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'Propaganda de guerra': imperialistas usam desinformação para justificar genocídios, diz analista

© AP Photo / Fatima ShbairPalestinos observam a destruição causada por um ataque israelense a edifícios residenciais e uma mesquita em Rafah. Faixa de Gaza, 22 de fevereiro de 2024
Palestinos observam a destruição causada por um ataque israelense a edifícios residenciais e uma mesquita em Rafah. Faixa de Gaza, 22 de fevereiro de 2024 - Sputnik Brasil, 1920, 28.02.2024
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Em entrevista ao podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, pesquisador explica que a manipulação ideológica contra a causa palestina é uma tática usada em outros conflitos, como o da Ucrânia, e em perseguições a países como Cuba e Venezuela.
A escalada de violência na Palestina segue sendo um dos principais temas abordados em noticiários e por chefes de Estado, incluindo o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que recentemente causou polêmica e iniciou uma crise diplomática com Israel ao comparar a ofensiva israelense na Faixa de Gaza às mortes de judeus pelo regime nazista de Adolf Hitler.
Em entrevista ao podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, o socioambientalista, internacionalista e comunicador Thiago Ávila comentou a situação na Palestina e falou sobre sua viagem até a fronteira do Egito com o sul da Faixa de Gaza, onde fica a passagem de Rafah, posto pelo qual palestinos tentam deixar o enclave para fugir de bombardeios israelenses.
Ávila começa abordando a polêmica envolvendo a fala de Lula e argumenta que o presidente, em seu comentário, não acusou os judeus de nada, apenas afirmou "que o que está acontecendo contra o povo palestino é algo de extrema gravidade, o que de fato é uma verdade histórica".

"Portanto seria um absurdo toda essa mobilização da imprensa sionista, dos propagandistas de guerra, do lobby sionista no Brasil e no mundo contra Lula, em comparação com o que é, de fato, a morte de mais de 30 mil civis em Gaza e de mais de 400 pessoas na Cisjordânia, também palestinos", afirma Ávila.

Ele acrescenta que há uma mobilização da imprensa e do lobby sionista no Brasil para tentar criar um factoide em cima da fala de Lula, e diz que em nenhum momento o presidente disse que os judeus são responsáveis pelo que está ocorrendo na Palestina.
© AP Photo / Fatima ShbairPalestinos fazem fila para refeição fornecida por ajuda humanitária em Rafah. Faixa de Gaza, 16 de fevereiro de 2024
Palestinos fazem fila para refeição fornecida por ajuda humanitária em Rafah. Faixa de Gaza, 16 de fevereiro de 2024 - Sputnik Brasil, 1920, 23.02.2024
Palestinos fazem fila para refeição fornecida por ajuda humanitária em Rafah. Faixa de Gaza, 16 de fevereiro de 2024

"Porque é o problema do sionismo, e não do povo judeu. Os sionistas que tentam fazer essa confusão de que criticar as ações sionistas de genocídio e limpeza étnica de mais de 76 anos seria uma forma de criticar os judeus. Isso é falso, inclusive judeus do mundo inteiro estão lutando contra o sionismo."

Redes sociais estão boicotando conteúdo pró-Palestina?

Ávila foi um dos primeiros influenciadores a denunciar que o Instagram, rede social da Meta (cujas atividades são proibidas na Rússia por serem consideradas extremistas), estava promovendo boicote a conteúdos pró-Palestina. Ele afirma que em seu trabalho como pesquisador sempre percebeu uma certa restrição por parte das redes sociais a conteúdos pró-Palestina, porém ressalta que "nada se compara ao que está acontecendo agora".
"Agora a população mundial gerou um interesse imenso sobre esse tema, porque as pessoas viram o primeiro genocídio transmitido ao vivo da história da humanidade […], transmitido pelas redes sociais de comunicadores de Gaza, influenciadores digitais e pessoas que resolveram colocar suas contas em risco, e sua integridade física e tudo mais em risco, para fazer a verdade atravessar o bloqueio midiático", explica Ávila.

"Desta vez, o interesse das pessoas foi imenso, e aí […] as redes sociais começaram um boicote ainda maior. Começaram, primeiro, impedindo o compartilhamento [de conteúdos pró-Palestina], depois impedindo comentários [em postagens]. Depois, gradativamente, começaram os alertas de que as páginas seriam excluídas, vídeos iam sendo excluídos, sendo colocados como impróprios […]. Minha conta em redes sociais foi excluída diversas vezes", complementa.

Ele sublinha um estudo feito pela organização Human Rights Watch que apontou padrões de boicote das redes sociais contra mais de mil contas que defendiam a causa palestina, em 60 países.
"Todos os seis grandes padrões de boicote [analisados no estudo] eu sofri nesse período. Mas não só eu, qualquer pessoa que tem uma conta de grande alcance, que resolveu colocar essa conta a serviço da denúncia de uma das maiores violações do nosso tempo."

Como foi a viagem à Cisjordânia?

Ávila conta que visitou a Cisjordânia ocupada em 2019, quando já pesquisava e escrevia sobre a causa palestina.
"O que eu vi é muito pior do que eu imaginava, tudo que eu lia, todas as formulações acadêmicas que eu acompanhava, todos os debates de que eu já havia participado, todas as conversas que eu já tive com pessoas palestinas na diáspora. É você ver e viver um estado de colonização em apartheid. Quando eu passei no primeiro checkpoint israelense, dentro da Cisjordânia ocupada, sob a mira de fuzis, sob equipamentos ultramodernos de reconhecimento facial, catracas e lugares ali altamente de hipervigilância, onde pessoas são assassinadas cotidianamente, aquilo ali me marcou de um jeito que eu não imaginava que existia algo assim no mundo."
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Ele acrescenta que somente quando foi à Cisjordânia entendeu por que militantes viajavam para Hebron, uma das cidades da Cisjordânia ocupada, apenas para acompanhar crianças em um curto trajeto para a escola.

"Eu falei: 'Poxa, por que vem alguém de outro país para cá para levar crianças para caminhar poucas ruas para chegar à escola?'. Mas quando eu estive lá eu entendi. Porque os sionistas que fazem colônias em Hebron jogam pedras nas crianças que tentam chegar à escola. Então esses internacionalistas do movimento de solidariedade internacional vão para Hebron para acompanhar essas crianças, para servir de escudo humano, para que as pedras acertem eles, e não acertem as crianças."

Ávila não teve a entrada admitida pelas autoridades israelenses que controlam o fluxo de pessoas na Faixa de Gaza.
"Porque de fato ali é uma prisão sem teto, a céu aberto. Então você não consegue entrar. Em 2023, depois do 7 de outubro e dessa escalada do genocídio, eu estive no Egito, tentando chegar o mais próximo possível da fronteira de Rafah. O Egito, embora seja um país soberano, as fronteiras ali são controladas por Estados Unidos e por Israel, o que não permite a ajuda humanitária passar."
Ele afirma que quanto esteve no Egito, perto da fronteira de Rafah, junto com um comboio de sindicatos de jornalistas e pessoas de várias partes do mundo protestando pela abertura da passagem, testemunhou filas de caminhões de ajuda humanitária parados, carregados com comidas que estragavam, enquanto dentro da Faixa de Gaza pessoas morriam de fome.
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"Então todas essas coisas que eu tenho denunciado nos meus vídeos, eu já tinha lido, mas eu não precisei ouvir de ninguém. Eu vi, eu presenciei isso. Então isso me marcou muito, e de fato, depois que eu voltei, eu não tinha como ficar calado sobre isso."

Que outros episódios podem ser comparados à situação em Gaza?

Ávila conta que, como internacionalista, viajou para outros lugares em conflito além da Palestina, para promover ações de solidariedade. Ele diz que já foi observador internacional nas eleições da Venezuela de 2020, acompanhou as eleições de El Salvador em 2009 e organizou caravanas de solidariedade para Cuba e diversos outros países.

"Eu compreendo que a situação do povo palestino está conectada à situação do resto da humanidade, que tenta se desvencilhar e se livrar do pior, do mais perigoso e mais destrutivo sistema que a humanidade já inventou, que é o sistema capitalista, na sua expressão imperialista, liderado pelos Estados Unidos […]. A gente sabe que está tudo conectado. As mesmas ameaças que as tropas estadunidenses fazem contra o povo palestino em Gaza, fazem também contra o povo de Donbass, da Crimeia, fazem contra o povo da Venezuela, fazem contra o povo de Cuba, contra o povo da China", afirma o pesquisador.

Como explicar a simpatia por reféns israelenses, mas não pelos palestinos?

Alguns analistas apontam que muitos dos atuais militantes do Hamas foram crianças que tiveram a vida destruída por incursões israelenses na Palestina. Somadas a isso, há críticas quanto à cobertura de alguns noticiários, que dão maior ênfase à agonia de reféns israelenses na Faixa de Gaza do que à de crianças que sofrem com os ataques.
Questionado sobre o assunto, Ávila aponta que "essa é uma das partes mais tristes do processo de desinformação, manipulação ideológica e desumanização".

"Nenhum regime de dominação no mundo sobreviveu sem desumanizar os povos que são dominados por ele. Porque, senão, fica óbvio, né? Se não fossem os europeus dizendo que os indígenas não tinham alma, que eram um povo atrasado, que precisavam daquela bênção que era a civilização e que precisavam daqueles conhecimentos e daquelas formas de se organizar e de expressar sua fé, e sua cultura, e sua língua, se não fosse isso, as pessoas iam entender que é errado você invadir o outro continente, escravizar e assassinar e, de fato, dizimar povos inteiros, como foi feito aqui [no Brasil]", explica Ávila.

Ma Xinmin, diretor-geral do Departamento de Tratados e Direito do Ministério das Relações Exteriores da China, participa de uma audiência no Tribunal Internacional de Justiça (CIJ) em Haia, sobre as consequências jurídicas da ocupação israelense dos territórios palestinos, em 22 de fevereiro de 2024 - Sputnik Brasil, 1920, 22.02.2024
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De acordo com o pesquisador, as pessoas somente aceitam esse tipo de violência por meio da desinformação, da manipulação ideológica e psicológica, para acirrar o ódio.
"Primeiro dizem que é mentira, diziam até que eram bonecos, não eram crianças que estavam sendo mortas em Gaza. Diziam que os vídeos eram falsos, e diriam mais ainda se não fossem os comunicadores presentes em Gaza e tantos vídeos de bombardeios e ataques", explica Ávila.

"Eles tentam dizer que se estão morrendo crianças, é culpa das próprias organizações palestinas, que é parte das mentiras deles. Então são as organizações palestinas, na cabeça deles, que teriam bombardeado os hospitais, que estariam assassinando as pessoas, estariam negando às pessoas comer. Isso tudo é falso, mas eles dizem. Além disso, eles supervalorizam as violações e as tragédias e catástrofes que acontecem contra os cidadãos de Israel", acrescenta.

Ele ressalta que essa guerra de propaganda e narrativas também tem como alvo soldados no campo de batalha.
"Gradativamente, comandantes militares entenderam que a propaganda de guerra era muito eficaz no campo de batalha para convencer os soldados a não desertarem, a não entrarem em colapso mental por serem agentes de um genocídio."

Como fica o direito de defesa de Israel?

Um dos principais argumentos de defesa da ofensiva israelense em Gaza é o direito de defesa de Israel. Ativistas pró-Israel apontam que o país tem o direito de se defender dos ataques do Hamas, como o de 7 de outubro, o pior já perpetrado pelo grupo.
Questionado sobre essa visão, Ávila aponta que o direito de se defender também deve ser questionado.
"Os nazistas tinham o direito de se defender contra os judeus que se rebelaram no gueto de Varsóvia? Os portugueses tinham o direito de se defender contra os indígenas que eles exterminavam?", questiona o pesquisador.
Ele acrescenta que o direito internacional classifica forças de ocupação e colonização como ilegais e diz que Israel viola as leis internacionais desde o primeiro dia de existência como Estado, antes da admissão como membro da Organização das Nações Unidas (ONU). Isso porque, de acordo com a resolução 194 da ONU, para entrar na organização Israel deveria ter permitido o retorno de palestinos expulsos durante a Nakba, como ficou conhecido o êxodo de palestinos expulsos de seus lares em decorrência da guerra civil de 1947–1948 e da guerra árabe-israelense de 1948.
"Depois disso, tiveram as fronteiras do plano de partição da ONU, os acordos e resoluções que vieram ali na Guerra dos Seis Dias, em 1967, depois na Guerra do Yom Kippur, de 1973. Fronteiras internacionais que Israel não segue e não aceita. Portanto Israel é um Estado criminoso, pirata, que age de forma criminosa internacionalmente e que não apenas está desrespeitando a legislação internacional em relação a isso, mas pratica um regime de colonização. E, segundo o direito internacional, quem pratica colonização não tem direito de defesa. Você não tem direito de defesa se você é o próprio agressor", conclui o pesquisador.
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