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Jornalista: 'Posso ser preso por traição na Ucrânia por falar sobre o massacre de Odessa em 2014'

© Sputnik / Aleksandr PolischukIncêndio mortal na Casa dos Sindicatos, em Odessa, Ucrânia
Incêndio mortal na Casa dos Sindicatos, em Odessa, Ucrânia - Sputnik Brasil, 1920, 02.05.2023
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O dia 2 de maio marca o nono aniversário do massacre da Casa dos Sindicatos de Odessa em 2014. Um jornalista de Odessa que testemunhou os eventos compartilhou com a Sputnik suas memórias do dia em que cerca de 50 pessoas foram espancadas até a morte ou queimadas vivas.
"Eu fazia parte de uma equipe de filmagem, estava no centro da cidade. Quando chegamos, tudo já estava em chamas", disse o jornalista que pediu à Sputnik para não indicar sua verdadeira identidade e usar um pseudônimo, Aleksandr Kataev, por razões de segurança.
"Uma mulher se jogou no capô de nosso carro e gritou: 'Socorro, as pessoas estão queimando lá'. Foi difícil tomar consciência do fato de que as pessoas estavam morrendo lá. Não se podia perceber isso imediatamente. Ao mesmo tempo, cerca de 30 policiais estavam parados e fumavam calmamente a apenas 50 metros do prédio em chamas, ao longo da estrada, atrás dos arbustos", relatou Kataev.
"Naquele momento, como se viu mais tarde, as pessoas estavam pulando do prédio em chamas. Depois disso, acabavam com elas no chão. Ainda assim, os policiais simplesmente estavam parados fumando e nenhum caminhão de bombeiros estava por perto no momento", acrescentou.
As vítimas eram principalmente membros de um movimento Kulikovo Pole que foi lançado por aqueles que não aceitavam a destituição do presidente ucraniano Viktor Yanukovich em fevereiro de 2014.

Como tudo começou

Após meses de protestos em massa em Kiev, o presidente ucraniano Viktor Yanukovich e líderes da oposição assinaram um acordo sobre a solução da crise política na Ucrânia, mediado por representantes da União Europeia e da Rússia em 21 de fevereiro de 2014.
No entanto, no dia seguinte, todos os acordos foram rasgados unilateralmente por manifestantes violentos que tomaram prédios do governo à força e estabeleceram o controle total da capital ucraniana.
A grande mídia dos EUA informou na época que os partidos ultranacionalistas da Ucrânia e seus grupos paramilitares desempenharam um papel fundamental na mudança de regime de 2014 em Kiev e mais tarde assumiram posições no conselho de Segurança e Defesa Nacional, o Escritório do Procurador-Geral, e os Ministérios de Ecologia e Agricultura do governo interino.

"Grupos de extrema direita, antissemitas, antirrussos e abertamente fascistas existiram e existem como uma praga na Ucrânia moderna", escreveu a CNN em março de 2014.

© Sputnik / Andrei SteninProtesto na praça Maidan em Kiev, 22 de fevereiro de 2014
Protesto na praça Maidan em Kiev, 22 de fevereiro de 2014 - Sputnik Brasil, 1920, 02.05.2023
Protesto na praça Maidan em Kiev, 22 de fevereiro de 2014
A junta de Kiev perseguiu uma agenda abertamente russofóbica, reprimindo dissidentes e silenciando a oposição. Muitas regiões do Leste da Ucrânia não aceitaram o golpe de Maidan e lançaram movimentos de protesto.
A península da Crimeia realizou um referendo para ganhar autonomia e se reincorporar à Rússia em março de 2014. Marchas pró-russas ocorreram em Donbass. Dezenas de milhares tomaram as ruas de Odessa.
"As manifestações pró-russas reuniram cerca de 25 mil pessoas em Odessa", disse Kataev.

"Eu estava lá também, filmei tudo, participei desses comícios com pessoas carregando bandeiras russas e gritando 'Rússia'. Na última vez, 25.000 pessoas atravessaram a cidade do Kulikovo Pole até a costa. E isso não foi organizado por meios administrativos. Naquela época, não havia meios administrativos. Mais precisamente, as rédeas da cidade já estavam nas mãos dos Maidanites."

Em comparação com esta manifestação da vontade do povo, as dezenas ou mesmo centenas de apoiantes de Maidan reunidos perto do monumento ao duque de Richelieu em Odessa parecia patético.

"Ninguém os levava a sério. Eles eram vistos como loucos cujos companheiros correram pelo Maidan alguns meses atrás com panelas na cabeça", observou Kataev.

2 de maio em Odessa mudou tudo

Nada sugeria qualquer problema iminente em 2 de maio de 2014, em Odessa. E ainda assim o desenvolvimento da situação foi nada menos que surrealista, relembrou o jornalista.
Era feriado, a maioria das pessoas em Odessa ainda estava comemorando o Dia do Trabalhador com alguns indo em viagens de um dia para fora da cidade, enquanto outros ficaram em casa. O que poderia dar errado?
"Chegamos ao centro, e lá, do outro lado da estrada, a luta estava acontecendo, eram jogados pedras e se ouviam gritos", disse ele.

"Ao mesmo tempo, do outro lado da estrada, em uma esplanada, as pessoas estavam sentadas, tomando café, com dez delas filmando essa briga em seus telefones. Não houve chamada: 'Levanta-te, Grande País!'"

De repente, descobriu-se que a violência nas ruas estava ganhando força em toda a cidade. Confrontos aconteciam aqui e ali, pessoas armadas eram vistas nas multidões e as pessoas abriam fogo.
© Sputnik / Igor MaslovMoradores colocam cruz em forma de lâmpadas em ato comemorativo da memória das vítimas de ativistas anti-Maidan que morreram na Casa dos Sindicatos (no fundo) de Odessa, Ucrânia, 2 de maio de 2021
Moradores colocam cruz em forma de lâmpadas em ato comemorativo da memória das vítimas de ativistas anti-Maidan que morreram na Casa dos Sindicatos (no fundo) de Odessa, Ucrânia, 2 de maio de 2021 - Sputnik Brasil, 1920, 02.05.2023
Moradores colocam cruz em forma de lâmpadas em ato comemorativo da memória das vítimas de ativistas anti-Maidan que morreram na Casa dos Sindicatos (no fundo) de Odessa, Ucrânia, 2 de maio de 2021
O cerne da questão era que a polícia permitiu que 800 nacionalistas e neonazistas ucranianos de Carcóvia e Dnepropetrovsk viessem para Odessa. Os postos de controle nas proximidades eram controlados por milícias pró-Maidan supervisionadas por Andrei Parubiy, um comandante do Maidan e político nacionalista que foi nomeado secretário do Conselho de Segurança e Defesa Nacional da Ucrânia.
Além disso, naquele dia, um jogo do campeonato de futebol ucraniano entre o FC Chernomorets Odessa e o FC Metalist Carcóvia teria lugar às 17 horas em Odessa. Fãs de futebol ucranianos e ativistas pró-Maidan - equipados com armas e coquetéis molotov - atacaram manifestantes pró-russos, que os levaram para a praça Kulikovo Pole. Confrontos violentos passaram para acampamento na praça, tornando perigoso ficar lá. Os membros do movimento Kulikovo Pole precisavam de abrigo.
Parecia-lhes que estariam seguros na Casa dos Sindicatos, um edifício de cinco andares localizado nas proximidades, em Kulikovo Pole. Infelizmente, o edifício se tornou uma armadilha para eles.
© Sputnik / Valery Melnikov Parentes e amigos participam de ato para marcar os cinco anos da tragédia, na qual incêndio provocado matou 48 manifestantes em Odessa, Ucrânia, 2 de maio de 2019
Parentes e amigos participam de ato para marcar os cinco anos da tragédia, na qual incêndio provocado matou 48 manifestantes em Odessa, Ucrânia, 2 de maio de 2019 - Sputnik Brasil, 1920, 02.05.2023
Parentes e amigos participam de ato para marcar os cinco anos da tragédia, na qual incêndio provocado matou 48 manifestantes em Odessa, Ucrânia, 2 de maio de 2019
Depois de uma série de confrontos nos dois primeiros andares do prédio, manifestantes pró-Rússia se viram bloqueados. Enquanto isso, nacionalistas ucranianos incendiaram a Casa dos Sindicatos, não permitindo que as pessoas escapassem enquanto as chamas e a fumaça engoliam o prédio. Aqueles que saltaram das janelas caíram para a morte ou foram espancados por ativistas pró-Maidan.
Depois foi relatado que, embora um policial de plantão tenha informado os serviços de emergência da necessidade de enviar urgentemente brigadas de incêndio para o local, seu pedido foi inicialmente ignorado. Os bombeiros chegaram cerca de uma hora depois; naquele momento, o incêndio e o massacre em andamento já haviam ceifado dezenas de vidas.

"Era impossível chegar a Kulikovo Pole. Havia também duas tendas do Exército na praça, e ambas estavam em chamas. Era impossível passar, havia cordões desses 'caras maravilhosos com rostos brilhantes'", disse Kataev sarcasticamente, referindo-se aos ativistas pró-Maidan.

"Se você não tivesse marcas de identificação em você - uma fita amarelo-azul ou o número certo em um capacete -, então você não poderia passar de forma alguma."

Não justiça, não paz

Aqueles que sobreviveram ao massacre ou eram suspeitos de simpatia pela Rússia foram submetidos a expurgos desde esse dia.

"Virou moda, depois que o Maidan ganhou, [perseguir vozes da oposição]. Ou seja, eles prenderam aqueles que sobreviveram, e não aqueles que incendiaram o prédio, porque 'todos os animais são iguais, mas alguns animais são mais iguais do que outros'", disse Kataev, citando a novela alegórica de George Orwell, "A Fazenda dos Bichos".

"Ouça, eles virão até você com uma busca e encontrarão tudo o que trouxeram com eles. Eles virão até você com uma granada, colocá-la na mesa e chamar testemunhas."
Os promotores uranianos normalmente usam acusações criminais para colocar ativistas pró-russas atrás das grandes, de acordo com o jornalista.
"Na melhor das hipóteses, você perderá todo o equipamento informático que você tinha em sua casa", observou ele.
© Sputnik / Anton KruglovFlores colocadas em homenagem aos 48 manifestantes mortos em decorrência do incêndio provocado em Odessa, Ucrânia, 05 de maio de 2014
Flores colocadas em homenagem aos 48 manifestantes mortos em decorrência do incêndio provocado em Odessa, Ucrânia, 05 de maio de 2014 - Sputnik Brasil, 1920, 02.05.2023
Flores colocadas em homenagem aos 48 manifestantes mortos em decorrência do incêndio provocado em Odessa, Ucrânia, 05 de maio de 2014
"E você estará sob vigilância por algum tempo. A qualquer momento você pode ser puxado, a qualquer momento você pode ser forçado a assinar qualquer pedaço de papel, este pedaço de papel será mostrado aos seus amigos. Os amigos também assinarão o papel. Se você fizer muito barulho, será trancado."

"Por exemplo, eu posso ser preso por esta conversa com você no momento. E eles vão me acusar de traição e dar uma longa pena de prisão", enfatizou Kataev.

A justiça nunca prevalecerá sob o regime de Kiev, segundo o jornalista, que ainda não perdeu a esperança.

"Deve-se abordar essa questão do ponto de vista da responsabilidade coletiva. Porque um trouxe a gasolina, o segundo derramou em garrafas, o terceiro carregou coquetéis molotov, e o quarto incendiou o prédio [...] na minha opinião, todos estavam lá na praça, todos deveriam ser punidos por assassinato em massa, pelo menos."

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