a qualquer momento. Ele aponta ao escândalo dos vistos que abalou as relações entre dois países e deu início ao afastamento.
O escândalo foi provocado por os EUA terem suspendido a emissão de vistos para cidadãos turcos. A retaliação norte-americana tem como contexto a detenção de Mehmet Topuz, funcionário do Consulado dos EUA em Istambul dias antes, acusado de ligações com o clérigo Fethullah Gulen, que, segundo Ancara, teria sido o responsável pela tentativa de golpe de Estado ocorrida em julho de 2016 na Turquia.
Após a troca dessas medidas, Ancara, de acordo com o analista russo, avançou no conflito. O presidente turco declarou que os EUA são manipulados pelo embaixador em Ancara e imolam seu parceiro estratégico pelo embaixador, que "nem sabe seu lugar". O embaixador em questão é John Bass, foi ele que chamou a detenção do funcionário do Consulado de "tentativa de minar a velha cooperação entre a Turquia e os EUA".
Erdogan acrescentou ainda que os norte-americanos tentam destruir a Turquia por fora e por dentro e este é "o plano sujo de Washington", sublinhou líder turco.
Não toquem nos terroristas!
Mas nem Fethullah Gulen, Mehmet Topuz ou John Bass são culpados deste desentendimento entre Ancara e Washington. O núcleo das divergências está nos interesses diferentes dos dois países no Oriente Médio.
Primeiro, os americanos não estão de acordo com operação turca em Idlib, que Ancara está realizando segundo um convénio com Moscou, Teerã e Damasco e visa eliminar a Frente al-Nusra (organização terrorista, proibida na Rússia).
Levando em consideração que, em 13 de outubro, a administração de Donald Trump declarou o endurecimento da política relacionada ao Irã, parece que Washington está interessada no prolongamento do conflito sírio, destaca o analista. O fato de a Turquia ter mudado de lado neste conflito irrita muito os EUA.
Questão curda
Teoricamente, Ancara podia aproveitar o conflito crescente entre Washington e Teerã, por exemplo, para pedir mais concessões da parte dos russos, sírios e iranianos na Síria em troca da lealdade.
O conflito com o Irã aumenta a importância da carta curda para Washington. Os curdos sírios serão um contrapeso sério para Damasco pró-iraniano, enquanto o Curdistão iraquiano criará obstáculos para o Irã em termos de segurança. Nestes casos, os interesses da Turquia ficam em segundo plano.
Com quem fazer acordos?
A falta de atenção em relação aos interesses da Turquia deixa Erdogan insatisfeito. Ancara se mostra pronta a começar uma operação contra os curdos.
Os EUA tentam chegar a um acordo com a Turquia, mas Ancara não espera muito destas promessas. Talvez porque os EUA tenham manchado sua reputação com a ligação direta ou indireta à tentativa de derrubar presidente turco em 2016.
Deste modo, a Turquia aposta na Rússia e no Irã, nos países cujos interesses coincidem mais com os seus ou, pelo menos, não criam obstáculos. Isso significa que a parceria turco-americana vai continuar fervendo e se vaporizando.