Pyongyang acredita que os norte-americanos estão pressionando o desarmamento da Coreia do Norte de um modo unilateral e não estão dispostos a fazer concessões. Isso pode permitir a Moscou intervir como mediador.
Kim Jong-un não quer ser deixado de lado
Pyongyang esperava um negócio mais lucrativo: para dar impulso ao desenvolvimento da economia norte-coreana, será necessário uma ajuda séria dos EUA. Nesse aspecto, Kim Jong-un fica em uma situação difícil, os militares reavaliarão se vale a pena desistir do programa nuclear, o que inevitavelmente afetará sua credibilidade.
Desse modo, o Ministério das Relações Exteriores da Coreia do Norte considera que os riscos são enormes.
"Perderemos o interesse nas negociações se a Casa Branca tentar nos jogar para escanteio", avisa.
Contra lobby das armas
Os conselheiros de Donald Trump, especialmente Bolton, torpedearam o acordo conscientemente, disse Dmitry Abzalov, vice-presidente do Centro de Comunicações Estratégicas.
Segundo Abzalov, na administração de Trump tem havido um confronto entre o chefe do Departamento de Estado, Mike Pompeo, que apoia as negociações, e o "falcão" Bolton, cujas declarações tornam a administração problemática.
"O líder norte-americano deve decidir de qual lado ele está, e quais interesses levará em conta – estratégicos a longo prazo ou táticos, mais relacionados a demandas do lobby de defesa", observa Abzalov.
Essa decisão pode influenciar considerações geoestratégicas não necessariamente favoráveis à transação. A reconciliação com a Coreia do Norte é capaz de frustrar a contenção de Pequim – a criação de um sistema de defesa antiaérea na Coreia do Sul e Japão beneficia os Estados Unidos, pois permite o seu uso contra a China. Por isso, Washington quer concessões incondicionais de Pyongyang. Só assim o acordo terá sentido para os norte-americanos.
Sombra de Muammar Kadhafi
"A posição de Washington pode ser descrita assim: primeiramente, vocês abandonam o programa nuclear e depois pensaremos o que podemos lhes propor. A Coreia do Norte precisa de garantias e acredita que, se vender seu programa nuclear, terá que cobrar um preço alto", comenta o especialista.
Segundo ele, Kim Jong-un lembra o destino de Kadhafi e não quer seguir o mesmo caminho.
O especialista lembrou que Pyongyang considera Washington como uma séria ameaça militar.
"As manobras conjuntas dos EUA e Coreia do Sul envolvem mais de 300 mil pessoas. As manobras causam medo e desconfiança entre os norte-coreanos. Os meios de comunicação ocidentais não prestaram atenção a essa questão. Mas se lembram como eles reagiram aos recentes exercícios russos na Bielorrússia, com a participação de um contingente dez vezes menor!", afirma indignado.
Rússia entra em jogo
Se prevalecer o ceticismo em Pyongyang, o discurso sobre a renúncia de armas nucleares não vai cessar, mas os EUA perderão o protagonismo. Nessas circunstâncias, a Rússia poderá atuar como uma mediadora, juntamente com a Coreia do Sul, Japão e China.
"A situação ideal para a Rússia é se a Coreia do Norte concordar com a desnuclearização, não com os norte-americanos, mas com a China, Coreia do Sul e conosco", acredita Abzalov.
Ele enfatizou que a continuação de um confronto moderado seria vantajoso para a Rússia.
"O formato atual das negociações é uma transação particular passando longe de Moscou. Nesta situação, o fracasso diplomático de Trump poderia mudar o cenário", resume o especialista.