Explicando os Acordos de Minsk: por que o não cumprimento dos pactos levou à operação na Ucrânia?
© AFP 2023 / Michael KappelerA então chanceler alemã Angela Merkel recebe o presidente russo Vladimir Putin, o então presidente francês François Hollande (primeiro plano, C) e o então presidente ucraniano Pytor Poroshenko (R) durante negociações de paz no leste da Ucrânia (foto de arquivo)
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Assinados em 2014 e 2015 por representantes da Ucrânia, Rússia, França, Alemanha e das Repúblicas Populares de Donetsk e Lugansk, os Acordos de Minsk não conseguiram trazer uma solução pacífica para o conflito em Donbass.
Ao discursar em uma reunião do Conselho para o Desenvolvimento da Sociedade Civil e dos Direitos Humanos na quarta-feira (7), o presidente russo, Vladimir Putin, mencionou a questão dos Acordos de Minsk de 2014.
O líder disse que os políticos ocidentais preferem ficar de boca fechada quando ele os lembra dos acordos, que deveriam abrir caminho para a resolução pacífica do conflito na Ucrânia, mas acabaram falhando em fazê-lo.
No dia 22 de fevereiro deste ano, dois dias antes de começar a operação militar especial, Moscou reconheceu Donbass com Putin esclarecendo que as então repúblicas populares de Donetsk e Lugansk foram reconhecidas porque Kiev disse publicamente que não cumpria os Acordos de Minsk, conforme noticiado.
Mas afinal, o que são os Acordos de Minsk, o que levou as partes envolvidas a assiná-lo e por que o seu não cumprimento deflagrou na operação que acontece agora na Ucrânia?
Do golpe à assinatura dos acordos em Minsk
Em fevereiro de 2014, o governo democraticamente eleito da Ucrânia foi derrubado pelo chamado golpe Euromaidan apoiado pelas potências ocidentais. O golpe desencadeou um conflito sangrento nas regiões orientais do país, onde as pessoas que se recusaram a se curvar à nova liderança de Kiev formaram as Repúblicas Populares de Donetsk e Lugansk (RPD e RPL, respectivamente) e proclamaram a independência delas.
Com esse contexto, Kiev tentou subjugar rapidamente as repúblicas recém-formadas por meio do uso do poder militar, mas falhou. Não tendo conseguido uma vitória decisiva no campo de batalha e com a Rússia e as potências europeias a apelarem a uma solução pacífica para o conflito, a Ucrânia recorreu às negociações, dificultadas pela relutância do governo ucraniano em falar diretamente com os líderes da RPL e RPD.
Em meio à situação delicada, o recém-formado Grupo de Contato Trilateral sobre a Ucrânia, composto por Kiev, Moscou, Organização para Segurança e Cooperação na Europa (OSCE) e o Formato Normandia, formado por Ucrânia, Rússia, Alemanha e França, conseguiram chegar ao que ficou conhecido como os Acordos de Minsk.
Os acordos receberam este nome porque as negociações foram realizadas na capital belarussa de Minsk, que serviu como um terreno neutro.
O primeiro desses acordos, o Protocolo de Minsk, foi assinado em 5 de setembro de 2014, com uma versão atualizada do mesmo, conhecido comumente como Acordos de Minsk-2, tendo sido assinado em 12 de fevereiro de 2015, quando a iteração anterior do acordo falhou em pôr fim à luta.
O acordo Minsk-2 foi firmado durante uma reunião do Formato da Normandia, que incluiu o presidente russo, Vladimir Putin, a então chanceler alemã Angela Merkel, o então presidente francês, François Hollande, e o então presidente ucraniano Pyotr Poroshenko.
© AP Photo / Mykola LazarenkoA partir da esquerda, o presidente russo, Vladimir Putin, o então presidente francês, François Hollande, a então chanceler alemã, Angela Merkel, e o então presidente ucraniano, Pyotr Poroshenko, conversam em Minsk, Belarus, 11 de fevereiro de 2015
A partir da esquerda, o presidente russo, Vladimir Putin, o então presidente francês, François Hollande, a então chanceler alemã, Angela Merkel, e o então presidente ucraniano, Pyotr Poroshenko, conversam em Minsk, Belarus, 11 de fevereiro de 2015
© AP Photo / Mykola Lazarenko
O que estava estabelecido no texto dos acordos?
As partes prometeram cessar-fogo e retirar suas forças da linha de contato.
A presença de armas pesadas na área da zona-tampão foi estritamente proibida.
Os sistemas de foguetes de lançamento múltiplo Uragan e Smerch, bem como o sistema de mísseis balísticos de curto alcance Tochka, deveriam ser retirados a 70 km da linha de contato.
Os observadores da OSCE deveriam monitorar a implementação dessas regras.
Além da troca de prisioneiros de acordo com o princípio "todos por todos", os lados foram obrigados a realizar a anistia dos capturados durante os confrontos armados.
O lado ucraniano também deveria adotar a lei sobre o status especial dos distritos separados de RPL e RPD e realizar eleições locais lá, levando em consideração o posicionamento dos representantes de ambas as repúblicas de Donbass. No dia seguinte às eleições, a Ucrânia deveria assumir o controle total da fronteira estatal ucraniana.
Além disso, os Protocolos de Minsk estipulavam a implementação de uma reforma na Ucrânia, que previa a introdução de um conceito de descentralização na Constituição do país que deveria ter levado em consideração as especificidades de "certos distritos das regiões de Donetsk e Lugansk".
© AFP 2023 / Sergei SupinskyVeteranos ucranianos queimam fogueiras do lado de fora da embaixada russa em Kiev durante seu protesto contra os novos Acordos de Minsk em 14 de março de 2020
Veteranos ucranianos queimam fogueiras do lado de fora da embaixada russa em Kiev durante seu protesto contra os novos Acordos de Minsk em 14 de março de 2020
© AFP 2023 / Sergei Supinsky
Quem assinou os Acordos de Minsk?
O Protocolo de Minsk foi assinado pelos membros do grupo de contato, bem como pelos chefes das Repúblicas Populares de Donetsk e Lugansk.
Em 12 de fevereiro de 2015, foi assinada uma série de medidas de 13 pontos sobre a implementação dos Acordos de Minsk (os chamados acordos de Minsk-2) e, em geral, o documento coincidiu com o protocolo de setembro em termos de conteúdo.
Em nome da OSCE, os Acordos de Minsk foram assinados pelo enviado especial da OSCE para a Ucrânia, Heidi Tagliavini, enquanto por parte da Ucrânia e da Rússia, o documento foi assinado pelo ex-presidente ucraniano Leonid Kuchma e pelo então embaixador russo em Kiev, Mikhail Zurabov, respectivamente.
Quem violou o que foi acordado?
Nos últimos cinco anos, o lado ucraniano simplesmente se absteve de implementar as cláusulas políticas dos Acordos de Minsk, exigindo, em vez disso, que o controle da fronteira entre os territórios da RPL e RPD fosse entregue primeiro a Kiev.
Essas exigências, no entanto, foram rejeitadas pelas autoridades das repúblicas e por Moscou, que suspeitava que, uma vez que as forças ucranianas assumissem o controle da fronteira e isolassem efetivamente as repúblicas do mundo exterior, Kiev poderia então tentar esmagar toda a oposição por meio da força e de armas.
A RPD e RPL, assim como a Rússia, também acusaram o governo ucraniano de ocupar assentamentos ilegalmente na zona-tampão e de implantar equipamento militar pesado na região.
A situação foi ainda mais agravada pelo fato de que as potências ocidentais repetidamente fecharam os olhos à recusa flagrante de Kiev em aderir aos Acordos de Minsk, ao mesmo tempo em que repreendiam constantemente a RPD e RPL pelas supostas violações dos mesmos acordos.
Na quarta-feira (7), o ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergei Lavrov, lembrou que tanto o presidente ucraniano, Vladimir Zelensky, quanto seu antecessor, Pyotr Poroshenko, disseram abertamente que não implementariam os Acordos de Minsk.
Em junho deste ano, Poroshenko admitiu que o cessar-fogo de 2015 em Donbass, negociado com a Rússia, França e Alemanha quando ele era presidente da Ucrânia, foi apenas uma distração para ganhar tempo a fim de Kiev reforçar seu Exército, conforme noticiado.
As observações de Lavrov foram feitas depois que Putin condenou as autoridades ucranianas por matarem efetivamente os acordos, afirmando no final de fevereiro que o documento deixou de existir muito antes de a Rússia decidir reconhecer as repúblicas.
O líder russo assinou um decreto para reconhecer as repúblicas de Donbass – que mais tarde se tornaram parte da Rússia – como Estados independentes em 21 de fevereiro de 2022, em um movimento que ocorreu em meio a ataques crescentes de bombardeios, franco-atiradores e sabotagem contra a RPL e RPD. O decreto foi seguido pelo presidente russo anunciando o início de uma operação militar especial na Ucrânia em 24 de fevereiro.