Xeque-mate: discurso de Putin marca fim do jogo para apoiadores dos EUA e da OTAN, diz analista
12:00 22.09.2022 (atualizado: 13:37 22.09.2022)
© Sputnik / Pavel BednyakovO presidente russo, Vladimir Putin, participa de uma sessão plenária do 25º Fórum Econômico Internacional de São Petersburgo (SPIEF, na sigla em inglês), na Rússia, em 17 de junho de 2022
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O presidente russo Vladimir Putin anunciou a mobilização parcial em 21 de setembro e prometeu defender o direito das regiões de Donbass, Kherson e Zaporozhie de realizar referendos sobre a adesão à Rússia.
"Uma vez que as regiões de Lugansk e Donetsk, Zaporozhie e Kherson estiverem integradas na Federação da Rússia, o jogo acaba", disse Paolo Raffone, diretor da fundação CIPI, um think tank geopolítico com sede em Bruxelas.
"Na verdade, o presidente dos EUA disse repetidamente que seu país não está em guerra com a Rússia e que não quer enviar tropas americanas para o terreno a fim de combater a Rússia, nem quer usar armas não convencionais. Devido aos problemas domésticos nos EUA, será difícil reverter essa abordagem pelo menos até as eleições presidenciais de 2024."
Os referendos sobre a adesão à Rússia serão realizados nas quatro regiões do leste da Ucrânia nos dias 23 e 27 de setembro. No discurso de quarta-feira (21) à nação, Putin chamou a atenção para "a política de intimidação, terror e violência" perseguida por Kiev contra os residentes de Donbass e ucranianos que têm opiniões pró-russas. Esta política tornou-se "mais massiva, terrível e bárbara", ressaltou o presidente.
A região de Donbass está sob os ataques de Kiev desde 2014, quando um golpe de Estado apoiado pelos EUA viu o presidente democraticamente eleito, Victor Yanukovich, deposto por grupos paramilitares neonazistas.
Em abril de 2014, as autoridades ucranianas lançaram uma operação "antiterrorista" contra a população pró-russa do leste da Ucrânia. Independentemente dos esforços do Quarteto da Normandia, Kiev rejeitou os acordos para a reconciliação com suas repúblicas separatistas, os chamados Acordos de Minsk.
Enquanto isso, figuras da oposição da Ucrânia, jornalistas, políticos e até mesmo crianças que expressam opiniões contradizendo a agenda de Kiev têm sido frequentemente colocadas na lista de "inimigos da Ucrânia" pelo famoso site Mirotvorets, com alguns terminando mortos. Após o início da operação especial russa em 24 de fevereiro, forças militares ucranianas e batalhões neonazistas intensificaram os expurgos contra ucranianos pró-russos, bem como a tortura e assassinato de prisioneiros de guerra russos.
"Sabemos que a maioria das pessoas que vivem nos territórios libertados, e estas são principalmente as terras históricas de Novorossiya, não querem viver sob o jugo do regime neonazista. A Rússia não pode deixar que aqueles que lhe são próximos sejam massacrados por carrascos e não responder às suas aspirações de determinar o seu próprio destino", disse Putin.
Putin ainda ressaltou que Washington, Londres e Bruxelas estão abertamente encorajando Kiev a mover as hostilidades para o território russo e até mesmo recorrer à chantagem nuclear. O presidente destacou que a Rússia protegerá sua integridade territorial e soberania "por todos os sistemas que temos disponíveis", acrescentando que Moscou possui diferentes tipos de armas, algumas das quais são mais modernas do que as armas da OTAN.
O discurso de Putin foi recebido com a "histeria formalista do Ocidente", segundo Raffone. O secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, e o embaixador dos EUA em Kiev afirmaram que a mobilização parcial da Rússia e os referendos são "sinais de fraqueza". O ministro alemão da Economia, Robert Habeck, disse que o desenvolvimento é "ruim e errado", enquanto o secretário britânico da Defesa, Ben Wallace, declarou que o discurso de Putin indica que a Ucrânia está "ganhando".
Por sua vez, o primeiro-ministro polonês Mateusz Morawiecki disse que Varsóvia "não pode concordar" com a decisão russa. Qualquer que tenha sido a forma como os líderes ocidentais reagiram ao discurso de Putin, agora está claro que qualquer atividade militar contra as regiões em questão significará automaticamente uma "guerra contra a Rússia", segundo Raffone. "Este é um forte impedimento que já funcionou no caso da Crimeia", argumentou o diretor do think tank. "Se os EUA ou alguns Estados da UE não entenderem este ponto, a escalada da guerra é uma certeza."
"O referendo é uma consequência lógica do confronto atual", disse Tibério Graziani, presidente da Vision & Global Trends, um think tank de assuntos internacionais com sede na Itália. "Faz parte da construção da zona de segurança da Federação da Russa. Além disso, garante a participação das populações ali residentes na vida política e civil, comprometidas pelo menos desde 2008."
Ao mesmo tempo, o impasse é muito mais amplo do que um conflito russo-ucraniano, de acordo com Raffone. A crise decorre da intenção de Washington de evitar o declínio de seu domínio global, explicou o estudioso. O diretor do think tank observa que, neste esquema, a Ucrânia tem sido usada pelos EUA como um "cavalo de Tróia" contra a UE e a Rússia. "Desde 2001, o resto do mundo começou a trabalhar em uma nova ordem mundial que visava relativizar o domínio dos EUA", argumentou Raffone.
"A Europa é uma obra-prima do domínio dos EUA que não pode ser deixada acessível aos 'outros' e não deve ter autonomia estratégica. Para isso, os EUA têm constantemente pressionado a Alemanha, que ousou desafiar os EUA com vários acordos (não apenas no setor energético) com a Rússia e acordos comerciais com a China. Os planos para desestabilizar a Alemanha e a UE começaram em 2004-2008 e avançaram desde 2014, usando a Ucrânia como um cavalo de Tróia contra a UE e a Rússia."
Enquanto isso, a decisão de mobilização parcial anunciada por Putin vai ter um efeito estabilizador sobre o conflito, impedindo-o de uma nova escalada, segundo Raffone.
"Além disso, o envio de tropas russas adicionais para as regiões de Lugansk, Donetsk, Zaporozhye e Kherson cria as condições de segurança para que o referendo ocorra", ressaltou o diretor do think tank.