"Eu não acho que essa perspectiva nacionalista e de alinhamento com os EUA que pretende Bolsonaro não envolve necessariamente a destruição do Mercosul. Parece-me que, em qualquer caso, vai haver uma discussão renovada do Mercosul. Portanto, a posição da esquerda é alarmista", afirmou a vice-líder Lilia Puig, da Unión Cívica Radical de Argentina, que faz parte da coalizão governista Cambiemos.
Na mesma linha, o deputado uruguaio Pablo Iturralde, do Partido Nacional conservador, disse à Sputnik que quer esperar um pouco para ver as ações de Bolsonaro, e destacou que se o novo presidente brasileiro propõe uma revisão do bloco, algo que pode ser "positivo".
O futuro do Mercosul, bloco fundado em 1991, parece sob controle desde que Bolsonaro, ex-militar de direita que assumirá nesta terça-feira a Presidência do maior país sul-americano do bloco, reclamou da falta de flexibilidade e exigiu negociar seus próprios acordos com países como o Reino Unido.
Além disso, sua futura ministra da Agricultura, Tereza Cristina da Costa Dias, alertou que o Brasil poderia deixar o grupo, se não este foi submetido a uma revisão completa.
'Exagero da esquerda'
Tanto Puig como Iturralde apontaram que a esquerda sul-americana exagera quando afirma que Bolsonaro colocaria em risco o futuro do Mercosul.
"A forma como reagiu a esquerda é como ela sempre faz: exagerando. Eles fizeram um tremendo barulho quando Mauricio Macri ganhou na Argentina, e a verdade é que desde que está no governo as relações entre Argentina e Uruguai melhoraram. Além disso, eles estavam apaixonados pela (ex-presidente) Cristina Fernández (2007-2015) e suas mentiras, e a mesma coisa aconteceu com o Paraguai", avaliou Iturralde.
Além disso, ambos os deputados consideraram que "o Brasil é mais do que Bolsonaro" porque as estratégias nacionais não são o resultado de um jogo ou de um indivíduo. Por isso, é necessário aguardar para ver as ações realizadas pelo novo governo antes de emitir opinião.
"O Brasil sempre teve um mais ou menos uma mesma política econômica. Além de mudanças no governo, temos de esperar para ver o que importa e não são as declarações, mas ações que venha tomar a chancelaria. A primeira medida é ser cauteloso", considerou Iturralde.
Flexibilidade
A Sputnik também consultou o analista uruguaio Diego Escuder, professor de Relações Internacionais na Universidade da República, que disse que era difícil prever o que pode acontecer no Mercosul com a posse de Bolsonaro, embora considere positivos os seus sinais em busca de uma flexibilização.
"O que é que pode acontecer com a posse de Bolsonaro? É muito difícil de interpretar. A única coisa positiva sobre isso é que alguns sinais sobre uma flexibilização do Mercosul, o que significa que o bloco não permanece prisioneiro de uma tarifa externa que o impede de sair para o mundo, ou que seus membros não possam fazer acordos bilaterais com outros Estados", analisou.
Segundo o especialista, o Brasil poderia propor uma revisão do bloco, o que para ele não seria uma coisa ruim, porque o Mercosul enfrenta hoje um contexto muito diferente da época de sua fundação, em 1991.
"As metas que foram levantadas na época não foram alcançadas nestes quase 30 anos, por isso temos de ver se elas devem se manter as mesmas. É se isso for contra a região? Para nada, os nossos vizinhos são importantes, mas não necessariamente os objetivos do Mercosul devem permanecer os mesmos", comentou.
Escuder acrescentou que, talvez, "a posição de Bolsonaro não é contra a integração, mas propor uma inserção realista".
O especialista opinou que o bloco "está em crise há muito tempo", porque nunca conseguiu canalizar os objetivos originalmente incorporados em seu tratado constitutivo.
"Temos de fazer um balanço: o Mercosul não foi o que nos encheu de esperança, nós não abrimos mercados, mas agora isso tem sido um fardo que temos teve de superar. Não é uma questão de deixarmos o Mercosul, mas sim de buscar uma maneira que o bloco nos sirva, e isso não é uma mera declaração", refletiu.
O Mercosul é composto por Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai, com a Venezuela suspensa e a Bolívia em processo de adesão plena.