Acordo marcante
Em 31 de outubro, o vice-primeiro-ministro russo Yuri Borisov declarou que o contrato de fornecimento dos sistemas de defesa antiaérea S-400 Triumph à Índia foi celebrado na moeda nacional russa. O contrato longamente esperado foi firmado pelo presidente russo, Vladimir Putin, e pelo premiê indiano, Narendra Modi, em 5 de outubro de 2018 e prevê a entrega de cinco conjuntos do sistema russo à Índia. Sem dúvidas, esse é um acordo marcante, tanto do ponto de vista político e militar, como econômico.
Washington expressou reiteradamente sua preocupação com os planos de Nova Deli para comprar os S-400 russos e ameaçou com introdução de sanções em conformidade com a lei CAATSA (Lei de Contenção de Adversários da América Através de Sanções).
Segundo a CAATSA, qualquer terceiro que realize transações importantes com uma empresa sancionada russa (entre elas está a Rosoboronexport, exportadora de equipamentos militares russos) é passível de medidas punitivas. Essas medidas preveem a possibilidade de congelar os ativos dos “violadores”, cancelar a cooperação com suas instituições financeiras, bem como bloquear operações bancárias entre os Estados.
Tendo em consideração que a moeda norte-americana, segundo os dados da SWIFT (Sociedade para Telecomunicações Financeiras Interbancárias Globais), é responsável por 40% dos pagamentos bancários globais, as medidas restritivas dos EUA podem afetar seriamente a economia dos países sancionados por Washington.
Embora o contrato para fornecimento de cinco sistemas S-400 à Índia seja para a Rússia o maior contrato militar celebrado em moeda diferente do dólar, a Rosoboronexport já celebrou vários acordos de exportação de armas em moedas nacionais, sem uso do dólar. Os representantes da empresa declararam que é necessário abandonar a divisa dos EUA nos contratos para exportação de armas.
Desdolarização à russa
Em outubro de 2017, a China, o principal parceiro comercial da Rússia, abriu em Moscou a primeira divisão do seu Banco de Indústria e Comércio para promover transações em yuanes. A entrada do yuan na Rússia não é exclusiva. Moscou já assinou acordos com a Turquia, Irã e Azerbaijão para reduzir o uso do dólar nas transações internacionais.
A Rússia quer também se livrar da dependência do dólar como moeda de reserva. No período entre abril e agosto de 2018, o Banco Central russo vendeu quase todos os seus títulos do Tesouro dos EUA, acelerando a compra de ouro.
Em novembro de 2018 poderá ser introduzida outra rodada de sanções antirrussas dos EUA. Neste caso, as restrições poderão abranger a concessão de créditos a pessoas jurídicas russas, bem como as exportações e importações.
Para defender a economia russa, o presidente do VTB, um dos maiores bancos russos, Andrei Kostin, apresentou seu plano de desdolarização, que inclui, entre outras medidas, a transição ainda mais rápida para outras moedas (euro, yuan e rublo) em operações de importação e exportação.
Processo global
Entretanto, nos últimos anos cada vez mais países discutem o abandono do dólar nas transações internacionais, enquanto a política comercial agressiva do presidente dos EUA Donald Trump tornou o dólar norte-americano menos adequado para pagamentos internacionais.
A China aumentou a participação do yuan na hora de negociar com os principais parceiros comerciais, em particular com a Rússia e o Irã, que se encontram sob sanções norte-americanas. Além disso, em março de 2018 Pequim lançou contratos futuros de petróleo cotados em yuan. O terceiro maior produtor de petróleo da OPEP, o Irã, já vende seu petróleo à China por yuanes. Teerã rejeitou o comércio em dólares depois da saída dos EUA do acordo nuclear iraniano (Plano Conjunto de Ação Integral) e da reintrodução das sanções.
A discussão sobre a criação de uma moeda única dos países do BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul) já é discutida há muito tempo. Os países já concordaram em conceder empréstimos mútuos em moedas nacionais.
De fato, é Washington que através da sua política de sanções está empurrando outros países, como a Rússia, Índia, China, Irã e até os países europeus, para abandonarem o dólar e apostarem em outras moedas.
Os resultados desse processo são evidentes. Em 2015 a moeda dos EUA foi responsável por 44% das transações bancárias realizadas pelo SWIFT. Em 2017, a cota-parte do dólar representou apenas 40%. Parece que em 2018 esse número será ainda menor. O mundo entende que é necessário encontrar uma alternativa ao dólar, independente de Washington, para realizar uma política de acordo com os interesses nacionais de cada país.