https://noticiabrasil.net.br/20211228/da-diplomacia-virtual-ao-nacionalismo-economico-como-politica-e-economia-foram-geridas-em-2021-20834234.html
Da diplomacia virtual ao nacionalismo econômico: como política e economia foram geridas em 2021?
Da diplomacia virtual ao nacionalismo econômico: como política e economia foram geridas em 2021?
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A Sputnik Brasil destaca os principais fatos ocorridos neste ano em uma restrospectiva que analisa como foi conduzida a diplomacia mundial e em que patamar se... 28.12.2021, Sputnik Brasil
2021-12-28T14:10-0300
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2022-04-07T16:47-0300
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Em 2020 vivemos duras restrições que impediram o avanço de negociações, acordos e interação entre países de forma mais ampla por conta do auge da COVID-19. Em 2021, esses movimentos começaram a voltar ao normal, mas de forma ainda vagarosa.A solução encontrada pela diplomacia internacional foi a utilização da comunicação virtual na realização de cúpulas, reuniões e na manutenção de diálogos. Grandes líderes optaram pelo formato de videoconferência para se comunicarem entre si, como o encontro entre Joe Biden e Vladimir Putin no dia 7 de dezembro.Já no campo econômico, a recuperação está acontecendo, mas de forma desigual. O crescimento é evidenciado em países centrais, porém, a maioria dos países emergentes ou em desenvolvimento estão ficando para trás. Nos países de baixa renda, os efeitos da pandemia estão revertendo os avanços anteriores de redução da pobreza, e agravando a insegurança alimentar e outros desafios de longa data.A Sputnik Brasil destaca os principais fatos ocorridos em 2021 analisando como os governos de diferentes nações se intercomunicaram neste ano e como está o cenário econômico, o qual ainda engatinha após o choque proporcionado pela pandemia.Diplomacia executada no campo virtualPara Guilherme Casarões, cientista político e professor de Relações Internacionais da FGV, houve um esforço ao longo do ano para tentar normalizar certos aspectos da diplomacia, principalmente na chancelaria ligada à promoção de cúpulas presenciais entre chefes de Estado, como a do G20 ocorrida na Itália, no final de outubro.Entretanto, o cientista político ressalta dois entraves que persistem no mundo virtual quando se trata de relações internacionais, especialmente no âmbito das negociações.O primeiro, é a necessidade do "olho no olho", uma vez que "existe todo um ritual diplomático como conversa nos bastidores, negociações paralelas, construção da confiança, que só acontece quando conhecemos as pessoas, e isso a plataforma virtual não proporciona".O outro ponto seria "o simbolismo cerimonial das grandes reuniões diplomáticas", já que em encontros via web, não há "aquela foto marcante entre líderes, as fotos de divulgação são prints de tela, por exemplo"."A Cúpula pela Democracia promovida por Joe Biden, apesar de acontecer, acaba recebendo menos destaque da imprensa por ser virtual. [...] De certa forma, essa dimensão simbólica, crucial para diplomacia, acabou se perdendo por conta da distância", explica.Já para Daniela Alves, diretora do Centro de Estratégia, Inteligência e Relações Internacionais (CEIRI), o virtual permitiu à diplomacia mundial não parar, e até mesmo "acelerar dentro de alguns aspectos", como o "desenvolvimento de novos formatos de briefing para ressaltar a importância de determinados assuntos e ajudar na adoção da tecnologia de realidade virtual".Em sua interpretação, a produtividade também foi expandida através desse novo padrão, já que "os diplomatas tiveram a oportunidade de interagir com mais pessoas e gastaram menos tempo em deslocamentos ou com grandes formalidades".Contudo, Casarões e Alves concordam que o encontro presencial ainda é essencial para diplomacia."O contato presencial continua sendo importante para construção dos relacionamentos, porque a diplomacia, basicamente, é isso: relacionamento e edificação da confiança. [...] Podemos então concluir que a tendência será a adoção do formato híbrido, permtindo maior agilidade e direcionando os recursos de forma mais eficiente e moderna", complementa Alves.Tendência multilateral para 2022Na visão de Casarões, 2021 foi um ano mais propício para diplomacia multilateral do que 2020.A começar pela chegada de Joe Biden à presidência dos EUA. Sua administração tem demonstrado que preza por uma proposta de política externa mais baseada no diálogo, a qual prioriza a cooperação, diferente da gestão anterior, de Donald Trump.Alves também corrobora com o ponto de vista de Casarões, uma vez que o governo Biden chegou com a expectativa de "que a diplomacia substituiria o poder militar como instrumento preferencial de política externa dos EUA".Outro ponto dentro do multilateralismo levantado por Casarões foi a definição final do Brexit. As negociações, que duraram de 2016 a 2020, geraram "um desgaste diplomático, visto que muitos dos processos negociadores nos planos da alta cúpula dos países acabaram sendo atrasados pela energia gasta na discussão de desincompatibilização do Reino Unido da União Europeia [UE]"."Hoje, há uma definição sobre o lugar que o Reino Unido ocupa, seja no contexto da UE, no G7 ou no G20 [...] e isso ajuda na reconstrução de uma agenda multilateral mais ampla, porque agora está todo mundo focado em problemas maiores", diz o cientista político.Porém, para Alves, ainda é necessário um tempo para que se possa dizer que a saída do Reino Unido do bloco europeu foi um "divisor de águas da política externa".Casarões acredita que "levando em consideração os dois exemplos citados [dos EUA e do Reino Unido] podemos pensar que 2022 vai ser um mundo tendencialmente mais propenso à cooperação e ao diálogo multilateral".Já Alves considera que o "mundo esperava ações mais sincronizadas", mas que "respostas unilaterais acabaram desafiando a ideia de diplomacia multilateral, levando a uma falta de confiança neste tipo de chancelaria"."O impacto pode ser visto pelo atual estado das organizações multilaterais que agravaram o declínio dessa diplomacia. A OMS fez com que o mundo acabasse questionando os seus métodos por conta de tudo o que aconteceu, tudo falhou [na pandemia]. O multilateralismo é uma necessidade para recuperação global [...], e o seu renascimento durante a pandemia seria também um renascimento de valores, mas nós não vislumbramos mudanças concretas nesse sentido", afirma a diretora.Ainda de acordo com Alves, uma dinâmica que deixa bastante comprovado o declínio de políticas multilaterais é a convivência diplomática sul-americana, que aponta cada vez mais para "uma falta de capacidade em evoluir os instrumentos de cooperação e um posicionamento mínimo comum perante o cenário internacional, revelando uma fragmentação e preferência a relações bilaterais e pontuais".Integração diplomática na América do SulSegundo Casarões, a integração sul-americana está estacionada, "não avançou e nem retrocedeu". Mesmo assim, estaríamos em um contexto diferente do apresentado pela diplomacia brasileira entre 2019 e 2020, com Ernesto Araújo na condução da pasta.Sua gestão deixou claro que o Brasil estava "abertamente se opondo aos esforços de integração em dois níveis. Um deles, tem a ver com a crise na Venezuela".O segundo nível tem relação com a chega de Alberto Fernández presidência da Argentina, "visto que Fernández é de esquerda, apoiou o ex-presidente Lula na época que estava preso e isso acabou azedando as relações bilaterais""O governo Bolsonaro tem essa marca absolutamente atípica de tomar partido mesmo em processos eleitorais de países vizinhos e amigos. Ele agiu assim com os EUA, Argentina, Israel e isso acaba prejudicando muito o relacionamento, porque, afinal de contas, como podemos esperar que um presidente eleito – como no caso da Argentina – possa se dar bem com um presidente que fez campanha declarada para seu adversário?", indaga Casarões.A escolha do governo brasileiro de expressar sua "torcida" eleitoral enfraquece o Mercosul, um bloco importante para integração sul-americana, que tem como principais países Brasil e Argentina.Porém, Casarões também destaca que a crise sanitária provocada pela COVID-19 dificulta uma possível revitalização total das relações, dado que "não dá para esperar muitos avanços em uma agenda de liberalização comercial, ou na concretização do acordo Mercosul-União Europeia porque existe uma prioridade imediata para qualquer país que é o encaminhamento da economia no pós-coronavírus"."No entanto, pensando no caso brasileiro, de um governo que prometeu desintegrar a região, só de não haver retrocesso, já estamos no lucro", pondera o cientista.Política externa brasileiraCasarões diz que a troca na administração norte-americana impactou a política externa brasileira, uma vez que o "presidente Jair Bolsonaro tinha laços pessoais com o ex-presidente Trump, e agora com Biden, a relação se dá em uma esfera mais institucional, mais distante"."A agenda pessoal do Bolsonaro não tem repercussão nesse atual governo, então não tem como esperar grandes cooperações bilaterais", comenta.Após a saída de Ernesto Araújo do Itamaraty, veio o chanceler Carlos França, o qual, até o momento, não tem contas nas redes sociais, e isso já indicaria "uma postura muito diferente em relação à chamada 'diplomacia pública', ou seja, ele não usa canais não oficiais para se pronunciar e o Itamaraty vem tendo um perfil baixo no que se refere a negociações, conquistas e acordos", afirma Casarões.Além de Araújo, que causou polêmica durante sua gestão pelas declarações hostis que fazia a certos países, outra figura que "desapareceu" e contribuiu para uma diplomacia brasileira menos agressiva foi o assessor internacional Felipe Martins, o qual "passou um bom tempo quase que como um chanceler paralelo na chefia de Araújo", segundo Casarões.Vulnerabilidade de governos ante ataques hackersAinda no campo virtual, 2021 também foi marcante pela grande quantidade de ataques cibernéticos a instituições públicas e empresas privadas.Este ano se consolidou como um ano recorde para violações de dados. De acordo com a pesquisa do Centro de Recursos de Roubo de Identidade (ITRC, na sigla em inglês), o número total de violações de dados até 30 de setembro de 2021 já excedeu o número total de eventos em 2020 em 17%, segundo a Security Magazine.Em maio, o ataque hacker à maior operadora de oleoduto dos EUA, a Colonial Pipeline, fez o governo norte-americano declarar estado de emergência no país. Em outubro, um ataque cibernético a postos de gasolina no Irã bloqueou a distribuição de combustível.No Brasil, agora no começo de dezembro, hackers invadiram o site do Ministério da Saúde e apagaram todos os dados sobre a campanha de vacinação nacional. Em seguida, a Câmara Municipal do Rio de Janeiro também foi alvo. O Brasil foi o 5º país que mais sofreu ataques cibernéticos em 2021, segundo a IstoÉ Dinheiro.De acordo com Marcelo Branquinho, CEO da TI Safe, no caso brasileiro, "o sistema está exposto"."Sites do governo são muito vulneráveis. Isso acontece porque essas políticas de segurança não têm investimento, e tampouco a conscientização de alguns funcionários. Não são hackers, são grupos organizados criminosos. Eles sabem fazer o ataque e esperam receber dinheiro em troca dos dados sequestrados", explicou.Avanços em 2021 e progressões para 2022Na opinião de Alves, um dos destaques deste ano foi a COP26, a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2021, ocorrida de 31 de outubro a 12 de novembro.Em 2022, Alves gostaria de testemunhar maiores "debates e definições estratégicas para uma reforma nas organizações internacionais, a fim de torná-las menos burocráticas e mais eficientes para atingir seus objetivos, principalmente com a pandemia. Estas definições devem ser a grande pauta internacional para fomentar uma recuperação global".Para Casarões, o progresso em 2021 ocorreu no que diz respeito às questões tecnológicas, científicas e em relação às vacinas.A pandemia "teve como um dos seus resultados essa possibilidade de cooperação científica-tecnológica entre diversos órgãos", todavia, "houve alguns pontos cegos, e o mais complicado deles foi a distribuição de vacinas para países em desenvolvimento".Diante deste cenário, Casarões espera que em 2022 "aconteça uma universalização do acesso às vacinas por países mais pobres".Economia ainda engatinhaO impacto da pandemia na economia global foi devastador em 2020. No Brasil, o setor econômico teve sua maior queda em 30 anos no ano passado, sofrendo uma baixa de 4,1% no PIB em relação a 2019, segundo o jornal Nexo.Em 2021, a economia começa a engatinhar. Com as campanhas de vacinação, o vírus perde um pouco de sua força e permite que restrições fiquem mais afrouxadas, fazendo o dinheiro girar com mais facilidade.Segundo Bruno Martarello De Conti, professor do Instituto de Economia da Unicamp, houve recuperação econômica sim em 2021, uma vez que "2020 foi tão ruim, que qualquer crescimento já significa uma melhora".Outra conjuntura que contribui para desigualdade, é o fato de, além da China, outras nações como EUA, Alemanha, terem utilizado políticas públicas de recuperação."Esses países fizeram políticas pesadas – no bom sentido – de contenção da crise com assistência social, renda mínima, etc, mas também de investimento. O maior exemplo é o plano trilionário de Joe Biden, o qual é focado em medidas até de longo prazo. Esses países têm uma maior liberdade de política econômica, enquanto os periféricos ficam mais constrangidos", explica o especialista.Apesar da economia estar engatinhando lentamente, ainda assim, uma progressão é vislumbrada. Em contraste, o desemprego continua com taxas preocupantes, e não acompanha a evolução econômica.De Conti diz que, em parte, isso acontece por algumas mudanças que vieram para ficar, como "o uso das tecnologias de informação e comunicação que enxugam mais empregos", assim como as "expectativas incertas em relação ao futuro"."Com a pandemia, há uma incerteza grande e os empresários não querem contratar neste contexto. [...] Há também uma questão de desorganização das cadeias globais de valor. A indústria automobilística, por exemplo, ainda patina por falta de componentes como os semicondutores, essa desorganização que acontece com os bens intermediários também impede a geração de novos empregos", explica o analista.Para 2022, na avaliação do professor, pior do que um provável alto índice inflacionário, o aumento da pobreza, da miséria e da fome são os piores vilões que podem assombrar os países mais necessitados no ano que vem."No caso do Brasil, saiu uma pesquisa informando que 45% da população pode enfrentar algum grau de vulnerabilidade alimentar [...]. A tragédia do ano que vem pode ser essa, a fome."Nacionalismo econômico2021 foi um ano de um nacionalismo econômico exacerbado, segundo De Conti. "Essa característica foi muito reveladora, uma vez que a pandemia prejudicou todo o planeta e um certo tipo de solidariedade seria o comportamento mais esperado."Por outro lado, De Conti lembra que o capital "é extroversivo por definição" e busca melhores oportunidades se expandindo geograficamente para encontrar preços mais acessíveis de matérias-primas, assim como maior mercado consumidor, em um movimento "que se convencionou ser chamado de globalização, mas que na minha opinião, não é um fenômeno recente, ele é intrínseco ao capitalismo"."Essa será uma tensão permanente porque o nacionalismo vai continuar enquanto houver crise. Podemos constatar isso nos EUA, por exemplo. O Biden só é menos tosco que o Trump, mas também é ultranacionalista, atuando fortemente para volta dos EUA como líderes mundiais. Promoveu esse encontro pretensamente pela democracia, que é um dos teatros mais horrorosos que já foram feitos, por exemplo. A postura dele em relação à China também evidencia isso."Economia operando dentro de metas ambientaisO professor acredita que, de fato, este ano proporcionou uma discussão mais ampla e efetiva em torno das questões ambientais, no entanto, o debate ainda acontece em um plano superficial, e o capital, como busca o maior tipo de valorização viável, é contrário às necessidades ecológicas."Não acho possível um capitalismo ecológico, os problemas passam também pela superação do sistema. Há avanços sim, mas não o suficiente para combater a agressão ao meio ambiente."Se não for controlada, as mudanças climáticas podem levar até 132 milhões de pessoas à pobreza extrema até 2030, de acordo com estimativas do Banco Mundial.A pobreza já está associada à vulnerabilidade relacionadas ao clima, como enchentes e doenças transmitidas por vetores, tornando as mudanças climáticas um grande desafio mundial e um obstáculo para o alívio da pobreza extrema.
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diplomacia, américa do sul, eua, política externa, economia, exclusiva, meio ambiente, brasil, venezuela, chancelaria, covid-19, ômicron
Em 2020 vivemos duras restrições que impediram o avanço de negociações, acordos e interação entre países de forma mais ampla por conta do auge da COVID-19. Em 2021, esses movimentos começaram a voltar ao normal, mas de forma ainda vagarosa.
A solução encontrada pela diplomacia internacional foi a utilização da comunicação virtual na realização de cúpulas, reuniões e na manutenção de diálogos.
Grandes líderes optaram pelo formato de videoconferência para se comunicarem entre si, como o encontro
entre Joe Biden e Vladimir Putin no dia 7 de dezembro.
Já no campo econômico, a recuperação está acontecendo, mas de forma desigual. O crescimento é evidenciado em países centrais, porém, a maioria dos países emergentes ou em
desenvolvimento estão ficando para trás.
Nos países de baixa renda, os efeitos da pandemia estão revertendo os avanços anteriores de redução da pobreza, e agravando a insegurança alimentar e outros desafios de longa data.
A Sputnik Brasil destaca os principais fatos ocorridos em 2021 analisando como os governos de diferentes nações se intercomunicaram neste ano e como está o cenário econômico, o qual ainda engatinha após o choque proporcionado pela pandemia.
Diplomacia executada no campo virtual
Para
Guilherme Casarões, cientista político e professor de Relações Internacionais da FGV, houve um esforço ao longo do ano para tentar normalizar certos aspectos da diplomacia, principalmente na chancelaria ligada à promoção de cúpulas presenciais entre chefes de Estado,
como a do G20 ocorrida na Itália, no final de outubro.
"Apesar de termos descoberto grande potencialidade nas reuniões virtuais, é uma questão de tempo para diplomacia voltar a ser executada presencialmente."
Entretanto, o cientista político ressalta dois entraves que persistem no mundo virtual quando se trata de relações internacionais, especialmente no âmbito das negociações.
O primeiro, é a necessidade do "olho no olho", uma vez que "existe todo um ritual diplomático como conversa nos bastidores, negociações paralelas, construção da confiança, que só acontece quando conhecemos as pessoas, e isso a plataforma virtual não proporciona".
O outro ponto seria "o simbolismo cerimonial das grandes reuniões diplomáticas", já que em encontros via web, não há "
aquela foto marcante entre líderes, as fotos de divulgação são prints de tela, por exemplo".
"A
Cúpula pela Democracia promovida por Joe Biden, apesar de acontecer, acaba recebendo menos destaque da imprensa por ser virtual. [...] De certa forma, essa dimensão simbólica, crucial para diplomacia, acabou se perdendo por conta da distância", explica.
Já para Daniela Alves, diretora do Centro de Estratégia, Inteligência e Relações Internacionais (CEIRI), o virtual permitiu à diplomacia mundial não parar, e até mesmo "acelerar dentro de alguns aspectos", como o "desenvolvimento de novos formatos de briefing para ressaltar a importância de determinados assuntos e ajudar na adoção da tecnologia de realidade virtual".
Em sua interpretação, a produtividade também foi expandida através desse novo padrão, já que "os diplomatas tiveram a oportunidade de interagir com mais pessoas e
gastaram menos tempo em deslocamentos ou com grandes formalidades".
Contudo, Casarões e Alves concordam que o encontro presencial ainda é essencial para diplomacia.
"O contato presencial continua sendo importante para construção dos relacionamentos, porque a diplomacia, basicamente, é isso: relacionamento e edificação da confiança. [...] Podemos então concluir que a tendência será a adoção do formato híbrido, permtindo maior agilidade e direcionando os recursos de forma mais eficiente e moderna", complementa Alves.
Tendência multilateral para 2022
Na visão de Casarões, 2021 foi um ano mais propício para diplomacia multilateral do que 2020.
A começar pela chegada de Joe Biden à presidência dos EUA. Sua administração tem demonstrado que preza por uma proposta de política externa mais baseada no diálogo, a qual prioriza a cooperação,
diferente da gestão anterior, de Donald Trump.
Alves também corrobora com o ponto de vista de Casarões, uma vez que o governo Biden chegou com a expectativa de "que a diplomacia substituiria o poder militar como instrumento preferencial de política externa dos EUA".
"No entanto, para uma gestão que pretendia reforçar o aspecto diplomático, a equipe de Biden está demorando para realizar o processo de preenchimento de cargos diplomáticos bem importantes. Ainda existe uma lacuna entre as aspirações do governo e a dificuldade de conduzir uma política externa bem-sucedida, pelo menos neste primeiro ano de administração", diz a diretora.
Outro ponto dentro do multilateralismo levantado por Casarões
foi a definição final do Brexit. As negociações, que duraram de 2016 a 2020, geraram "um desgaste diplomático, visto que muitos dos processos negociadores nos planos da alta cúpula dos países acabaram sendo atrasados pela energia gasta na discussão de desincompatibilização do Reino Unido da União Europeia [UE]".
"Hoje, há uma definição sobre o lugar que o Reino Unido ocupa, seja no contexto da UE, no G7 ou no G20 [...] e isso ajuda na reconstrução de uma agenda multilateral mais ampla, porque agora está todo mundo focado em problemas maiores", diz o cientista político.
Porém, para Alves, ainda é necessário um tempo para que se possa dizer que a saída do Reino Unido do bloco europeu foi um "divisor de águas da política externa".
"Assim como o Reino Unido levou décadas para ver os benefícios da adesão à UE, a gente ainda vai discutir por muitos anos os impactos econômicos e políticos desta inciativa, então, não temos ainda como fechar, neste momento, um balanço sobre sua postura externa."
Casarões acredita que "levando em consideração os dois exemplos citados [dos EUA e do Reino Unido] podemos pensar que 2022 vai ser um mundo tendencialmente mais propenso à cooperação e ao diálogo multilateral".
Já Alves considera que o "mundo esperava ações mais sincronizadas", mas que "respostas unilaterais acabaram desafiando a ideia de diplomacia multilateral, levando a uma falta de confiança neste tipo de chancelaria".
"O impacto pode ser visto pelo atual estado das organizações multilaterais que agravaram o declínio dessa diplomacia. A OMS fez com que o mundo acabasse
questionando os seus métodos por conta de tudo o que aconteceu, tudo falhou [na pandemia]. O multilateralismo é uma necessidade para recuperação global [...], e o seu renascimento durante a pandemia seria também um renascimento de valores, mas nós não vislumbramos mudanças concretas nesse sentido", afirma a diretora.
Ainda de acordo com Alves, uma dinâmica que deixa bastante comprovado o declínio de políticas multilaterais é a convivência diplomática sul-americana, que aponta cada vez mais para "uma falta de capacidade em evoluir os instrumentos de cooperação e um posicionamento mínimo comum perante o cenário internacional, revelando uma fragmentação e preferência a relações bilaterais e pontuais".
Integração diplomática na América do Sul
Segundo Casarões, a integração sul-americana está estacionada, "não avançou e nem retrocedeu". Mesmo assim, estaríamos em um contexto diferente do apresentado pela diplomacia brasileira entre 2019 e 2020, com Ernesto Araújo na condução da pasta.
Sua gestão deixou claro que o Brasil estava "abertamente
se opondo aos esforços de integração em dois níveis. Um deles, tem a ver com a crise na Venezuela".
"O Brasil historicamente foi um país neutro, construtor de pontes, promotor do diálogo, inclusive entre partes politicamente opostas, mas acabou tomando um lado na crise venezuelana. E essa tomada de lado, com apoio declarado a Juan Guaidó em 2019, dificultou o lugar do Brasil. Com essa ação, acabamos contribuindo para um certo desmantelamento da unidade sul-americana."
O segundo nível tem relação com a chega de Alberto Fernández presidência da Argentina, "visto que Fernández é de esquerda, apoiou o ex-presidente Lula na época que estava preso e
isso acabou azedando as relações bilaterais"
"O governo Bolsonaro tem essa marca absolutamente atípica de tomar partido mesmo em processos eleitorais de países vizinhos e amigos. Ele agiu assim com os EUA, Argentina, Israel e isso acaba prejudicando muito o relacionamento, porque, afinal de contas, como podemos esperar que um presidente eleito – como no caso da Argentina – possa se dar bem com um presidente que fez campanha declarada para seu adversário?", indaga Casarões.
A escolha do governo brasileiro de expressar sua "torcida" eleitoral enfraquece o Mercosul, um bloco importante para integração sul-americana, que tem como principais países Brasil e Argentina.
Porém, Casarões também destaca que
a crise sanitária provocada pela COVID-19 dificulta uma possível revitalização total das relações, dado que "não dá para esperar muitos avanços em uma agenda de liberalização comercial, ou na concretização do acordo Mercosul-União Europeia porque existe uma prioridade imediata para qualquer país que é o encaminhamento da economia no pós-coronavírus".
"No entanto,
pensando no caso brasileiro, de um governo que prometeu desintegrar a região, só de não haver retrocesso, já estamos no lucro", pondera o cientista.
Política externa brasileira
Casarões diz que a troca na administração norte-americana impactou a política externa brasileira, uma vez que o "presidente Jair Bolsonaro tinha laços pessoais com o ex-presidente Trump, e agora com Biden, a relação se dá em uma esfera mais institucional, mais distante".
"A agenda pessoal do Bolsonaro não tem repercussão nesse atual governo, então não tem como esperar
grandes cooperações bilaterais", comenta.
Após a saída de Ernesto Araújo do Itamaraty,
veio o chanceler Carlos França, o qual, até o momento, não tem contas nas redes sociais, e isso já indicaria "uma postura muito diferente em relação à chamada 'diplomacia pública', ou seja, ele não usa canais não oficiais para se pronunciar e o Itamaraty
vem tendo um perfil baixo no que se refere a negociações, conquistas e acordos", afirma Casarões.
"Desincentivado pelo Itamaraty, Bolsonaro acaba se portando de maneira um pouco mais adequada. Ele teve um momento de barulho nas redes sociais em matérias de política externa ligadas ao Foro de São Paulo, à China, ao Trump, mas muito disto teve a ver com o fato de que ele e o chanceler estavam em total sintonia nesta abordagem."
Além de Araújo, que causou polêmica durante sua gestão pelas declarações hostis que fazia a certos países, outra figura que "desapareceu" e contribuiu para uma diplomacia brasileira menos agressiva foi o assessor internacional Felipe Martins, o qual "passou um bom tempo quase que como um chanceler paralelo na chefia de Araújo", segundo Casarões.
Vulnerabilidade de governos ante ataques hackers
Ainda no campo virtual, 2021 também foi marcante pela grande quantidade de ataques cibernéticos a instituições públicas e empresas privadas.
Este ano se consolidou como um ano recorde para violações de dados. De acordo com a pesquisa do Centro de Recursos de Roubo de Identidade (ITRC, na sigla em inglês), o número total de violações de dados até 30 de setembro de 2021 já excedeu o número total de eventos em 2020 em 17%,
segundo a Security Magazine.
Em maio,
o ataque hacker à maior operadora de oleoduto dos EUA, a Colonial Pipeline, fez o governo norte-americano declarar estado de emergência no país. Em outubro, um ataque cibernético a postos de gasolina no Irã bloqueou a distribuição de combustível.
4 de dezembro 2021, 05:48
No Brasil, agora no começo de dezembro, hackers invadiram o site do Ministério da Saúde e
apagaram todos os dados sobre a campanha de vacinação nacional. Em seguida, a Câmara Municipal do Rio de Janeiro também foi alvo. O Brasil foi o 5º país que mais sofreu ataques cibernéticos em 2021,
segundo a IstoÉ Dinheiro.
De acordo com Marcelo Branquinho, CEO da TI Safe, no caso brasileiro, "
o sistema está exposto".
"Sites do governo são muito vulneráveis. Isso acontece porque essas políticas de segurança não têm investimento, e tampouco a conscientização de alguns funcionários. Não são hackers, são grupos organizados criminosos. Eles sabem fazer o ataque e esperam receber dinheiro em troca dos dados sequestrados", explicou.
Avanços em 2021 e progressões para 2022
Na opinião de Alves,
um dos destaques deste ano foi a COP26, a Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2021, ocorrida de 31 de outubro a 12 de novembro.
"Por mais que alguns tenham lançado críticas sobre a necessidade de se ter um acordo mais ambicioso, eu normalmente lembro que muita ambição pode não resultar diretamente em metas executáveis. O reconhecimento, pela primeira vez, de como é importante diminuir o uso de combustíveis fósseis durante a conferência foi um avanço", afirma a diretora.
Em 2022, Alves gostaria de testemunhar maiores "debates e definições estratégicas para uma reforma nas organizações internacionais, a fim de torná-las menos burocráticas e mais eficientes para atingir seus objetivos, principalmente com a pandemia. Estas definições devem ser a grande pauta internacional para fomentar uma recuperação global".
Para Casarões, o progresso em 2021 ocorreu no que diz respeito às questões tecnológicas, científicas e em relação às vacinas.
"Houve um esforço grande não só dos governos, mas também do setor privado, das organizações internacionais, no sentido de criar uma plataforma global para pesquisa e produção de vacinas para o enfrentamento da pandemia."
A pandemia "teve como um dos seus resultados essa possibilidade de cooperação científica-tecnológica entre diversos órgãos", todavia, "houve alguns pontos cegos, e o mais complicado deles foi a distribuição de vacinas para países em desenvolvimento".
"Nós vemos um ambiente de cooperação, mas ao mesmo tempo vemos essa desigualdade profunda na logística de distribuição de vacinas. [...] Rússia e China fizeram um papel muito importante porque o foco da chamada 'diplomacia das vacinas' de ambos os países foi justamente ligado a esse mundo em desenvolvimento [...]", afirma o cientista político.
Diante deste cenário, Casarões espera que em 2022 "aconteça uma universalização do acesso às vacinas por países mais pobres".
O impacto da pandemia na economia global foi devastador em 2020. No Brasil, o setor econômico teve sua maior queda em 30 anos no ano passado, sofrendo uma baixa de 4,1% no PIB em relação a 2019,
segundo o jornal Nexo.
Em 2021, a economia começa a engatinhar. Com as campanhas de vacinação, o vírus perde um pouco de sua força e permite que restrições fiquem mais afrouxadas,
fazendo o dinheiro girar com mais facilidade.
Segundo Bruno Martarello De Conti, professor do Instituto de Economia da Unicamp, houve recuperação econômica sim em 2021, uma vez que "2020 foi tão ruim, que qualquer crescimento já significa uma melhora".
"Agora, essa recuperação é parcial, em muitos países essa melhoria não vai repor a queda do ano passado ou até mesmo chegar a patamares de 2019 [...]. É um processo desigual. Por exemplo, a China desponta como um país que conseguiu essa recuperação enquanto os países periféricos são aqueles que mais sofreram, como os da América Latina", diz De Conti.
Outra conjuntura que contribui para desigualdade, é o fato de, além da China, outras nações como EUA, Alemanha, terem utilizado políticas públicas de recuperação.
"Esses países fizeram políticas pesadas – no bom sentido – de contenção da crise com assistência social, renda mínima, etc, mas também de investimento. O maior exemplo
é o plano trilionário de Joe Biden, o qual é focado em medidas até de longo prazo. Esses países têm uma maior liberdade de política econômica, enquanto os periféricos ficam mais constrangidos", explica o especialista.
Apesar da economia estar engatinhando lentamente, ainda assim, uma progressão é vislumbrada. Em contraste,
o desemprego continua com taxas preocupantes, e não acompanha a evolução econômica.
De Conti diz que, em parte, isso acontece por algumas mudanças que vieram para ficar, como "o uso das tecnologias de informação e comunicação que enxugam mais empregos", assim como as "expectativas incertas em relação ao futuro".
"Com a pandemia, há uma incerteza grande e os empresários não querem contratar neste contexto. [...] Há também uma questão de desorganização das cadeias globais de valor. A indústria automobilística, por exemplo, ainda patina por falta de componentes
como os semicondutores, essa desorganização que acontece com os bens intermediários também impede a geração de novos empregos", explica o analista.
Para 2022, na avaliação do professor, pior do que um provável alto índice inflacionário, o aumento da pobreza, da miséria e da fome são os piores vilões que podem assombrar os países mais necessitados no ano que vem.
"No caso do Brasil, saiu uma pesquisa informando que 45% da população pode enfrentar algum grau de vulnerabilidade alimentar [...]. A tragédia do ano que vem pode ser essa, a fome."
2021 foi um ano de um nacionalismo econômico exacerbado, segundo De Conti. "Essa característica foi muito reveladora, uma vez que a pandemia prejudicou todo o planeta e um certo tipo de solidariedade seria o comportamento mais esperado."
"Isso mostra um pouco que não conseguimos nos organizar como humanidade. [...] Acredito na humanidade, mas o sistema econômico atual capitalista não favorece ações em benefício do coletivo, são focadas nos países de forma nacionalista."
Por outro lado, De Conti lembra que o capital "é extroversivo por definição" e busca melhores oportunidades se expandindo geograficamente para encontrar preços mais acessíveis de matérias-primas, assim como maior mercado consumidor, em um movimento "que se convencionou ser chamado de globalização, mas que na minha opinião, não é um fenômeno recente, ele é intrínseco ao capitalismo".
"Essa será uma tensão permanente porque o nacionalismo vai continuar enquanto houver crise. Podemos constatar isso nos EUA, por exemplo. O Biden só é menos tosco que o Trump,
mas também é ultranacionalista, atuando fortemente para volta dos EUA como líderes mundiais. Promoveu esse encontro pretensamente pela democracia, que é um dos teatros mais horrorosos que já foram feitos, por exemplo. A postura dele em relação à China também evidencia isso."
Economia operando dentro de metas ambientais
O professor acredita que, de fato, este ano proporcionou uma discussão mais ampla e efetiva em torno das questões ambientais, no entanto, o debate ainda acontece em um plano superficial, e o capital, como busca o maior tipo de valorização viável, é contrário às necessidades ecológicas.
"Não acho possível um capitalismo ecológico, os problemas passam também pela superação do sistema. Há avanços sim, mas não o suficiente para combater a agressão ao meio ambiente."
Se não for controlada, as mudanças climáticas podem levar até 132 milhões de pessoas à pobreza extrema até 2030,
de acordo com estimativas do Banco Mundial.
A pobreza já está associada à vulnerabilidade relacionadas ao clima, como enchentes e doenças transmitidas por vetores, tornando as mudanças climáticas um grande desafio mundial e um obstáculo para o alívio da pobreza extrema.