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Macron ou Le Pen: o que pode mudar (ou não) nas relações entre França e Brasil?

© AP Photo / Ludovic MarinEmmanuel Macron debate com Marine Le Pen em 20 de abril de 2022.
Emmanuel Macron debate com Marine Le Pen em 20 de abril de 2022.  - Sputnik Brasil, 1920, 22.04.2022
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Às vésperas de um disputado segundo turno das eleições na França, cuja realização será no próximo domingo (24), projeções de intenção de voto indicam que o atual presidente de centro-direita, Emmanuel Macron, deve se reeleger. Não sem disputar, minuto a minuto, com a candidata da extrema-direita, Marine Le Pen, em um pleito muito concorrido.
Mesmo com uma vantagem que aponta dez pontos a mais que sua adversária, ou 55,5% dos votos válidos para este final de semana, a equipe de Macron vê a disputa com cautela.
O primeiro-ministro francês, Jean Castex, diz que é cedo para cantar vitória.
"Nada está decidido", avaliou ele em entrevista à rádio France Inter, acrescentando que a campanha de Macron deve convencer os eleitores de que seu programa é o melhor para o país.
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Outra indefinição também paira no ar. A depender dos resultados, como ficará a relação entre o Brasil e a França, tradicionais parceiros comerciais cujo comércio bilateral de bens cresceu 21,7% nos últimos dez anos?
As alianças políticas também são uma incógnita, independentemente do candidato que ganhe no país europeu.
Na tentativa de entender como se desenhará o jogo político no caso da vitória de cada um, a Sputnik Brasil conversou com especialistas em economia e relações internacionais, que prognosticaram alguns cenários.
© AP Photo / Jeremias GonzalezFavorito na disputa, Macron cumprimenta eleitor na França, em 12 de abril de 2022.
Favorito na disputa, Macron cumprimenta eleitor na França, em 12 de abril de 2022.  - Sputnik Brasil, 1920, 22.04.2022
Favorito na disputa, Macron cumprimenta eleitor na França, em 12 de abril de 2022.

Mau relacionamento entre Bolsonaro e Macron

Não é de hoje que o comportamento do presidente brasileiro Jair Bolsonaro (PL) desperta a desconfiança por parte de Macron. Existe uma indisposição pessoal do presidente da França em virtude de comentários que Bolsonaro e seus adeptos fizeram a respeito de sua esposa, Brigitte Macron.
Ainda assim, porém, pouco deve mudar do atual ponto de relação até uma virtual reeleição do atual presidente francês, segundo avalia o doutor em direito Geraldo Tadeu, professor adjunto de sociologia jurídica da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
"As relações entre o Brasil e a França devem se manter no mesmo nível que têm se mantido nos últimos anos. O problema não está do lado da França ou da União Europeia: está do lado do Brasil, que tem hoje uma política externa totalmente dependente de valores ideológicos. Especialmente em relação ao fato de estarmos contrários ao multilateralismo, que dificulta, por exemplo, a assinatura de acordos com a União Europeia. Mas, ao mesmo tempo, os diplomatas brasileiros têm um discurso essencialmente multilateralista. Ou seja, o presidente tem um discurso, os diplomatas têm outro. O problema está muito mais do nosso lado do que do francês", aponta ele.
© AFP 2023 / JULIEN DE ROSAA candidata presidencial Marine Le Pen ouve eleitores durante uma visita de campanha a Saint-Remy-sur-Avre, noroeste da França, 16 de abril de 2022
A candidata presidencial Marine Le Pen ouve eleitores durante uma visita de campanha a Saint-Remy-sur-Avre, noroeste da França, 16 de abril de 2022 - Sputnik Brasil, 1920, 22.04.2022
A candidata presidencial Marine Le Pen ouve eleitores durante uma visita de campanha a Saint-Remy-sur-Avre, noroeste da França, 16 de abril de 2022
Já Le Pen tem um ponto de contato com Bolsonaro porque comungam das mesmas perspectivas ideológicas, afirma.
"Seria Marine Le Pen quem teria mais afinidade com Bolsonaro, certamente, uma vez que comungam dos mesmos valores nacionalistas, dos mesmos valores de ordem, autoridade, hierarquia, além do de segregação. Se ela ganhar, claro que haverá uma afinidade ideológica entre os governos de Bolsonaro e o dela. Isso deve contribuir para uma aproximação. Mas esta aproximação será sempre seletiva. Ela nunca é totalmente aberta a todas as áreas. Certamente, ciência e tecnologia, assim como cultura, não serão privilegiadas em um eventual acordo de cooperação e de política externa entre Brasil e França", observa.
Mas nem tudo serão rosas para Bolsonaro caso a candidata considerada da extrema-direita francesa ganhe as eleições.
Flavio Soares de Barros, doutor em Relações Internacionais e fundador da Consultoria Cromabrasil, entende que o possível governo de Le Pen defenderá o protecionismo e tem preocupações muito mais voltadas para as questões internas, como o poder aquisitivo e a imigração.
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Embora considere bastante difícil traçar um perfil prospectivo de um eventual governo Le Pen, ele lembra que a candidata apresentou propostas, no âmbito da política externa, voltadas especialmente para zona do euro, "uma forma de redução dos vínculos entre França e EU", e também sobre o "engajamento da França com a OTAN [Organização do Tratado Atlântico Norte]", promovendo um possível recuo.
"Com base nos programas apresentados, o futuro ou a futura presidente do Brasil terá que enfrentar, qualquer seja o resultado das eleições na França, obstáculos ao comércio de produtos agrícolas e dificuldades crescentes para a expansão de acordos comerciais, tendo em vista a ênfase nas questões ambientais e na situação econômica interna da França", comentou.

A questão amazônica e o Mercosul

Costurado ao longo da última década, o tratado Mercosul-UE ainda está longe de um final feliz. No último dia 19 de abril, o ministro da Economia do Brasil, Paulo Guedes, falou sobre o tema durante uma viagem aos EUA e cobrou celeridade dos parlamentares europeus.

"Se não fizermos algo agora sobre o acordo com a União Europeia e a entrada na OCDE, estamos sendo empurrados em outra direção, temos outras opções, estamos vendendo mais para o Oriente Médio, Ásia e China", concluiu.

Soares de Barros foi cético sobre o futuro do acordo. Segundo ele, Macron representa a continuidade da política francesa e europeia. "O presidente francês está sendo obrigado a reforçar seu engajamento nas questões ambientais, um ponto em que a esquerda francesa é bastante crítica em relação ao mandato atual", avaliou.
Além disso, conforme explicação do especialista, o programa de Macron propõe a continuidade da proteção do setor agrícola, por meio da reciprocidade nos acordos comerciais, o que também causaria impacto para o Brasil, "ao dificultar a entrada de produtos brasileiros no bloco europeu".
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"A pressão viria, portanto, principalmente pela conexão entre comércio e meio-ambiente. A efetivação do tratado Mercosul-UE esbarra precisamente na contenção do desmatamento na Amazônia.
Por fim, o especialista aponta que pelo menos dois pontos polêmicos devem ser discutidos no âmbito do tratado comercial: o acesso de manufaturas originadas no Mercosul e a participação de empresas europeias nas licitações governamentais de países do Mercosul.
Conforme revelado recentemente em outras apurações da Sputnik, conglomerados norte-americanos e europeus são investidores do desmatamento na Amazônia.
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