A bancada feminina sai das eleições reforçada e fazendo história. O Parlamento português conta agora com 86 deputadas, 10 a mais do que o número atual, e pela primeira vez há mulheres negras. Ao todo, três afrodescendentes foram eleitas. Uma delas, a bióloga e professora Joacine Katar, garante a estreia do partido Livre na Assembleia da República.
A nova deputada ressalta que não está disposta a formar coligações para os próximos quatro anos de governo, mas afirma que o diálogo está aberto e não descarta apoio em futuras decisões.
Criado há dois anos, o Livre se define como a "esquerda verde europeia". Uma das apostas do partido é garantir mais direitos para os imigrantes, principalmente no que diz respeito à obtenção da nacionalidade. Atualmente, filhos de imigrantes que nascem no país só se tornam portugueses se um dos pais já mora em Portugal legalmente há pelo menos cinco anos.
"Há uma alteração necessária à legislação sobre a nacionalidade, que nós não apoiamos enquanto medida unicamente legislativa, mas enquanto uma medida de justiça social. Quem nasce em Portugal não pode ser penalizado por causa da situação do seu pai ou da sua mãe. Quem nasce em Portugal precisa ser imediatamente cidadão nacional", afirmou Joacine Katar em resposta à Sputnik Brasil durante coletiva de imprensa ao final da reunião.
Primeiro nacionalista conservador
Quem também estreia na nova legislatura é o partido Chega, criado há apenas seis meses. Com a eleição de André Ventura, o partido consegue ser o primeiro nacionalista conservador a ocupar uma cadeira no Parlamento na história democrática de Portugal.
O novo deputado afirma enxergar perigo no que considera ser o "avanço da extrema-esquerda" no país. André Ventura diz que vai manter uma oposição firme ao Partido Socialista, do atual primeiro-ministro António Costa, que deverá continuar no cargo, mas não descarta apoio pontual quando considerar que a pauta seja positiva para o povo português.
O Chega pretende apresentar propostas de "defesa da democracia" através do resgate de valores da "família natural, baseada sobre a íntima relação de um homem e de uma mulher", de combate à corrupção e privatização de entidades governamentais, como universidades e institutos politécnicos. As pautas convergem com a política do atual presidente do Brasil, mas André Ventura não reconhece a proximidade entre o partido e o PSL de Jair Bolsonaro.
"O Chega é um partido que é essencialmente enraizado na tradição portuguesa. Não excluímos nenhuma força política, estamos em contato com várias forças internacionais. É verdade que temos membros do PSL que nos transmitiram felicitações, mas nada mais do que isso para já. Estamos abertos ao contato, à negociação. Nada temos contra o presidente Bolsonaro, é o presidente eleito dos brasileiros, nós respeitamos isso, mas o nosso trabalho é muito diferente", declarou em resposta à Sputnik Brasil.
Primeiro assento liberal
Outro partido que elege o primeiro deputado é a Iniciativa Liberal, que celebra o resultado alcançado logo na primeira eleição disputada. O eleito, João Cotrim de Figueiredo, foi acompanhado pelo presidente e porta-voz da sigla à reunião com Marcelo Rebelo de Sousa.
A Iniciativa Liberal propõe que a elaboração dos orçamentos de Estado passe a ser feita sem levar em conta receitas e despesas dos anos anteriores. Além disso, quer implantar o salário mínimo municipal no lugar do nacional, por considerar que os ganhos dos trabalhadores precisam ser adequados às realidades locais.
A Iniciativa Liberal também se afirma como oposição. "Nós não iremos apoiar esse governo", afirmou o presidente do partido, Carlos Guimarães Pinto, à saída da reunião.
Mais ecologistas
O partido Pessoas-Animais-Natureza (PAN), que tem apenas um deputado atualmente, conseguiu eleger mais três parlamentares.
O PAN faz parte da atual coligação com o Partido Socialista, apelidada de "geringonça", mas descarta repetir a formalização de um acordo fechado para os próximos quatro anos.
"Nós tivemos uma subida considerável, um resultado forte, isso dá-nos maior responsabilidade. Vamos continuar de forma madura a aprofundar mais temas. Queremos contribuir para a estabilidade governativa, mantendo o relacionamento que temos tido com o Partido Socialista e com outros partidos e estamos disponíveis para fazermos acordos pontuais", declarou o presidente da sigla, André Silva.
Outro representante do meio ambiente, o Partido Ecologista Os Verdes (PEV) manteve dois deputados eleitos. A sigla, assim como o PAN, não pretende repetir o acordo formal com o PS, embora se mantenha aberta ao diálogo.
O partido garante que vai continuar seguindo a agenda ambiental internacional, na qual "a Amazônia tem um papel absolutamente central".
"Nos compromissos que assumimos, queremos que Portugal promova a adoção de um plano efetivo de adaptação às alterações climáticas", disse José Luís Ferreira, deputado reeleito, em resposta à Sputnik Brasil ao fim do encontro com o presidente.
Formação de governo
Portugal é governado por um sistema semipresidencialista, no qual o presidente da República divide funções do Poder Executivo com o primeiro-ministro. As reuniões entre Marcelo Rebelo de Sousa e os representantes dos eleitos fazem parte do processo para nomeação do premiê. Depois de ouvir todos os partidos, Marcelo Rebelo de Sousa deverá confirmar António Costa no Cargo por mais quatro anos.
O PS foi o vencedor das eleições do último domingo, com mais de 36% dos votos, garantindo 106 assentos no parlamento. Ainda assim, como o número não representa a maioria absoluta dos 230 deputados, o partido vai conversar com outras siglas para garantir apoio e aprovar seu plano de governo.
Atualmente, a aliança do PS, a chamada "geringonça" conta com Bloco de Esquerda, Partido Comunista Português, PAN e PEV. António Costa já marcou reuniões com diversos partidos para esta quarta-feira (9).