Para o economista-chefe da Infinity Asset Manegement (empresa gestora de recursos financeiros), Jason Vieira, a crise atual é de saúde com consequências macroeconômicas, se contrapondo à crise de fundamentos macroeconômicos que varreu o mundo em 2008.
Ao olhar para o cenário de curto prazo no Brasil, Vieira avaliou que o cenário hoje é de "um freio de mão muito puxado em termos econômicos", e que setores que não têm condições de fazer estoque no âmbito da economia tendem a sofrer mais com o avanço do coronavírus.
"[Vai afetar] quem não tem condições de se ajustar a uma parada do setor industrial, que venha a sofrer de maneira bastante extremada ao que venha acontecer em um eventual shutdown voluntário de todo o sistema econômico. Ou seja, o setor de serviços tem uma sensibilidade muito grande e todo serviço não prestado é serviço não recebido e ele não tem como reverter aquele serviço perdido", afirmou à Sputnik Brasil.
O surto do novo coronavírus teve início no fim do ano passado na China, principal parceiro comercial do Brasil. Mas os impactos e papéis de cada um dos países ao longo de 2020, com a pandemia se consolidando na Europa e desembarcando com maior intensidade nas Américas, serão distintos, na opinião do economista ouvido pela Sputnik Brasil.
"Temos a necessidade também de observar que não vai haver como não sofrer os efeitos do coronavírus, é natural que aconteça dado que já estamos no processo de infecção marginal, ou seja, já é infecção interna de pessoas sendo infectadas no Brasil, e nesse sentido a atenção vai acabar se voltando a um processo de parada que nós vamos ter em diversas empresas, home office, e isso tudo vai acabar por afetar o comércio e [o setor de] serviços", comentou.
"Eis um ponto extremamente relevante. Então a atenção tem que se voltar muito a esse processo no curto prazo [...] como aconteceu com a China em um passado recente, a China está em um processo de conclusão do seu problema com o coronavírus, mas o restante do mundo na verdade não está passando por isso de maneira uníssona. Você tem um problema que começou na China, se espalhou para a Europa, está avançando para as Américas e está seguindo essa ordem. Vai melhorar na Ásia e na China, depois vai aumentar e piorar na Europa, e vai começar nas Américas. Vamos ter que observar ainda a piora da situação na Europa, depois o avanço aqui nas Américas e a China saindo. Ou seja, não vamos entrar e nem sair juntos da crise, como ocorreu em 2008, e esse talvez seja um dos maiores problemas de curto prazo", acrescentou.
Volatilidade e incertezas internas
As medidas tomadas por governos estaduais no fim desta semana, com recomendações para maior higiene das mãos e para que se evitem aglomerações, apresentam um cenário considerado incerto até mesmo por especialistas de saúde. No âmbito da economia, também é difícil fazer previsões neste momento, como quanto ao saldo comercial brasileiro.
"Nesse cenário nós podemos até ter uma melhora no saldo comercial, mas não se sabe de quanto. Diminuição das importações e melhora das exportações em alguma coisa, mas nada muito significativo porque a China vai ser muito demandante, certamente isso deve acontecer e há de se imaginar a relevância da China como demandante no curto prazo, mas também a queda das importações por conta da questão de custos. Nesse sentido podemos ver uma melhora no saldo comercial, mas não exatamente da qualidade da nossa balança", arriscou Vieira.
Sobre as oscilações do mercado nacional e internacional, o economista da Infinity Asset Manegement pontuou que a alta volatilidade do dólar torna difícil prever qual será o rumo dos mercados nos próximos dias. De acordo com ele, o foco deve ser buscar uma redução da volatilidade, sem extremismos para altas ou para quedas acachapantes.
"De qualquer mercado, e o de câmbio é dos piores nesse sentido. Ou seja, se o mercado normal já é um mercado muito complicado de se prever, o mercado de câmbio que sempre foi um mercado muito difícil agora está pior ainda", complementou.
Ainda falando sobre mercado financeiro, Vieira deu algumas orientações que podem interessar tanto quem não integra a bolsa de valores quanto aqueles que são altamente presentes no mercado diariamente.
"Enquanto você não tirar o dinheiro do mercado, você não perdeu dinheiro. É importante aguardar de uma tal maneira que não se assuste com o atual cenário, se já não se acautelou, se esse é o grande problema. Se não se tomou as cautelas certas no momento certo, este é infelizmente o momento errado e aí uma decisão agora pode ser desastrosa para o resultado dos investimentos", explicou.
E não é só.
"Quem tem caixa é o momento [...] existem muitas ofertas interessantes no mercado que têm que ser por um prazo longo, não é no curto prazo. Quem tem dinheiro e ações, tentar melhorar o seu preço médio, quem está fora do mercado tentar conseguir alguma coisa, agora se você já está no mercado, muita paciência", concluiu.