Por que negociações entre Coreias nunca resultarão em reunificação em futuro breve?

© REUTERS / Kim Hong-JiSoldado norte-coreano próximo à fronteira com a Coreia do Sul.
Soldado norte-coreano próximo à fronteira com a Coreia do Sul. - Sputnik Brasil
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Em um avanço inesperado, 2018 começou com uma inédita reaproximação entre as duas Coreias em meio às tensões que marcaram todo o ano passado. A Sputnik explica se o movimento olímpico conseguirá reconciliar os dois vizinhos separados há décadas e analisa se é mesmo possível sua reunificação territorial, econômica e ideológica.

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No campo informativo, a difícil situação na península coreana foi o principal tema de prognósticos e discussões em 2017, com o tom cada vez mais duro das ameaças recíprocas lançadas por Pyongyang e Washington. A Coreia do Sul, por sua vez, se manteve muito mais reservada em declarações, reiterando, porém, sua aliança com os parceiros norte-americanos e se envolvendo em várias manobras militares neste contexto.

Não é de estranhar, assim, que a Casa Branca tenha ficado mais que descontente quando o líder norte-coreano deu o primeiro passo em direção ao povo irmão e começou negociando com ele sem qualquer ajuda ou mediação por parte do mundo ocidental e, mais ainda, Seul o saudou de modo muito positivo.

Mas será que estas conversações são capazes de baralhar mesmo o equilíbrio de forças estabelecido na região?

Aspiração geral dos coreanos

De fato, a reunificação das duas Coreias tem estado presente na agenda política de ambos os países ao longo do todo o período de separação, tendo até sido a razão inicial para o conflito armado entre o Norte e o Sul entre os anos 1950 e 1953.

A coisa é que o país tinha estado sob controle das autoridades japonesas desde 1910, após ser anexado na sequência da guerra do Japão com a Rússia, e até à capitulação japonesa na Segunda Guerra Mundial em 1945.

Já naquela época, a península coreana acabou por virar um dos primeiros exemplos de "guerra local" — ou seja, da confrontação entre as duas superpotências concorrentes, os EUA e a URSS, em algum território neutral com a definição de determinadas zonas controladas e o não uso de armas de destruição maciça.

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Deste modo, em meados do século passado se deu uma confrontação bélica entre o Sul pró-ocidental e o regime comunista do fundador da ideologia juche, Kim Il-sung, no Norte, defensor da unificação do país e apoiado pela União Soviética. Entretanto, estas tentativas deram em nada e resultaram na separação oficial dos dois territórios pelo paralelo38.

Assim, já faz 65 anos que os dois países seguem caminhos diferentes tanto no sentido ideológico quanto econômico, porém, continuam levantando de vez em quando a questão da reintegração. Foi assim na década de 80, quando o governo de Pyongyang avançou com a promoção da respectiva ideia, em 1991, quando os vizinhos celebraram um pacto de cooperação e não agressão, e é assim nos dias de hoje, após uma sequência de retrocessos bem perigosos nas relações bilaterais.

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O primeiro impulso para a reaproximação já foi dado, por mais inconciliável que o parceiro seja retratado pelo Ocidente, pela própria Pyongyang. Em sua mensagem ao povo no Ano Novo, o líder do país, Kim Jong-un, falou sobre o termino bem-sucedido do desenvolvimento nuclear norte-coreano e, para a surpresa de muitos, expressou todo o seu apoio à organização das Olimpíadas de Inverno 2018 na Coreia do Sul, insinuando até o possível envio da sua delegação.

Já após o apelo por parte de Pyongyang, em 3 de janeiro, as duas partes reabriram um canal de comunicação bilateral, o primeiro nos últimos dois anos, e se reuniram para conversações na terça-feira (9) passada, acontecimento que foi entendido como uma grande e inesperada reviravolta na crise em torno da península.

Porém, foi apenas no início de dezembro passado que a ausência dos atletas norte-coreanos no maior evento esportivo da época invernal parecia já estar decidida.

Pyongyang nem tinha submetido a solicitação oficial para participar, o que foi entendido como recusa pelo COI, embora o novo governo sul-coreano, que chegou ao poder após um escândalo de corrupção com a ex-presidente Park Geun-hye, tenha claramente mostrado sua disponibilidade para melhorar as relações com o vizinho e até lhe enviou um coroa de louros como símbolo de aproximação e apelo a aderir ao espírito pacífico das Olimpíadas.

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Então, o que mudou na estratégia da elite norte-coreana que ela decidiu dar o primeiro passo para a reconciliação? Evidentemente, este tem a ver particularmente com a confrontação com Washington e suas tentativas de intervir na situação regional. Se foi assim, deu certo: a Casa Branca, bem como a maioria dos legisladores estadunidenses, nem abafou sua irritação com o fato, declarando que a Coreia do Norte não pode ser um negociador credível enquanto permanecer uma potência nuclear.

Obviamente, tal compostura dos EUA revela que estes estão bem nervosos com a hipótese de perder influência sobre as autoridades sul-coreanas e ficar fora de jogo na península, com as duas partes negociando eficientemente sem qualquer mediação de fora.

Tentativas fracassadas e obstáculos

Na verdade, mesmo a atual reaproximação é apresentada como um avanço sem precedentes para a península da Coreia, não é a primeira vez que o esporte serve de pretexto para negociações bilaterais, contudo, nunca tinha podido influir em algum acordo de larga escala.

Eis apenas alguns dos exemplos: em 1991, Seul e Pyongyang, pela primeira vez na história, enviam uma equipe conjunta para o Mundial de Tênis de Mesa, para o Japão; em 2000 e 2004 os atletas de ambos os países desfilaram juntos durante as cerimônias de abertura e encerramento das Olimpíadas de Verão em Sidney e Atenas, respectivamente. A situação se repetiu em Turim, durante a competição de inverno, e provavelmente pode se repetir em fevereiro do ano corrente.

Entretanto, tudo isto não passou de apenas uns gestos amistosos sem qualquer perspectiva viável para a verdadeira integração. Para a maioria dos especialistas, a melhor coisa que deveríamos esperar seria o melhoramento das relações comerciais e diplomáticas (porém, dificultado por peso das sanções) entre as duas partes. Já a reunificação, sobre a qual muitos logo se lançaram a falar ultimamente, parece uma oportunidade quase improvável, por mais que ela seja proclamada pelos altos responsáveis oficiais.

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A primeira razão para isso é a diferença nas abordagens do assunto por parte de Seul e Pyongyang. Deste modo, para a Coreia do Sul, o cenário mais apoiado seria a chamada "absorção" do seu vizinho do norte, com a consequente instalação das suas ordens econômica e política neste território. Já o país do juche está mais que resoluto em preservar sua soberania ideológica e, caso algum dia se acorde a reintegração, exigiria criar uma confederação das Coreias mantendo sua identidade atual.

No contexto desta perspectiva, surge o segundo grande obstáculo — os custos que tudo isso teria para o governo sul-coreano. Mesmo se este, de algum modo milagroso, pudesse "converter" seu vizinho à sua "fé" ou provocar a queda do seu regime, os cálculos indicam que o preço a pagar pela reunificação com Pyongyang seria quase insuportável, ou seja, vários trilhões de dólares.

Já temos um exemplo parecido na história — isto é, a reintegração da Alemanha no fim da Guerra Fria que acarretou consequências econômicas gravíssimas para a nação, sendo que o leste do país continua atrasado até hoje. Imagina como seria o cenário no caso das Coreias, levando em consideração que a diferença no nível tecnológico entre os países é muitas vezes maior.

Finalmente, o terceiro grande problema é a possível resistência dos outros países. Apesar do que foi declarado a nível oficial, é muito pouco provável que as outras grandes potências, especialmente na região asiática, queiram receber um concorrente de tal peso, juntando as inovações tecnológicas sul-coreanas e o potencial bélico do país do juche. Por isso, neste caso elas evidentemente criariam todo impedimento, a menos que a Coreia do Norte desistisse de seu arsenal militar, o que, verdade seja dita, é 99% impossível enquanto o regime atual governar no país.

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