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África: investimento em turismo contribui para dissipar estereótipos colonialistas, dizem analistas

© AP Photo / Schalk van ZuydamPraticante de kitesurf surfa tendo como pano de fundo a Table Mountain, na Cidade do Cabo, o principal destino sul-africano. África do Sul, 2 de fevereiro de 2014
Praticante de kitesurf surfa tendo como pano de fundo a Table Mountain, na Cidade do Cabo, o principal destino sul-africano. África do Sul, 2 de fevereiro de 2014 - Sputnik Brasil, 1920, 02.08.2024
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Em entrevista ao podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, especialistas destacam que mais de dois séculos de colonialismo criaram uma percepção negativa em torno do continente africano que pode ser desconstruída por meio do turismo. Porém, ainda há desafios, como o investimento em infraestrutura para o setor.
Países africanos estão reposicionando a imagem do continente perante o mundo. Além do movimento que expulsou resquícios colonialistas europeus de vários países, como a expulsão de tropas francesas do Níger, de Mali e de Burkina Faso, bem como o fim do uso do idioma francês nas escolas, muitos deles miram o turismo como forma de mudar a percepção do mundo em torno do continente — geralmente ofuscada pelo estereótipo dos safáris.
Em entrevista ao podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, especialistas analisam a expansão da indústria do turismo na África e quais os principais atrativos de países africanos para quem deseja conhecer o continente.
Doutora em literaturas africanas e professora do Departamento de Letras da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), Aza Njeri afirma que nos últimos dois séculos o Ocidente construiu uma imagem negativa da África como um continente pauperizado e vilanizado. Porém, ela afirma que o fomento ao turismo, calcado na interculturalidade, veio alimentado pela tomada de discussões de cunho étnico-racial, lideradas por afrodescendentes principalmente no continente americano, em países como Brasil, Estados Unidos e também Caribe.

"Há um fomento de interesse de interculturalidade, laços, trocas de saberes com o continente que é mais recente. Ele já vem nessa toada do anticolonial, mas mais contemporâneo. Eu acho que já tem uma roupagem do século XXI", explica Njeri.

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Há décadas, a África do Sul é um dos destinos mais caros e valorizados do continente africano. Segundo Njeri, isso ocorre por dois fatores: primeiro porque há voos diretos para a África do Sul, o que não ocorre com a maioria dos demais países africanos; segundo por conta da infraestrutura voltada para o turismo.
"No caso da África do Sul em específico, é um país em relação aos demais mais atraente porque já tem um mercado cambial estabelecido, tem uma rede de hotéis interessante, tem cursos de inglês, por exemplo, […] para fazer intercâmbio, coisa que a gente encontra com dificuldade em outros países de língua inglesa no continente africano. Essas modalidades e essas possibilidades de cursos, lazer e também financeiras fazem com que a África do Sul fique mais prática para uma visita."
Para além disso, a especialista acrescenta que a África do Sul oferece tudo o que um turista médio gostaria de fazer no continente africano.
"Desde as savanas até as noites muito interessantes, as baladas, a vida noturna, os restaurantes, os hotéis e, é claro, a paisagem, que é extremamente paradisíaca."
Ela adverte que alguns países ainda enfrentam gargalos para impulsionar o turismo por conta da falta de segurança gerada por conflitos internos, como é o caso do Sudão do Sul e do Congo. Outros carecem ainda de investimentos no setor turístico. Porém, há países como Cabo Verde, que tem nove ilhas, e é tomado por resorts.

"Elas [as ilhas] são bem dessa paisagem paradisíaca. Lembra muito o Caribe em relação às águas cristalinas, e é muito interessante como Cabo Verde hoje é um país tomado por resorts."

Porém, Njeri afirma que essa infraestrutura reflete o que ela chama de "desenvolvimento criticável", uma vez que são empreendimentos imobiliários que atendem a públicos europeus e estadunidenses, brancos e ricos.
"Há também essa crítica porque é um turismo por base predatória. Não tem ali uma preocupação com o meio ambiente necessária. Extrai os recursos, mas não há políticas nacionais de equilíbrio, reparação e restauração do meio ambiente."
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Carolina Morais, historiadora e cofundadora da The African Pride, por sua vez, afirma que há países do continente africano que conseguem "se projetar para o mundo da maneira e das possibilidades que o continente africano apresenta", e um dos países que fazem isso muito bem é a África do Sul.

"A África do Sul, de fato, consegue se apresentar para o mundo, se vender, se posicionar e, se você abrir os dados, é o país que tem recebido a maior parte dos visitantes do mundo inteiro hoje no continente africano. Mas isso não é uma prática do continente como um todo. O Egito também recebe muitos turistas, muito relacionados ali pela história, pelas pirâmides, enfim, por tudo isso, mas o continente como um todo precisa aprender a se vender. Existe uma imagem de África que a gente precisa reconstruir", afirma.

Questionada sobre o relatório da plataforma With Africa, que apontou que dentre os 54 países do continente, somente Cabo Verde, África do Sul, Marrocos, Tunísia, Tanzânia e Ilhas Maurício apresentam informação sobre dados do setor de turismo disponíveis e atualizados, Morais afirma que existe "um movimento até mesmo de investimento na infraestrutura que a maior parte dos países africanos ainda precisa realizar".
"Por exemplo, um país como Angola, que não está nessa listagem, que é um país que tem um potencial turístico gigantesco também, é um país que tem conexão já de voos diretos saindo de São Paulo em direção a Luanda, mas que ainda não apresenta uma estrutura clara para esse turista que está chegando pela primeira vez."
Ela acrescenta ainda que muitos países, principalmente da África Subsaariana, sofrem do mesmo problema apontado por Carlos Bumba, presidente da Associação de Guias de Turismo de Angola, que apontou ser utopia falar em potencial turístico de Angola enquanto não tiver garantia de água potável, rede elétrica, Internet e obtenção de divisas que permitam transações cambiais.

"A gente pode observar esses mesmos desafios de Angola em relação a Camarões, ao Congo, à Namíbia, ao Zimbábue. Descendo ali mais um pouco, a gente encontra esse mesmo desafio em Moçambique. São países que compartilham essa falta de infraestrutura e que fica difícil de você falar realmente de uma ampliação da rede de turismo se não tem a infraestrutura básica", afirma a historiadora.

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